Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    JOUBERT DE ALBUQUERQUE ARRAIS (UFCA)

Minicurrículo

    Doutor em Comunicação e Semiótica (PUCSP), mestre em Dança (UFBA) e bacharel em Comunicação Social/Jornalismo (UFC), com formação artística pelo centro em movimento – c.e.m (Lisboa). Professor adjunto da Universidade Federal do Cariri (IISCA/UFCA), vinculado ao Bacharelado em Jornalismo e à coordenação de projetos em Cultura do Movimento (Procult/UFCA). É artista-dançarino e crítico de dança. Colabora com o PPGDança/UFBA. Escreve no www.enquantodancas.net. Email: joubert.arrais@ufca.edu.br.

Ficha do Trabalho

Título

    COREOPOLÍTICAS AUDIOVISUAIS: VIDEOCLIPES ENQUANTO MANIFESTOS

Resumo

    Propomos uma leitura coreopolítica de duas performances audiovisuais enquanto corposmídia da estética expandida do videoclipe: Boca de Lobo (Brasil, 2018), do rapper brasileiro Criolo, e This is America (EUA, 2018), do rapper estadunidense Childish Gambino (Donald Glover). Em suas distintas videografias comunicacionais, seriam obras artísticas consideradas videoclipes-manifestos que aprisionam nossa fruição no meramente expressivo ou, de fato, deles podem emergir coreopoliticidades dissidentes?

Resumo expandido

    A relação entre coreografia e videoclipe nos instiga pela dimensão ontológica, e também poética, do corpo em movimento, enquanto práxis artística de informação e comunicação. Como evidências, destacamos duas performances audiovisuais: Boca de Lobo (Brasil, 2018), do rapper brasileiro Criolo, e This is America (EUA, 2018), do rapper estadunidense Childish Gambino (Donald Glover).
    Quando coreografias são postas em prática, em geral, elas são dançadas. Mas não se trata apenas de uma “coreopolítica” de corpos no espaço urbano (LEPECKI, 2013), nem de um “corpomídia” como suporte tecnológico (KATZ & GREINER, 2005). Segundo Hewitt (2005), coreografia é a disposição e a manipulação de corpos uns em relação aos outros, juntando estética e política de modo não metaforizado com o social.
    No videoclipe, um produto midiático da cultura pop, evidenciam-se lógicas de pertencimentos transnacionais (SOARES, 2014). Tais lógicas encenam formas particulares de fruição e engajamento sociais, legando aos sujeitos, segundo este autor, “uma vivência estética fortemente pautada pela noção de performance”. Esse caráter performático é intensificado na experiência da convergência midiática.
    Desse modo, o que se propõem é uma articulação teórica na qual as práticas artísticas engendram-se com a sociedade e a política enquanto Coreopolíticas Audiovisuais. Sobre isso: o que há de coreopolítica nestas duas “narrativas audiovisuais”, uma de imagens coreografadas e a outra, de dança-ruído-dispositivo (LEPECKI, 2017, 2013)? Ou do que tais realidades ditas “americanas” são corposmídia de uma visualidade que imuniza (KATZ & GREINER, 2012)?
    O videoclipe Boca de Lobo agencia imagens ficcionais entrelaçadas, coreograficamente, com registros jornalístico-televisuais. Amplia nossa percepção da música e letra homônimas com a realidade brasileira recente, através da eleição presidencial de um candidato ultradireitista, alinhado com um movimento internacional de cunho economizante. Não por acaso, This is America viralizou como suposto manifesto. Foi coreografado pela ruandense Sherrie Silver, com a dança sul-africana Gwara Gwara, superando 300 milhões de visualizações no YouTube.
    O que os aproxima, contudo, está mais naquilo que os distingue. Em ambos, a violência contra corpos negros que move as estruturas da sociedade é denunciada como coreografias de expulsões, exclusões e extermínios. O de Criolo foi chamado de “This is America brasileiro”, diferente dos muitos vídeos-cover produzidos por amadores e profissionais de vários países, alguns como paródias (des)politizantes. É quando a coreopolítica se transforma em coreopolítica.
    Corpos são condicionados a se mover/deslocar por pressões sociais. Estes mesmos corpos passam a ser também vigiados, monitorados, judicializados. Transformados em imagens, já estão pré-coreografados por normas de conduta que esteticizam e enquadram como crime ou contravenção. As próprias imagens passam a ser coreografadas como ações audiovisuais no trânsito dentro-fora em sua processualidade fílmica, quando se comportam como corpos cinemáticos (SHAVIRO, 2015). Neles e com eles, as ações de ver-ouvir-mover referenciam atos e fatos que afirmam coragem e resistência, que são concretos como denúncias audiovisuais.
    Os dois videoclipes – um que coreografa imagens e outro que dança para coreografar imagens – são cúmplices não por serem sínteses imagéticas, muito menos narrativas fechadas em si mesmas. Pelo contrário, são performances audiovisuais que também acionam outras audiovisualidades, a exemplo de muitos vídeos tutorais que explicam e expandem nossos inconscientes estéticos (RANCIÈRE, 2009), “decifrando” posicionamentos políticos controversos.
    Então, o modo de lidar com as visualidades contemporâneas pode imunizar o ver/ouvir a dança de coreografia na coreografia de imagens. A questão é: esses videoclipes-manifestos aprisionam nossa fruição no meramente expressivo ou, de fato, podem tensionar e criar outras coreopoliticidades dissidentes?

Bibliografia

    HEWITT, Andrew. Social Choreography: Ideology as Performance in Dance and Everyday Movement. Durham/London: Duke University Press, 2005.
    KATZ, Helena & GREINER, Christine. Visualidade e Imunização: o inframince do ver/ouvir a dança. Anais do II Congresso da ANDA. São Paulo, 2012.
    KATZ, Helena; GREINER, Christine. Por uma Teoria Corpomídia. In: GREINER, C. O corpo: pistas para estudos indisciplinares. São Paulo: Annablume, 2005.
    LEPECKI, André. Exaurir a dança – performance e a política do movimento.. Trad. Pablo Assumpção. São Paulo: Annablume, 2017. [Exhausting Dance. London: Routledge, 2006] LEPECKI, André. Coreopolítica e coreopolícia. In: Ilha Revista de Antropologia. Online. Florianópolis, jan. 2013.
    RANCIÈRE, Jacques. O inconsciente estético. Trad. Mônica C. Netto. São Paulo: Ed.34, 2009. SHAVIRO, Steven. O corpo cinemático. Trad. Anna Fagundes. São Paulo: Ed. Paulus, 2015.
    SOARES, Thiago. Abordagens Teóricas para Estudos Sobre Cultura Pop. Revista Logos, online, dez. 2014.