Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    Flávia Seligman (Unisinos)

Minicurrículo

    Bacharel em Jornalismo pela Famecos/ PUC RS. Mestre e Doutora em Cinema pela ECA/USP em 1990 e 2000. Pós-doutoranda no Programa de Pós Graduação em Design da Faculdade de Arquitetura da UFRGS (2019-2020), desenvolvendo a pesquisa DESIGN E CINEMA: GESTÃO E PLANEJAMENTO DA PRÉ-PRODUÇÃO DE UM FILME, supervisionada pelo Prof. Dr. Maurício Bernardes. Professora do Curso de Realização Audiovisual, da Unisinos. Diretora, produtora e roteirista audiovisual.

Ficha do Trabalho

Título

    SIM, TEVE DITADURA. A OUSADIA DE ROBERTO FARIAS EM PRA FRENTE BRASIL

Resumo

    Trabalho sobre o filme Pra Frente Brasil, de Roberto Farias, 1982, que conta a história de Jofre, um cidadão comum confundido com um militante, que acaba preso pela polícia, numa ação de repressão, em plena euforia da Copa do Mundo de 1970. Analisa a narrativa e os personagens, apontando como a situação é representada no filme em comparação com a realidade. Mais que isto, a forma como a situação do país é reconstruída dentro da possibilidade de apresenta-la no período em que foi rodado.

Resumo expandido

    Segundo a Revista Isto É O presidente Jair Bolsonaro afirmou na quarta-feira, 27 de março de 2019, que não houve ditadura militar no Brasil, mas admitiu que houvesse “probleminhas” no regime que iniciou em 1964 e foi até 1985. O presidente também incentivou que escolas e o próprio exército festejasse a data de 31 de março como marco da “revolução”. (https://istoe.com.br/comemoracao-de-1964-ficara-dentro-dos-quarteis-diz-bolsonaro-em-entrevista-na-tv/ Acessado em 18/04/2019)
    Em 1982 o cineasta Roberto Farias, falecido em 2018, apresentou no X Festival do Cinema Brasileiro de Gramado o filme Pra Frente Brasil que conta a história de Jofre, um cidadão comum que é confundido com um guerrilheiro no aeroporto do Rio de Janeiro e acaba preso pelo DOI-CODI. O país vivia a euforia da Copa do Mundo de 1970 e em meio a isto a família de Jofre, tipicamente de classe média, descobre uma realidade paralela de lutas, repressão e violência. O filme mostra cenas de interrogatório e de tortura praticados por policiais civis em “apoio logístico” ao governo. Tratava-se de uma ação da “meganha”, como conceituou Élio Gaspari no livro A ditadura escancarada (GASPARI, 2002) ao referir-se à polícia civil que “auxiliava” bravamente à “tigrada”, ou seja, aos militares, no combate à subversão.
    Neste trabalho abordo o filme de Farias como uma história contada no calor da hora, pois foi filmado em pleno governo do General João Batista Figueiredo. Analisando a narrativa e o desenvolvimento e representação dos personagens em três campos: os cidadãos comuns de classe média, os guerrilheiros e os policiais, traço o relato de Farias sobre a época. Importante também poder destacar as estratégias que o realizador utilizou para poder abordar um assunto tão vivo quanto perigoso, a ditadura militar. Ao contrário do que afirmou Bolsonaro, a ditadura brasileira existiu de 1964 a 1985, teve cinco presidentes, todos militares, nenhum eleito pelo povo. Tirou do Brasil as liberdades civis, instaurou a censura nos meios de comunicação e nas artes, exilou, prendeu, torturou, matou e escondeu os corpos de mais de 400 pessoas com o apoio estratégico do governo dos Estados Unidos, a colaboração financeira dos grandes grupos econômicos nacionais e internacionais que atuavam no país e a ação das demais ditaduras do Cone Sul, Argentina, Uruguai e Chile. Tudo isto com grande o propósito de evitar que o Brasil se transformasse numa grande nação comunista.
    Após ganhar o prêmio de melhor filme do Festival de Gramado, Pra Frente Brasil ficou preso na censura durante um ano inteiro. Mesmo no festival o filme causou grande polêmica porque parte da plateia entendeu que Roberto havia abordado o tema de forma superficial, sem colocar a verdadeira culpa nos militares, uma vez que os torturadores que aparecem são todos civis. Outra parte da plateia louvou a coragem do cineasta em mostrar cenas de perseguição, prisão e tortura (explícita, pau de arara, choques elétricos e afogamentos) levando em conta que a ditadura não havia acabado.
    Com o passar do tempo e a volta às democracias, muito filmes foram feitos sobre este tema, tanto no Brasil quanto na Argentina, no Uruguai e no Chile, ficção e documentários. A história sempre revisada evita que seja esquecida e o cinema é parte fundamental deste propósito.
    Pra frente Brasil foi um marco que mesmo mal compreendido na época, hoje se trata de uma referência muito importante. Por isto uma homenagem ao seu realizador e um trabalho sobre ele, para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça.

Bibliografia

    1. GASPARI, Elio. A ditadura escancarada. São Paulo: Companhia da Letras, 2002.
    2. ____________. A ditadura acabada. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2016.
    3. MORETTIN, Eduardo [et al.]. Cinema e história: circularidades, arquivos e experiência estética Porto Alegre: Sulina, 2017.
    4. MORETTIN, Eduardo e NAPOPLITANO, Marcos. (orgs.) O CINEMA E AS DITADURAS MILITARES. Intermeios, São Paulo, 2018.
    5. SELIGMAN, Flávia. O “Brasil é feito pornôs”: o ciclo da pornochanchada no país dos governos militares (Tese de Doutorado / ECA, USP, 2000).
    6. SILVA, Hadija Chalupe da e NETO, Simplício (org.) Os MÚLTIPLOS LUGARES DE ROBERTO FARIAS. Rio de Janeiro, Jurubeba Produções, 2012.