Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    Juliano Rodrigues Pimentel (IFRS)

Minicurrículo

    Juliano Rodrigues é formado como roteirista e diretor de fotografia no curso de Realização Audiovisual (UNISINOS), doutor em comunicação com pesquisa em história do cinema brasileiro e filosofia (UFRGS). Atualmente é docente dos cursos de produção de áudio e vídeo, processos fotográficos e produção multimídia no Instituto Federal do Rio Grande do Sul.

Ficha do Trabalho

Título

    Uma certa angústia personiana: fundamentos narrativos em SP/SA

Seminário

    Teoria dos Cineastas

Resumo

    Este estudo investiga a possibilidade de uma teoria narrativa a partir da obra São Paulo Sociedade Anônima (1965), de Sérgio Person, considerando seu diálogo com a estética de um espírito do tempo pós-segunda guerra e na larga influência de uma crise existencial do indivíduo enquanto matriz narrativa e seus reflexos na construção dos espaços fílmicos simbólicos como caracterização da noção de angústia.

Resumo expandido

    Este estudo tem como objetivo discutir uma possível autoria teórica no cinema de Sérgio Person. Para tanto, parto da possibilidade do eixo criação-sustentação teórica inerentes a potência de uma única obra, ao contrário do que a legitimação de traços teóricos ao longo de um conjunto de filmes costumeiramente possibilitam averiguação. Propõe-se aqui, então, a teoria fílmica particular de uma obra como fenômeno de instante. Não se trata de uma consideração de marca estilística como potência de autoria, mas a composição como um todo enquanto um instrumento teórico na sua encarnação audiovisual – o filme, propriamente, enquanto instrumento teórico-filosófico.
    Frente a esta condição, o problema guia do estudo se organiza da seguinte maneira: como o filme São Paulo Sociedade Anônima (PERSON, 1965) inaugura uma possibilidade teórica ao apontar para uma poética muito particular do próprio autor sobre a construção narrativa?

    A hipótese de uma teoria personiana a partir de São Paulo Sociedade Anônima (1965) parece se caracterizar por uma maneira muito específica com que o diretor costura fluxos narrativos, conflitos internos aos personagens caracterizados por uma angústia muito aguda, e os reflexos destes fundos na própria relação dos personagens com os espaços que habitam. Parte deste contexto se dá também na medida em que a teoria é assumida no seu escopo crítico e acadêmico, mas não gestada ou premeditada como marca de autoria e produção. Dentro do que foi encontrado na pesquisa para o estudo, não há indícios de que Person estava esquematizando uma teoria para praticá-la na construção do filme, fato este que importa muito pouco, visto que este caso aparenta se aproximar da criação teórica espontânea, algo comum às expressões artísticas.

    A condição para o surgimento, ou disponibilidade teórica, do que nasce com SP/AS aparenta estar vinculada ao espírito de um tempo. As marcas e modulações da humanidade no período pós-segunda guerra reinauguram um humanismo em decadência frente a destruição externa, das cidades e nações, mas com reverberações ensurdecedoras na dimensão interna do indivíduo. O Brasil recebe estas influências por diversas frentes, muito em particular pela influência de um pensamento europeu na estruturação da educação e das poéticas artísticas nos anos 1950 e 1960.

    Embora em retrospectiva, analisando o que foi feito a partir do filme finalizado e exibido, alguns marcos teóricos ajudam a traçar o mapa estabelecido pela obra, e é desta amarração que parece surgir a teoria personiana em SP/SA. Primeiro, há a condição estética de possibilidades vinculadas ao espírito do tempo, o zeitgeist do pós-guerra e um tipo particular de crise humanística que ele estabelece. Segundo, tal espírito do tempo é fortemente influenciado pela reflexão existencialista a partir de Jean Paul Sartre, enquanto teoria, e Albert Camus, enquanto experimentação estética narrativa. Por terceiro, a simbologia dos espaços enquanto engrenagem narrativa a serviço deste tipo de conflito interno ao personagem demarcado pela noção de angústia.

    A marca de autoralidade de Person ultrapassa sua condição de estilo e possibilita um olhar aprofundado sobre as engrenagens e fluxos da contação da história. O próprio filme pode ser encarado como uma possibilidade teórica da estética audiovisual na medida em que nos entrega uma organização estética original e particular a respeito dos conflitos dos personagens e seus cos nos espaços em uma linguagem dominada por regras outras que as da construção teórica verbal. O próprio filme, nas suas potências estéticas, inaugura uma angústia urbana que se sustenta na sua própria condição fílmica.

Bibliografia

    BACHELARD, Gaston. A poética do espaço. São Paulo, SP: Martins Fontes, 2012.
    BORDWELL, David; THOMPSON, Kristin. Film History: An Introduction. Nova Iorque: Mcgraw-Hill Education, 2012.
    BORNHEIM, Gerd. Sartre. São Paulo: Perspectiva, 1971.
    RAMOS, Fernão (Org.). História do Cinema Brasileiro. São Paulo: Círculo do Livro, 1987.
    SARTRE, Jean-Paul. Existentialism is a Humanism. Londres: Yale University Press, 2007.