Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    Rogerio Eduardo Moreira Pereira (UNICAMP)

Minicurrículo

    Mestrando em Multimeios na Unicamp, sob orientação do
    prof. Dr. Pedro Maciel Guimarães, possui graduação em Tecnologia da Informação pela
    Fatec-SP (2010) e graduação em Artes pelo Centro Universitário Claretiano (2014). Participa do Grupo de Estudos sobre o Ator no Audiovisual (GEAs) na Universidade Estadual de Campinas.Tem experiência na área de
    Tecnologia da Informação e Artes, com ênfase em Artes Visuais e cinema. Tem
    interesse na área de Cinema, com foco em História e Atuação no Cinema.

Ficha do Trabalho

Título

    La Parole Vivant – A declamação no cinema de Eugène Green

Resumo

    Esta pesquisa pretende investigar a declamação inscrita no cinema de Eugène Green, no qual a
    palavra se faz protagonista em detrimento da dramaticidade, identificando, relacionando e
    contrapondo as diversas características distintas da atuação e de seus locais de manifestação em
    sua obra. Para tal serão analisados os elementos formais de representação e apresentação em
    seus papeis codificadores e corporificadores da palavra declamada.

Resumo expandido

    Com fortes influências religiosas e sérias criticas à modernidade, Eugène Green
    explora a declamação em sua obra, acreditando encontrar ali respostas mais eficientes
    em sua busca pela representação do que ele denomina a palavra encarnada, com o
    propósito de trazer ao público contemporâneo uma linguagem que segundo ele é a única
    capaz de criar um elo do mundano com o divino. Para ele “na declamação, a fala não é
    mais uma idéia abstrata e irrelevante, como pode ser visto em sua forma escrita: o
    enunciado declamado, e sua sacralidade, existem através da encarnação da palavra no
    corpo e no sopro de um homem” (2001:25).
    A obra de Green tem como principal característica estética uma atuação em
    aberta recusa ao naturalismo, onde o apuro na entonação do texto e o minimalismo da
    expressividade produzem para ele uma interiorização dos diálogos, como se cada
    personagem, ao falar com o outro, falasse antes consigo mesmo, formalizando assim a
    instância declamatória. Em entrevista, ele relata sua poética:

    Quando eu filmo uma pessoa, é a energia interior que me
    interessa. Quando um ator faz uma interpretação
    psicológica, é sempre falso. O ator está constantemente
    pensando: o que devo fazer para expressar esta situação,
    ou essa emoção. Não há nada real. Uma interpretação
    psicológica é sempre intelectual. (Film Quaterly vol 68 n
    04)

    Para entendermos essa conformidade entre a declamação “encarnadora” da
    palavra e esta atuação distanciada da dramatização e da psicologização Stanislavskiana,
    recorreremos indubitavelmente à antítese proposta por Brecht, que definia o
    distanciamento como método de “retirar do acontecimento ou do caráter aquilo que
    parece óbvio, o conhecido, o natural, e lançar sobre eles o espanto e a curiosidade”.

    (Brecht apud Bornheim, 1992:243). Assim como na retórica clássica, escola formativa
    da declamação, o dialogo provocativo com o espectador era um fundamento basilar do
    teatro épico proposto por Brecht, uma forma de discursar com prerrogativas diretas de
    interlocução crítica através da recepção da audiência, indo de encontro aos então
    estabelecidos referenciais de ação, espaço e linearidade temporal do drama,
    fundamentadas na Poética de Aristóteles.
    Pretendemos demonstrar que do histriônico ao naturalista, a declamação sempre
    teve como matriz a apresentação, o emprego da palavra em sua forma oral em suas
    diversas aplicações e intenções, tanto no contexto de um fórum quanto no palco, a
    palavra e suas reverberações estabeleciam um diálogo direto com o público,
    potencializando a criação de imagens persuasivas.
    Dentro da historicidade do cinema essa dicotomia se mostra muito mais complexa
    diante das próprias implicações do dispositivo, porém através de um estreitamento de
    relação com o teatro, indubitavelmente esta passa hegemonicamente a dar ênfase ao
    intimismo, ao realismo do gesto, à psicologia, instaurando e aprimorando o registro
    naturalista. Já no cinema moderno, temos como primeiro grande referencial de uma
    contracorrente, a obra e os princípios estéticos propostos pelo cineasta francês Robert
    Bresson, que queremos evidenciar como influência imediata e paradoxal a Eugène
    Green. A aproximação entre as metodologias de atuação de Bresson e Green se
    entrelaçam através da evidente busca pela visualidade de algo enigmático que é
    concebida e não representada.
    O peso da palavra na obra de Green não se propaga apenas através do trabalho
    elaborado de entonação, nem através do espaço deixado pelo esvaziamento da
    eloquência expressiva do rosto. Sua potencialidade é resignificada muitas vezes pelo
    gesto, ou pela ausência dele, prezando pela minúcia da impassibilidade.
    Muitas das escolhas formais do cineasta são recriações do teatro barroco, porém,
    nos parece essencial para entender o cinema contemporâneo esse embate anacrônico de
    uma metodologia clássica como meio de apreender o que escapa da percepção da
    experiência espectatorial na modernidade.

Bibliografia

    AMIEL Vincent. Le corps au cinema – Keaton, Bresson, Cassavetes. Paris : PUF, 1998.
    AUMONT, Jacques. O cinema e a encenação. Lisboa: Texto & Grafia, 2008
    BORNHEIM, Gerd. Brecht: a estética do teatro. Rio de Janeiro: Graal, 1992
    BRECHT, Bertolt. Escritos sobre Teatro. Buenos Aires: Ediciones Nueva Visión, 1976
    BRESSON, Robert. Notas sobre o cinematográfo. São Paulo: Editora Iluminuras, 2014.
    CHION, Michel. La Voix au Cinéma, Cahiers du Cinéma, 1982
    CHAOUCHE Sabine, L'Art du comédien – Déclamation et jeu scénique en France à
    CRAIG, E. Gordon. “L’acteur et la sur-marionnette”, De L’art du théâtre, Paris, Editions
    Lieutier/Librairie Théâtrale, 1951, p. 59-63.
    GREEN, Eugène. La parole baroque. Paris : Desclée de Brouwer, 2001
    _______. Poetique du cinematographe. Paris: Actes Sud, 2009
    MEYERHOLD, Vsevolod. Do Teatro. [s.l.]: Iluminuras. 2012
    NAREMORE, J. Acting in the cinema. Berkeley/Los Angeles/London: University of
    California Press, 1988