Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    José Umbelino de Sousa Pinheiro Brasil (UFBA)

Minicurrículo

    Professor Associado IV da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia. Pós-doutorado no PPPGC – UFPE (2013/2014). Doutor em Comunicação e Cultura Contemporânea. (POSCOM/UFBA2007). Mestre em Artes Visuais – EBA/UFBA (1995). Documentarista realizou os filmes “A mãe” (Prêmio Especial no Festival de Gramado, 1998). “Lutas e Vidas” (1983) e “O que eu conto do sertão é isso…” (Prêmio de melhor filme Festival JB/Shell, 1979).

Ficha do Trabalho

Título

    Meteorango Kid & Caveira My Friend: memória dos anti-heróis marginais

Mesa

    MEMÓRIA(S) DA INVENÇÃO NO CINEMA BAIANO

Resumo

    A proposta enfoca Meteorango Kid: o herói intergaláctico (Andre Luiz Oliveira, 1969) e Caveira My Friend (Álvaro Guimarães, 1970), filmes siameses nascidos no cenário da contracultura baiana-brasileira, alicerces do cinema de invenção-marginal Soteropolitano. Equidistantes do cinema novo, Meteorango & Caveira são encenados dramaturgicamente por personagens irreverentes e insubmissos, base do ciclo superoitista – anos 1970 – e pais genéticos do Superoutro (Edgar Navarro, 1989).

Resumo expandido

    Meteorango & Caveira anti-heróis, urbanos soteropolitanos, são antes de tudo fortes e curtidores. Nascidos na plenitude do AI-5, descendentes diretos do Bandido da Luz Vermelha (Rogerio Sganzerla, 1968), eles seguem à risca o ditado: “quando a gente não pode, a gente esculhamba e avacalha”. Tomam emprestado a bandeira anárquica, reverberando a descrença na política, juntando-se a esse aparente desanimo político a mais perfeita tradução da revolta incondicional e da recusa a qualquer tomada de consciência. Alheios às utopias expostas pelos cinemanovistas, vão criar uma utopia própria que desagua de forma perceptível noutros movimentos, a exemplo do Ciclo do Super Oito e no surto do cinema “Marginal do Dendê” e de forma imperceptível noutras manifestações da contracultura, presente numa parte da vida musical do grupo Novos Baianos. A utopia anárquica dos deserdados habita um território no qual vivem os personagens Meteorango & Caveira, eles se constroem e se encontramos num cenário – Cidade do Salvador – aonde o desconforto individual funciona como possibilidade de se contrapor a farsa da vida garantida pelo estado autoritário e repressor, reproduzida, sistematicamente, no núcleo familiar.
    Meteorango Kid & Caveira My Friend são de certa forma “documentais”, retratam a vida cotidiana dos seus jovens personagens que não enxergam um palmo do nariz no futuro, (uma vez que naquele momento histórico não se revelavam as certezas futuristas); vivem o presente. Tampouco os personagens têm passado, guiam as suas ações dramáticas no “barato total”, nas “transas” e na música do agora, particularmente no rock. Prevalece nas suas ações as transgressões, as drogas e sobretudo a liberdade de ação-expressão marcada pelo uso do corpo. Não se censuram, encenam o que hoje poderia ser denominado de “politicamente incorreto”. Nas estruturas narrativas das películas há uma equivalência – predominante em todos os filmes que compõem a filmografia do cinema marginal -, ela é desconexa, parece estar faltando uma relação mais umbilical nas sequências. Porém, essa aparente falta de linearidade equivale a uma condição de “estética própria”, eis a grande “sacação” dos filmes; pois a virtude é a de não contar a estória de forma certa, correta, linear dentro dos cânones estabelecidos na plataforma do cinema convencional e de transparência. Marca indelével do Cinema Marginal foi a decomposição orgânica das suas cenas, agressiva numa explosão de imagens e sons que nem sempre se coadunam, mas estabelecem uma “filosofia orgânica translúcida”, se assim podemos definir o ato de criar dos seus inventores.
    Meteorango & Caveira têm semelhanças e dessemelhanças, entre si, pois são filmes realizados por jovens autores: Andre Luiz de Oliveira, diretor e roteirista, tem uma carreira promissora no cinema; enquanto Álvaro Guimarães (Falecido em 2008), foi mais dedicado ao teatro, e dirigiu apenas um curta metragem e o longa em questão. A trajetória dos filmes se bifurca Meteorango Kid participou da 5ª. Edição do Festival de Brasília em 1969, angariando os prêmios: Especial do Júri e o da OCIC; competindo ao lado de outros bons exemplos do Cinema Marginal A Mulher de Todos (Rogerio Sganzerla, 1969) e O Anjo Nasceu (Julio Bressane, 1969). Caveira My Friend concorreu na 6ª. Edição do Festival de Brasília em 1970 disputando com Azylo Muito Louco (Nelson Pereira dos Santos, 1970), Profeta da Fome (Mauricio Capovilla, 1970) e Deuses e os Mortos (Ruy Guerra, 1970), o grande vencedor do Festival. Conta a lenda urbana que Álvaro, não satisfeito como resultado do júri, queimou a cópia do filme na Praça dos Três Poderes.
    Meteorango Kid & Caveira deixaram rastros traçados que foram seguidos em o Superoutro no qual incorpora e faz parodia de um Superman caricato, subdesenvolvido sobrevoando no céu da Cidade do Salvador, espaço desconstruído por Meteorango Kid & Caveira. Personagens que fazem valer a frase glauberiana: “derrotar a província dentro da própria província.

Bibliografia

    BERNARDET, Jean Claude. O voo dos anjos São Paulo: Brasiliense, 1991.
    COHEN, Renato. Performance como linguagem. São Paulo: Perspectiva, 1989.
    DIAS, José Umberto (organização e notas). Walter da Silveira: O Eterno e o Efêmero [v. 3]. Salvador: Oiti Editora e Produções Culturais Ltda., 2006. pp. 50-57.
    FERREIRA, Jairo. “Transgressão incendiária”. Cinema de Invenção. São Paulo: Limiar, 2000. pp. 159-162.
    GODARD, Jean-Luc. Introdução a uma verdadeira história do cinema. São Paulo: Martins Fontes, 1989
    PUPPO, Eugênio e HADDAD, Vera. Cinema Marginal e Suas Fronteiras: Filmes Produzidos nas Décadas de 60 e 70. São Paulo: Centro Cultural Banco do Brasil/Heco Produções, 2004.
    SETARO, André. Panorama do cinema baiano. Salvador: Fundação Cultural do Estado da Bahia, 1976.
    XAVIER, Ismail. Alegorias do subdesenvolvimento – cinema novo, tropicalismo, cinema marginal. São Paulo: Editora Brasiliense, 1993.