Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    Andréia de Lima Silva (IFMA)

Minicurrículo

    Possui mestrado em História pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Especialista em Jornalismo Cultural na Contemporaneidade, também pela UFMA. Graduada em Jornalismo pela mesma instituição. Tem experiência na área de assessoria de comunicação, produção textual para revistas e crítica cinematográfica. Atualmente é jornalista do Instituto Federal do Maranhão (IFMA). Desenvolve pesquisa na área de comunicação e história, com ênfase no estudo do cinema maranhense.

Ficha do Trabalho

Título

    Padrões de linguagem e identidade no filme Muleque té doido! (2014)

Resumo

    Esta comunicação propõe a caracterização dos padrões de linguagem e identidade maranhense do filme Muleque té doido! (2014) tomando por referencial teórico o imaginário e as representações culturais de um cinema ainda considerado local/regional. O filme em análise foi um fenômeno local de bilheteria e ficou em cartaz por cerca de três meses. Ao inserir o folclore e as lendas locais, o longa mesclou elementos “regionais” maranhenses com elementos “universais” hollywoodiano (em termos estéticos).

Resumo expandido

    A linguagem regional e os traços marcantes da identidade maranhense parecem decisivos para a composição da narrativa do filme Muleque té doido! (2014), longa- metragem de ficção do cineasta Erlanes Duarte, considerado um dos maiores fenômenos do cinema recente do Maranhão. Pesquisas do campo audiovisual têm demonstrado a relevância das produções cinematográficas para a difusão do imaginário e cultura de um povo, bem como das formas de sentir e pensar o mundo. Em filmes de circulação mais restrita a determinadas regiões, as escolhas técnicas e estéticas guardam certa consonância com as referências culturais do seu local de produção, o que, de certa forma, funciona como estratégia para gerar identificação mais direta com o público e assim o cooptar para a história contada na tela.
    Além desse recurso a padrões linguísticos e identitários regionais, filmes como Muleque té doido! (2014) possivelmente alcançam grande sucesso de público ao também recorrer à linguagem fílmica que remete aos padrões narrativos e estéticos do cinema hollywoodiano. Assim, neste longa, o caráter “regional” maranhense se mesclou ao “universal” hollywoodiano ao inserir elementos do folclore e das lendas locais na película, aproximando a obra do espectador que a recepciona. No filme, a questão da cultura local está presente em diferentes momentos, girando em torno do folclore, aparece, por exemplo, a lenda da serpente, que constitui a principal crença acerca da formação da ilha de São Luís; e o bumba-meu-boi, manifestação da cultura popular maranhense. Já no círculo das lendas urbanas e dos fatos recentes, entram no enredo a Gangue da Bota Preta (grupo perigoso conhecido na década de 1990 por supostamente perseguir estudantes para cortar o bico dos seios delas) e a Loka do Rio Anil (jovem maranhense que virou meme de internet ao aparecer, de forma tresloucada, numa foto que divulgava a inauguração de um grande shopping na cidade). A forma de se comunicar dos personagens e a maneira como São Luís é mostrada no longa-metragem fazem, também, parte da cultura local. O filme explora o vocabulário popular local com expressões e termos utilizados pelo maranhense, como: fulero, qualira, esparroso, mucura, catiroba, ralada, disgranha e tantos outros.
    O próprio título do filme, Muleque té doido, é uma expressão recorrente no Maranhão. Dessa forma, a peculiaridade linguística do Estado é explorada como estratégia para provocar a empatia do espectador que compartilha daqueles mesmos termos em seu dia-a- dia. Funciona, também, como recurso cômico, na medida em que muitas dessas palavras e expressões são engraçadas e só utilizadas naquele Estado. A trama é permeada de diálogos como estes: “Ai, só tem gente feia aqui (…). Mucura! Catiroba!”, ou mesmo no trecho “(Nikima) – Lá em Salvador a gente chama isso aí é de veado. (Erlanes) – Aqui em São Luís é qualira mesmo. E pense num qualira esparroso!”.
    O filme foi lançado em 2014 em três cinemas locais e não foi registrado na ANCINE. Ele obteve cerca de 15 mil espectadores e renda de aproximadamente 50 mil reais – dado considerado impressionante para um filme local. Em alguns cinemas, o longa, que estreou em 26 de junho de 2014, estendeu-se até o mês de setembro daquele ano, fato até então inédito para o cinema maranhense. O grande sucesso de bilheteria chegou a gerar um case na rede de cinemas Cine System, já que o filme maranhense superou a bilheteria de blockbusters internacionais que estavam em cartaz na mesma época. O sucesso nos cinemas de São Luís levou rapidamente o primeiro filme de Erlanes Duarte para o mercado da pirataria. O filme também foi disponibilizado na internet, no canal do YouTube, e já teve em torno de 3,5 milhões de visualizações. Tanto sucesso viabilizou a produção de mais dois filmes: Muleque té doido 2 – a lenda de Dom Sebastião (2016) e Muleque té doido 3 – mais doido ainda (2019). Em 2020 o o diretor irá produzir o quarto e último filme da saga.

Bibliografia

    ALBUQUERQUE JR., Durval Muniz de. A invenção do Nordeste e outras artes. Recife: FJN. Ed. Massaragana, 1996.
    BACZKO, Bronislaw. A imaginação social. In: LEACH, Edmund et al. Anthropos-homem. Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1985. p. 296-332.
    BAGNO, Marcos. Preconceito linguístico – como é, como se faz. São Paulo: Edições Loyola, 15ª ed., 1999.
    BAMBA, Mahomed. Do “cinema com sotaque” e transnacional à recepção transcultural e diaspórica dos filmes. Palíndromo – Processos Artísticos Contemporâneos, nº 5, 2011. Disponível em: http://mahomedbamba.com/site/wp-content/uploads/2017/12/006.pdf. Acesso em 14 de jan. 2019.
    BARTHES, Roland. Elementos de semiologia. Tradução de lzidoro Blikstein. 16. ed. São Paulo: Cultrix, 2006.
    BORDWELL, David. O cinema clássico hollywoodiano: normas e princípios narrativos. In: RAMOS, Fernão Pessoa (Org.). Teoria contemporânea do cinema: documentário e narratividade ficcional. São Paulo: Editora Senac, 2005. p. 277-301. v. 2.