Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    Carla Schneider (UFPel)

Minicurrículo

    Professora e pesquisadora nos cursos de Cinema da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Doutora em Comunicação e Informação (UFRGS, 2014) pesquisa os modos de produção das imagens do cinema de animação; o contexto brasileiro sobre escolas e pesquisadores em animação no Brasil; a animação experimental brasileira e as mulheres no mercado brasileiro de produtos audiovisuais com animação. Participa do comitê que fundou, organiza e realiza o SEANIMA (Seminário Brasileiro de Estudos em Animação).

Ficha do Trabalho

Título

    Arqueologia na produção das imagens de três longas-metragens animados

Mesa

    Animação e efeitos visuais: questões de teoria e prática

Resumo

    Fundamentando-se em conceitos desenvolvidos por Vilém Flusser (caixa preta, aparelho, imagens técnicas), Lev Manovich (animação como lógica processual do cinema), Lucia Santaella (paradigmas evolutivos da imagem) e Richard Sennett (o dilema entre o artífice-artesão e as máquinas) esta pesquisa apresenta dados de três longas-metragens brasileiros realizados entre 1990 e 2013 (Otto Desenhos Animados) que derivam de modos de produção que alteram o estatuto das imagens do cinema de animação.

Resumo expandido

    Ao investigar os modos de produção das imagens do cinema de animação junto à realizadores que atuavam nesta área profissional entre os anos de 1990 e 2013, identificou-se transformações formuladas a partir das tecnologias analógicas e digitais vigentes.
    Tendo como fundamento conceitos desenvolvidos por Vilém Flusser (caixa preta, aparelho, imagens técnicas), Lev Manovich (animação como lógica processual do cinema), Lucia Santaella (paradigmas evolutivos da imagem) e Richard Sennett (o dilema entre o artífice-artesão e as máquinas), esta pesquisa selecionou uma amostra representativa de três longas-metragens brasileiros – Rocky e Hudson (Otto Guerra, 1994), Wood & Stock: Sexo, Orégano e Rock’n’Roll (Otto Guerra, 2005) e Até que a Sbórnia nos Separe (Otto Guerra, Ennio Torresan Jr., 2013) – que derivam de modos de produção que alteram o estatuto das imagens do cinema de animação, ou seja, promovem transformações.
    Na perspectiva de Vilém Flusser (2008, 2009), os modos de produção podem ser compreendidos através de três revoluções que se caracterizam como distintas, consecutivas e não excludentes entre si, isto é: (1) a substituição das mãos humanas pelas ferramentas, estabelecendo relações nas quais o homem é a constante e as ferramentas são a variável, homem-ferramenta; (2) a substituição das ferramentas pelas máquinas, evidenciando relações nas quais as máquinas são a constante e o homem é a variável, homem-máquina; (3) a substituição das máquinas por aparelhos eletrônicos, homem-aparelho, e neste ponto a teoria flusseriana defende que, por ser uma relação contemporânea, está em desenvolvimento e requer, portanto, observação e reflexão crítica.
    A partir dos estudos nesta pesquisa, ao verificar e identificar questões pertencentes aos aparelhos que produzem as imagens do cinema de animação destaca-se:
    (a) Na relação homem-aparelho, a constante é a programação que ocorre na caixa preta que se expressa via output (dados de saída) nas telas digitais (nos seus mais diversos formatos), e o homem e os aparatos no entorno das telas digitais são a variável. Os indícios desta constatação fundamentam-se nos registros fotográficos da equipe trabalhando (2007 a 2013) nas imagens do filme Até que a Sbórnia nos Separe’. Embora a relação homem-aparelho seja a mais característica e recorrente na atualidade, percebe-se que a relação homem-ferramenta é estimulada pelos aparelhos que produzem as imagens do cinema de animação. Nas entrevistas realizadas, nos depoimentos presentes em making of de filmes de animação e em conversas informais com profissionais deste campo de atuação, o discurso recorrente é: o computador (leia-se aparelho) é apenas uma ferramenta. Verifica-se, portanto, que está na caixa preta destes aparelhos a intenção de serem sentidos como ferramentas, como mera extensão da mão humana, embora – sabemos – sua constituição seja outra.
    (b) Parafraseando Lucia Santaella (2005), que traz esta questão para o campo das artes, os aparelhos que produzem as imagens do cinema de animação estimulam habilidades historicamente adquiridas. Em outras palavras, tais aparelhos reescrevem elementos já existentes em outras versões, ou outras vivências do fazer, que os precedem. Este é o princípio da especificidade, definido por Michael Foucault (1997) quando do reconhecimento de acontecimentos que se estabelecem pela presença de regularidades, mesmo que elas estejam reconfiguradas como o novo formato.
    Esta condição de reescrever algo que lhe precede, retoma o olhar flusseriano sobre as teorias científicas que originam os aparelhos. Ao invés de programar os aparelhos, tarefa frequentemente associada às engenharias como a Mecatrônica e a Informática, o homem tem seu comportamento programado pelos aparelhos. Partindo desse pressuposto, aliado às imagens encontradas na pesquisa in loco, identificou-se a superfície (papel ou tela digital), na qual os desenhos são feitos, como uma interface para o estudo nas transições dos modos de produção dessas imagens.

Bibliografia

    CARNEIRO, Gabriel; SILVA, Paulo Henrique (org). Animação brasileira: 100 filmes essenciais. Belo Horizonte: ABRACCINE: ABCA: Letramento, 2018.
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    FLUSSER, Vilém. O universo das imagens técnicas: elogio da superficialidade. São Paulo: Annablume, 2008.
    FLUSSER, Vilém. Filosofia da caixa preta: ensaios para uma futura filosofia da fotografia. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2009.
    FOUCAULT, Michel. A arqueologia do saber. 5.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997.
    MANNONI, Laurent. A grande arte da luz e da sombra: arqueologia do cinema. São Paulo: Senac, Unesp, 2003.
    MANOVICH, Lev. The Language of New Media. Cambridge, MA: MIT Press, 2001.
    SANTAELLA, Lucia. Por que as comunicações e as artes estão convergindo? São Paulo: Paulus, 2005.
    SANTAELLA, Lucia. Imagem: cognição, semiótica, mídia. São Paulo: Iluminuras, 2008.
    SENNETT, Richard. O artífice. 4. ed. Rio de Janeiro: Record, 2013.