Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    Marília Xavier de Lima (UAM)

Minicurrículo

    Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Comunicação na Universidade Anhembi Morumbi. Mestre e graduada em Comunicação pela Universidade Federal de Juiz de Fora.

Ficha do Trabalho

Título

    Encenações de si no cinema brasileiro contemporâneo

Resumo

    Proponho uma comunicação acerca da encenação de si no cinema brasileiro contemporâneo a fim de compreender a maneira como essas performances de si mesmo se articulam com as práticas de sociabilidade presentes na cultura audiovisual. Esse artifício ocorre em filmes de ficção, documentários e naqueles que operam entre os dois modos. Farei uma apresentação sobre uma pesquisa em percurso a respeito de operações cinematográficas atuais que apontam para outras estratégias de autenticação do real.

Resumo expandido

    Para Thomas Elsaesser (2015), há um novo tipo de realismo no cinema em curso que não apresenta mais dados de referência nos quais o espectador costumava se apoiar no realismo anterior. Ele já não revela um mundo, mas se torna parte dele, é incorporado na infinidade de imagens produzidas, sem, no entanto, buscar na afinidade com o real a matéria-prima para a imagem. Segundo o teórico, essa ontologia passou a ser de outra ordem, não sendo mais vinculada à sua indexicalidade, procedente de seu material fotográfico e, sim, pós-fotográfica que enseja um novo contrato com o espectador garantindo assim sua relação de crença na imagem.

    Na esteira de novas tendências e renovações de estilos, o documentário contemporâneo desenvolveu seus limites estéticos a partir da hibridização de formatos, destoando assim dos documentários clássico e moderno. É nesse caminho que Francisco Elinaldo Teixeira (2012, p.235) insere o termo “expandido” ao documentário contemporâneo, como uma forma de entendê-lo fora de sua relação com o real e com a revelação da verdade, que são marcas dos documentários clássico e moderno aproximando-se assim do cinema de ficção experimental. Portanto, o que muda é um estatuto da imagem. Não apenas as fronteiras do documentário se romperam, como também as do cinema de ficção, incorporando elementos do documentário. Os liames entre ficção e não-ficção são deslocados para uma questão específica da representação do real: mais do que registrar ou documentar uma realidade criativamente (Nichols, 2010), cria-se um universo onde as pessoas encenam situações ficcionais. É o caso de diversos longas-metragens brasileiros como Jogo de Cena (Eduardo Coutinho, 2006) Moscou (Eduardo Coutinho, 2009), Castanha (Davi Pretto, 2014), Branco sai, preto fica (Ardiley Queirós, 2014), A vizinhança do tigre (Affonso Uchoa, 2014), Ela volta na quinta (André Novais, 2015), Era o Hotel Cambridge (Eliane Caffé, 2016), Baronesa (Juliana Antunes, 2017) e outros.

    Esses filmes parecem sair de um modo tradicional de realização do cinema de ficção e documental para criar outros modos de engajamento com a imagem, como se esses formatos já não dessem mais conta de representar seus personagens. Proponho com isso uma comunicação expondo uma relação entre o uso de atores não profissionais no cinema de ficção, bem como a roteirização de situações de cotidiano em documentários, com uma mudança sentida a partir dos anos 1990 ligada a uma autoconstrução dos sujeitos, explicitando isso em diversos filmes do cinema brasileiro atual. Para Michael Renov (2004), isto ocorre a partir dos anos 1980, sendo marcante nos anos 1990. Uma nova subjetividade dentro da construção da narrativa dos documentários na qual se torna parte do filme a intervenção da direção como forma de autenticação do real, tal como nos filmes autobiográficos (no contexto brasileiro há exemplos como 33, Kiko Goifman, 2002, e Um passaporte húngaro, Sandra Kogut, 2001). A incorporação das pessoas que vivenciam os temas retratados se torna estratégia de uma autenticação do real. As linguagens audiovisuais imersas em um modo de estetização do cotidiano com seus realitys shows, documentários televisivos, criam uma forma de mediação que aclama por uma experiência do real a partir dos códigos de um realismo que se vale de imagens amadoras, tremidas, com pessoas reais vivendo seus dramas. O uso desses códigos constrói uma impressão de realidade contra a falsidade das produções ficcionais, dando ao produto audiovisual uma (falsa) autenticidade (Ilana Feldman, 2008). Essa pesquisa está em percurso e se dedica a compreender a forma como o cinema brasileiro contemporâneo incorpora elementos presentes nas práticas culturais atuais no que tangem às novas configurações de intimidade relacionadas à criação de imagens.

Bibliografia

    ELSAESSER, Thomas. Cinema mundial: realismo, evidência, presença. IN: MELLO, Cecília (Org). Realismo fantasmagórico. São Paulo: Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária – USP, 2015, p.37-59.

    FELDMAN, Ilana. O apelo realista: uma expressão estética da biopolítica. In: Revista Famecos, Porto Alegre, n. 36, p. 61-68, ago, 2008.

    MIGLIORIN, Cezar. Eu sou aquele que está de saída: dispositivo, experiência e biopolítica no documentário contemporâneo. Tese de Doutorado, UFRJ. 2008.

    NICHOLS, Bill. Introdução ao documentário. Campinas: Papirus, 2016.

    RENOV, Michael. Subject of documentary. University of Minesota Press, 2004.

    SIBILIA, Paula. O show do eu: a intimidade como espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 2016.


    TEIXEIRA, Francisco Elinaldo. Cinemas “não narrativos”: experimental e documentário – passagens. São Paulo: Alameda, 2012.