Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    Giulianna Nogueira Ronna (PUCRS)

Minicurrículo

    Mestre em Comunicação Social PPGCOM/PUCRS (2019) – com incentivo de Bolsa CAPES. Especialista em Expressão Gráfica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS/FAU (2008). Bacharel em Comunicação Social – Publicidade e Propaganda – pela Universidade Católica de Pelotas – UCPEL (1995). Participa do Kinepoliticom (CNPq): Grupo de Pesquisa em Cinema, Audiovisual, Estética, Comunicação e Política. É sócia e diretora de criação da Mais Propaganda.

Ficha do Trabalho

Título

    A INSTÂNCIA GRÁFICA E A EXPERIÊNCIA DO RASTRO EM AGNÈS VARDA

Resumo

    Neste trabalho, busco refletir a instância gráfica na cinescrita vardiana enquanto um recurso que revela rastros de uma voz. Trago os conceitos de vestígio, rastro e traço em Benjamin (2006) para realizar uma análise da instância gráfica no filme Sem teto nem lei (Sans toit ni loi, 1985), expondo como a narração, constituída a partir desta instância, sugere aquilo que já não está mais visível, mas permanece latente na visualidade, um modo de visibilidade que se organiza na experiência do rastro.

Resumo expandido

    O cinema, em sua prática heterogênea, favorece os estudos voltados para a compreensão das ocorrências situadas nas zonas de contaminação e de entrelaçamento. A investigação e o debate originados desta perspectiva privilegiam um espaço singular na produção de conhecimento. É neste espaço que me coloco ao propor uma reflexão da instância gráfica na cinescrita vardiana, enquanto um recurso que revela rastros de uma voz.
    Interessa aqui o gráfico incluído na imagem (no registro executado pela câmera ou na pós-produção), que se afirma como matéria fílmica, presença visível e sensível, passando a responder aos tempos cinematográficos, assumindo também os efeitos de montagem, enquanto recurso e substância narrativa.
    Com a intenção de construir uma reflexão mais detalhada e acentuada, o propósito não é tipificar ou classificar, mas sim abrir um espaço para problematizar a forma como a instância gráfica contamina uma imagem e, assim, contribuir para o debate acerca das ocorrências inscritas no ecrã, capazes de se interligar à narrativa, reconfigurado os componentes visíveis e legíveis da imagem.
    Dito isto, trabalho com a perspectiva de que a instância gráfica, nos filmes de Agnès Varda, cria visualidades, em protagonismo, a partir de uma concepção cinematográfica que privilegia um tipo de escrita de imagens, em arranjos tipográficos variados, em traços, linhas e desenhos. Um cinema de natureza gráfica, no qual a câmera muitas vezes percorre os espaços repousando em placas de trânsito, cartazes, muros, painéis, em um trajeto particular que rompe com as escolhas usuais, como um filtro que subverte um padrão de imagem e conteúdo.
    Para tanto, ao investigar as relações entre o cinema e a instância gráfica, levo em conta as possíveis tensões e resistências que esta contaminação convoca, uma vez que é capaz de desestabilizar a imagem, constituindo uma visualidade além da sua representação. Considerando que o gráfico, quando inscrito na película, não apenas aparece, mas age no interior da imagem, trago o conceito de rastro, em desdobramento enquanto voz, uma vez que se ajusta ao entendimento do gráfico como um recurso que revela presenças e ausências.
    Arrisco dizer que a forma como a cineasta realiza sua cinescrita utiliza a instância gráfica como um recurso estético que explora os rastros na construção daquilo que não é nem visível, nem tangível, mas lá está, presente e ausente, como uma imagem dialética que desestabiliza essas posições.
    A voz viabiliza a reflexão centrada na percepção dos rastros, a partir da instância gráfica enquanto recurso estético que se posiciona como a presença de uma voz; explorando o rastro do eu-narrador; de uma voz que emerge do silêncio do gráfico: um gráfico-voz que diz algo sobre o filme que o próprio filme não é capaz de dizer, conferindo também uma espessura na perspectiva social, histórica e política que esta instância é capaz de transportar.
    Ao efetuar uma aproximação da cinescrita vardiana é possível constatar como Varda estrutura seu trabalho inserindo uma rede de associações rigorosamente amarrada ao eixo central. A partir de digressões, as narrativas projetam-se em uma composição heterogênea de imagens, textos, desenhos, pinturas, tipografias e fotografias.
    Nesta composição a instância gráfica, opera um tipo de visibilidade capaz de tensionar nosso olhar, naquilo que vemos e naquilo que se apaga. Uma marca estética que potencializa um tipo de escuta, tornando possível uma aproximação daquilo que já não está mais ali, mas deixa seu rastro enquanto presença de uma voz.
    Para tanto, realizo uma análise da instância gráfica no filme Sem teto nem lei (Sans toit ni loi, 1985), expondo como a narração, constituída a partir desta instância, sugere aquilo que já não está mais visível, mas permanece latente na visualidade. Dessa forma, o gráfico participa de um modo de visibilidade que se organiza na experiência do rastro, auxiliando na legibilidade das imagens.

Bibliografia

    BENJAMIN, Walter. Escavando e lembrando. In: ______. Rua de Mão única. 5. ed. Trad. Rubens Rodrigues Torres Filho e José Carlos Martins Barbosa. São Paulo: Brasiliense, 1987. p. 239-240. (Obras escolhidas; v. 2).

    BENJAMIN, Walter. Passagens. Belo Horizonte: UFMG, 2006.

    CONWAY, Kelley. Agnès Varda. University of Illinois, 2015.
    DeRoo, Rebecca J. Agnes Varda between Film, Photography, and Art. University of California Press, 2008.

    GAGNEBIN, Jeanne Marie. Lembrar escrever esquecer. São Paulo: Editora 34, 2006.

    GAGNEBIN, Jeanne Marie. Limiar, aura e rememoração: ensaios sobre Walter Benjamin São Paulo: Editora 34, 2014.

    MCGUIRE, Shana. Cinécriture et cinépeinture chez Agnès Varda, 2004. Disponível em: Acesso em: 22 jun. 2017.

    ROWLAND, Clara. A Escrita No Cinema: ensaios. Lisboa: Documenta. 2015.