Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    Luciana Ponso (PPGCINE)

Minicurrículo

    Luciana Ponso é professora, bailarina e desde 2003 desenvolve uma interface entre o vídeo e a dança. É doutoranda no PPGCINE UFF, mestre no Programa de Pós Graduação em Estudos Contemporâneos das Artes na UFF-RJ e graduada pela Faculdade de Dança Angel Vianna- RJ. Idealizou a Mostra Move de Videodança. Trabalha como colaboradora no Projeto Dança em Foco ministrando aulas de dança e videodança em diversas cidades do Brasil e América Latina.

Ficha do Trabalho

Título

    O que a tela autoriza a dança: do cine-dança em direção ao Passinho

Seminário

    Montagem Audiovisual: reflexões e experiências

Resumo

    Tomando o movimento como a principal interface entre dança e cinema, busca-se investigar como a relação corpo-câmera vai fixar-se em produções cinematográficas relevantes, atravessar o século XX fazendo surgir a linguagem da videodança, para chegar ao século XXI extremando essa relação com a imagem digital, como o fenômeno Passinho. A expressão “dançar o impossível” é aqui usada para designar o que o espaço da tela e a montagem autorizam a dança: lugares de reinvenção.

Resumo expandido

    Dançar o impossível é uma expressão usada por Lisa Kraus (2005) para designar o que raramente é possível ser visto no palco: coreógrafos, cineastas e artistas de mídia trabalhando com cinema e vídeo para desafiar a gravidade, criar mundos imaginários, multiplicar bailarinos, criar grafismos, acelerar e ralentar movimentos. Ao aproximar a relação corpo-câmera entre os primórdios do cinema, a videodança e as manifestações atuais de dança nas redes, estamos percebendo a potência do dançar o impossível para designar o que a tela autoriza a dança: “espaços impossíveis, trânsitos impossíveis entre espaços, a matéria escapa da sua física, o corpo de sua anatomia, o tempo confunde suas dimensões e sentidos”. (CALDAS, 2009, p. 28). Para além das representações banais do corpo na sociedade de consumo ou na cultura de massas, atentar para a produção de uma dança surgida e espraiada na tela é também uma prática política.
    As primeiras imagens da dança no cinema informam aspectos que perpassam a produção atual de videodança: a corporalidade como eixo, a composição pautada em preceitos coreográficos, o carácter interdisciplinar, a narrativa aberta. Quando Loie Fuller alia corpo à velocidade, luz, cor, e lança no espaço ondas cinéticas, causando efeitos capazes de alterar profundamente a percepção do corpo em movimento; ou quando Busby Berkeley coloca a câmera em lugares pouco tradicionais na filmagem de corpos dançantes criando imagens caleidoscópicas que jamais poderiam existir em uma cena convencional de teatro; ou ainda quando Fred Astaire usa a dança para mover as questões da própria trama, capaz de espraiar, irradiar e contaminar a narrativa após os gestos dançados, tudo isso nos informa que naquele momento a dança passou a experimentar novos espaços e tempos em sua associação com o cinema.
    Maya Deren não tratava da dança de forma documental ou como uma simples dança filmada, mas sim como filme-dança. Mais do que uma aproximação, Deren amalgamou estas duas artes do movimento, criando uma interface que hoje é reconhecida como videodança. O conceito de vertical film form, a centralidade do corpo e a interdisciplinaridade são questões percebidas por Maya Deren e permanecem com aqueles que se propuseram pensar a relação corpo-câmera.
    Práticas coreográficas estão dos dois lados da lente, câmeras portáteis estão na mão de bailarinos operadores, programas de edição de uso doméstico funcionam como padrão da indústria e assim, a rápida expansão do circuito de festivais especializados, fornecem um ready-made com alcance internacional (WHYTE, 2010). A prática alternativa e de vanguarda de Maya Deren envolvia o controle total das etapas de criação e difusão de seus filmes. Para Douglas Rosenberg (2012, p.317) o que está funcionando no trabalho de Deren e no cerne da dança na tela é o que se pode chamar de “rematerialização do corpo” por meio das técnicas do cinema, isto é, uma reconstrução literal do corpo que dança criando um corpo impossível, sem as restrições da gravidade e do tempo.
    Para Caldas (2012), o cinema sempre teve efeitos sobre a dança, o vídeo os prolonga e a imagem digital os extrema. A partir dos processos da cibercultura, vamos entender o que se passa com a relação corpo/câmera capaz de fazer surgir uma linguagem de dança sem precedentes, como o Passinho, onde os agentes das técnicas e métodos estão, não somente, mas sobretudo conectados pelo espaço das redes, mais especificamente, no espaço da tela, no que Pierre Levy chama de inteligência coletiva, um dos principais motores da cibercultura.
    A presença da dança na tela desde o surgimento do cinema, atravessando todo o século XX e adentrando o século XXI de forma ostensiva, pode constituir-se como parte da história, das teorias e das práticas das duas artes, fazendo alterar os dois campos em um caminho sem volta no que diz respeito a corpo, composição, tempo e espaço.

Bibliografia

    BRANNIGAN, Erin. Dancefilm: Choreography and the Moving Image. Nova York: Oxford University Press, Inc. 2011.
    CALDAS, Paulo. Dança em Foco, vol 4: Dança na Tela. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria/Oi Futuro, 2009.
    DEREN, Maya. Essential Deren. Ed. Brian McPherson. New York: McPherson & Company, 2005. 158. Print.
    KATZ, H. e GREINER, C. A natureza cultural do corpo. Lições de Dança 3. Rio de Janeiro: Universidade Editora, 2001.
    KRAUS, Lisa. Dancing the impossible: Choreography for the camera. Dance Magazine, 2005.
    LEVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999.
    OLIVEIRA, Hugo. Vem ni mim que eu sou Passinho. Dissertação de Mestrado. PPGCult, UFF, 2017.
    WHYTE, Christinn. The Evolution of the ‘A’ Word: Changing Notions of Professional Practice in Avant-garde Film and Contemporary Screendance. The International Journal of Screendance, 1.1, 2010 
    XAVIER, Ismail. O discurso cinematográfico. 3ª ed, São Paulo, Paz e Terra, 2005.