Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    PAULA TELLES DE MENEZES FARO (PUCSP)

Minicurrículo

    Doutoranda no programa de Comunicação e Semiótica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo na linha de pesquisa Dimensões Políticas da Comunicação. Mestre pelo mesmo programa com a dissertação “Procedimentos de Criação do Videoclipe no Cinema” orientada pelo Prof. Dr. Arlindo Machado. Ingressou no curso de graduação em cinema na Universidad del Cine em Buenos Aires, Argentina, concluindo-o na FAAP. É praticante e professora de Tai Chi Chuan.

Ficha do Trabalho

Título

    A dramaturgia dos corpos na mise-en-scène de Wong Kar Wai

Resumo

    Neste trabalho propomos uma reflexão sobre a dramaturgia dos corpos na mise-en-scène do filme O Grande Mestre de Wong Kar Wai. Utilizaremos a Teoria Corpomídia proposta pelas autoras Christine Greiner e Helena Katz para compreender os mecanismos através dos quais isto ocorre. Procuramos entender como esta dramaturgia, aliada a outros recursos da linguagem cinematográfica, narra a transformação histórica de um período nas artes marciais chinesas preservando sua memória.

Resumo expandido

    O Grande Mestre (Yīdài zōngshī, 一代宗师 – 2013) dirigido pelo cineasta de Hong Kong, Wong Kar Wai é o segundo filme em que o diretor trata de um tema bastante comum na cultura chinesa, as artes marciais. O primeiro foi Cinzas do Passado, de 1994.
    Embora o filme de Wong Kar Wai tenha recebido este título em inglês e português (O Grande Mestre) quando olhamos para o título original a tradução não seria exatamente esta. Yīdài zōngshī poderia ser traduzido também como Uma geração de Mestres. Faremos referência a ele usando esta tradução, já que acreditamos que é disso que o filme trata e também porque permite um distanciamento com relação à franquia com o mesmo título estrelada por Donnie Yen.
    Uma geração de Mestres levou dez anos para ser realizado e finalizado. Wong Kar Wai fez uma pesquisa extensa viajando por toda a China, entrevistando os mestres das antigas gerações e tradições e se aprofundando neste universo. Todos os atores passaram por treinamentos tradicionais e árduos para incorporar os estilos de artes marciais retratados no filme. Um dos seus objetivos para realizar o projeto, como diz no documentário que foi gerado a partir da pesquisa, era mostrar através do filme o significado da tradição das artes marciais chinesas e o pensamento e o comportamento que dão embasamento a elas, algo que hoje já não se encontra por lá.
    O filme trata de um período histórico marcado pela transição de uma concepção tradicional das artes marciais para aquilo que viria a ser uma concepção moderna. Isto está explícito não apenas na narrativa e na história do filme mas fundamentalmente na composição da dramaturgia dos corpos dos atores na mise-en-scène. Não poderia ser diferente tratando-se de Wong Kar Wai, que sempre tem os corpos dos atores como elementos narrativos.
    Na China, a Arte Marcial é uma cultura, um pensamento que é transmitido através de uma prática corporal e do movimento. Os sistemas de arte marcial como o Xing Yi, Ba Gua, Taiji e Wing Chun (alguns dos estilos retratados no filme) podem ser considerados como corpos de conhecimento estruturados que se atualizam no mundo através dos processos históricos e políticos. Diferente das concepções e imagens orientalistas evocadas pelos filmes de arte marcial da grande indústria hollywoodiana e também de Hong Kong, o filme de Wong Kar Wai procura através dos elementos da linguagem cinematográfica (movimentos de camêra, velocidade, música, montagem, etc.), tendo como primeiro recurso o movimento do corpo dos atores e suas coreografias em cena, aproximar o espectador destas expressões culturais, como elas se estruturam e como se transformam para permanecerem vivas.
    Para analisar o filme desde esta perspectiva a teoria corpomídia nos dará embasamento teórico para compreender estes processos e relações em profundidade, “Algumas informações do mundo são selecionadas para se organizar na forma de corpo – processos sempre condicionado pelo entendimento de que o corpo não é um recipiente, mas sim aquilo que se apronta nesse processo co-evolutivo de trocas com o ambiente.” (GREINER, 2013).
    A dramaturgia do corpo dos atores em mise-en-scène é fundamental para compor a narrativa de um filme que trata do movimento de transição de um período histórico, da transformação dos corpos em movimento que modificam uma cultura e uma expressão como as artes marciais chinesas. Fazendo isto, o filme se torna um meio para a compreensão do pensamento tradicional, sua relação com a arte marcial e seu processo de transformação, permitindo uma aproximação de saberes que vão além das dicotomias ocidente/oriente, corpo/mente, teoria/prática e natureza/cultura. Torna-se um registro que preserva e resgata a memória de um tempo perdido.

Bibliografia

    GREINER, Christine. Leituras do Corpo no Japão e suas diásporas cognitivas, São Paulo, SP: n-1, 2015.
    GREINER, Christine. O Corpo, Pistas para Estudos Indisciplinares. São Paulo, SP: Annablume, 2013.
    GREINER, Christine. Butoh: A Dance Experience to Recreate the Body beyond the East – West Dichotomies. International Research Symposium 38, 2010.
    KURIYAMA, Shigehisa. The Expressiveness of the Body and the Divergence of Greek and Chinese Medicine, Nova Iorque, NY, Zone Books, 1999.
    MONTEIRO, Fabrício Pinto. História das Artes Marciais Chinesas. Tradição, Memórias e Modernidade. Uberlândia, MG : Assis Editora, 2014.
    YUASA, Yasuo. The Body, Toward an Eastern Mind-Body Theory, New York, NY. State University of New York Press, 1987.