Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    CRISTIANE MOREIRA VENTURA (IFG)

Minicurrículo

    Cristiane Moreira Ventura é professora no Instituto Federal de Goiás (IFG), Câmpus Cidade de Goiás, docente do Bacharelado em Cinema e Audiovisual, doutoranda em Performances Culturais (UFG), mestre em Estudos de Linguagens (CEFET-MG), bacharel em Letras (UFMG). Realizadora audiovisual, pesquisa e desenvolve trabalhos de cinema expandido e documentário.

Ficha do Trabalho

Título

    A arte de narrar e o ato de fingir em Cópia Fiel

Resumo

    O presente trabalho tem como objetivo analisar as ambiguidades narrativas do filme Cópia fiel (2010) de Abbas Kiarostami e o espelhamento narrativo com o filme Viagem à Itália (1954) de Roberto Rossellini. Para tanto, iremos utilizar os pressupostos de Wolfgang Iser e André Bazin no embasamento deste ensaio, com a finalidade de compreender a dinâmica entre narrativa aberta de Kiarostami e o processo receptivo do espectador, pontuando as composições dos “atos de fingir”.

Resumo expandido

    O cinema feito pelo diretor iraniano Abbas Kiarostami (1940-2016), em sua maioria, retratam um trecho, um fragmento de uma história, não seguindo as convenções narrativas, nem dramáticas. Seus filmes parecem deixar algumas arestas para que o espectador possa construir a sua própria versão da história. A realidade fílmica que Kiarostami constrói, foge dos padrões dos roteiros das produções hollywoodianas, que seguem um paradigma narrativo. Comumente encontramos diversos estudiosos da narrativa que se pautam na premissa de uma estrutura fechada, como Jost (2005): “toda narrativa é “fechada” […] Outros filmes nos trazem de volta ao seu início e nos jogam numa espiral sem fim” (p.31).

    Nos interessam neste estudo esses “outros filmes” que nos jogam numa espiral sem fim, que não seguem regras, que reinventam e jogam com as formas de narrar. Kiarostami, em seu texto “Um filme, cem sonhos” faz a seguinte afirmação: “Creio num cinema que dá mais possibilidades e mais tempo a seu espectador. Um cinema semifabricado, um cinema inacabado que se completa pelo espírito criativo do público”. (KIAROSTAMI, 2016, p.31) Os filmes de Kiarostami não objetivam iludir o espectador, mas sim trazê-lo para uma autorreflexão do que seria assistir um filme e seu papel perante a este ato. Por esta característica anti-ilusionista (entre outras, como: filmar com não atores, o gosto pelas ruínas, caráter documental), sua obra é considerada como neorrealista atualizada.

    O ato de se tornar consciente do processo, de assumir o pacto ficcional e perceber que a narrativa só pode se desenrolar se o espectador fingir que acredita no jogo proposto pelo “narrador”, bem como desconfiar no que está sendo visto, como no caso de Cópia fiel, é onde abriga a diferença da experiência de se assistir filmes que seguem as convenções narrativas. Quando percebemos que a obra em estamos apreciando traz em si uma dinâmica de desdobramento da própria narrativa, ela configura-se como metaficcional. Gustavo Bernardo (2010), exemplifica o processo da metaficção com as babushkas (bonecas checas), que se encaixam umas dentro das outras e com o exemplo do efeito gerado com dois espelhos postos frente a frente, reproduzindo ao infinito determinada imagem.

    Seguindo essa linha de raciocínio, tomamos tais premissas para analisar a estrutura narrativa aberta e os processos metaficcionais propostos por Kiarostami em seu filme Cópia fiel, e numa abordagem comparada analisamos os espalhamentos do filme com Viagem à Itália de Roberto Rossellini. Para tanto,primeiramente, realizamos uma análise mais descritiva da narrativa de Cópia Fiel: o filme dentro da sequência linear em que se apresenta; e numa segunda análise buscamos indícios, determinados trechos da narrativa que geram ambiguidade e dúvida de onde realmente começa a farsa ou o jogo na construção da relação em James e Elle; posteriormente, analisamos o “ato de fingir” ao assistirmos o filme e como a narrativa adquire uma dimensão espiralada, espelhada e infinita, que pode ser atualizada a cada nova apreciação.

Bibliografia

    BAZIN, André. Defesa de Rossellini. In: O que é cinema?. São Paulo: Cosac Naify, 2014
    BARTHES, Roland. “Introdução à Análise Estrutural da Narrativa”. In: Análise Estrutural da Narrativa. .
    BENJAMIN, Walter. “O Narrador. Considerações sobre a obra de Nikolai Leskov”. In: Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. 7. Ed. São Paulo: Brasiliense, 1994.
    BERGALA, Alain. “Da epifania de Kiarostami e Rossellini”. In: Um filme, cem histórias: Abbas Kiarostami. Organizado por Fábio Savino e Maria Chiaretti (CCBB, 2016)
    BERNARDO, Gustavo. O livro da metaficção. Rio de Janeiro: Tinta Negra Bazar editorial, 2010.
    BERNARDET, Jean-Claude. Caminhos de Kiarostami. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
    ISER, Wolfgang. Os atos de fingir ou o que é fictício no ficcional. In: LIMA, Luiz Costa. Teoria da literatura em suas fontes: vol. II. 2. ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1983, pp. 384-416).
    KIAROSTAMI, Abbas & ISHAGHPOUR, Youssef. Abbas Kiarostami. São Paulo