Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    THIAGO MENDONCA (USP)

Minicurrículo

    Formado em Ciências sociais na USP e mestrando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA. É roteirista de importantes diretores da nova geração como Adirley Queirós, Victor Furtado, entre outros. Colaborou com diversas publicações com textos sobre Cinema e música e é editor da Revista Zagaia. Entre seus filmes estão os premiados Minami em Close-up, A Guerra dos Gibis, Piove, il Film di Pio, O Canto da Lona, Entremundo, Procura-se Irenice, Jovens Infelizes e Um Filme de Cinema.

Ficha do Trabalho

Título

    O ECLIPSE DA EXCEÇÃO – REPRESENTAÇÕES DA DITADURA NO BRASIL 1985-1989

Resumo

    Celebrada ou colocada em cheque a volta da democracia povoou o cinema brasileiro nos primeiros anos da redemocratização (1985-1989), trazendo à cena diversas contradições presentes no mundo social. Da celebração de um tempo novo à denuncia de um falso rompimento, o cinema deste período surpreende por apresentar consciente ou inconscientemente as principais questões que seriam trabalhadas nos anos subsequentes sobre passado e presente frente as heranças da ditadura civil-militar.

Resumo expandido

    Data de 1990 o Hino à Proclamação da República que enunciava em seus versos: “Nós nem cremos que escravos outrora, tenha havido em tão nobre país. Hoje o rubro lampejo da aurora, acha irmãos, não tiranos hostis”. Havia dois anos que a escravatura fora abolida e a situação dos descendentes de escravos era calamitosa. Mas os versos do hino anunciavam premonitoriamente que a discussão sobre as consequências da escravidão já era página virada, mesmo que não se tenha enfrentado de frente as vicissitudes trazidas por ela. Não seria uma marca da história do Brasil a celebração da superação de um momento traumático antes que suas consequências pudessem ser digeridas? O que falar da memória da ditadura civil-militar que assolou o Brasil por 21 anos? 1 O período entre 1985 a 1989 é considerado o dos primeiros anos da redemocratização. Ainda não acontecera eleição direta, mas já se anunciava o eclipse da ditadura. Eclipse não é um fim. É um desaparecimento aparente pela interposição de outro corpo, no caso a volta da democracia. Celebrada ou colocada em cheque a volta da democracia povoou o cinema brasileiro trazendo à cena diversas contradições presentes no mundo social.2 Há uma quantidade razoável de filmes que trataram direta ou indiretamente a questão da ditadura civil-militar nestes anos. Em um primeiro levantamento podemos citar 10 filmes neste período de 5 anos3, com propostas e leituras díspares do momento histórico vivido. Da celebração de um tempo novo à denuncia de um falso rompimento. O cinema deste período surpreende por apresentar consciente ou inconscientemente as principais questões que seriam trabalhadas nos anos subsequentes sobre passado e presente frente as heranças da ditadura civil-militar.
    Em grande parte da bibliografia do cinema brasileiro este período aparece como uma sombra, um senão, quase uma mácula, quando não é simplesmente ocultado. Geralmente é apresentado como uma fase de decadência que teve como tiro de misericórdia o fim da Embrafilme. São raríssimas as obras que tratam diretamente do cinema da segunda metade dos anos 19804. Talvez pela disparidade enorme dos trabalhos (tanto em termos de propostas de linguagem e visão de mundo, quanto em termos de formas de produção) que trás obstáculos a um discurso sintético. Talvez porque o discurso hegemônico deste momento é de um cinema que procurava a todo custo integrar-se à indústria cultural realizando uma produção anódina e fadada ao esquecimento. Talvez por ser um momento obscuro, de difícil compreensão e com uma quantidade enorme de variáveis que dificultam a cristalização de uma narrativa. Seja lá qual o motivo, ao nos depararmos com os filmes que tratam da ditadura e suas heranças realizados no período, observamos um mar de possibilidades ainda pouco exploradas pela crítica. A segunda metade dos anos 1980 apresenta-se como um momento em aberto, onde ainda encontramos tanto elementos narrativos típicos do cinema experimental e político dos anos 1960 e 1970, quanto do cinema convencional buscando o mercado, estratégia já em voga no chamado Cinemão dos anos 1970 e reconfigurada a partir do Cinema da Retomada dos anos 1990 e 2000. Uma parte dos filmes desta época refletem o otimismo da abertura política. Outra parte desconfia deste discurso, atentando-se às continuidades estruturais entre o período autoritário e a redemocratização (discurso que só voltará a aparecer com total clareza na segunda metade de 2006 com Serras da Desordem de Andrea Tonacci).

Bibliografia

    AB’SABER, Tales A. M. A IMAGEM FRIA. Ateliê Editorial. 2003
    ARAUJO, INÁCIO. In: Críticas de Inácio Araujo cinema de boca a boca. Coleção Aplauso. São Paulo, Editora IMESP, 2010.
    AVELLAR, José Carlos et al. “Os críticos em questão: um debate sobre a atividade crítica na grande imprensa”. In Filme Cultura, n. 45, março1985, pp. 4-20.
    CANDIDO, Antonio. Formação da Literatura Brasileira. São Paulo, Editora da Universidade de São Paulo, 1975.
    OLIVEIRA, Francisco de. Crítica à razão dualista. O ornitorrinco. São Paulo, Editora Boitempo, 1999.
    ORICCHIO, Luiz Zanin. Cinema de novo: um balanço critico da retomada. Estação Liberdade. 2003
    RAMOS, FERNÃO (org). História do Cinema Brasileiro. São Paulo, ArtEditora, 1990
    XAVIER, I. N. O Concerto do ressentimento nacional. Sinópses (USP), SÃO PAULO, v. IV, n.8, p. 35-37, 2002. XAVIER, I. N. O cinema brasileiro dos anos 90. Praga – estudos marxistas, São Paulo, v. 9, p. 97-138, 2000.