Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    Marilice Amábile Pedrolo Daronco (UFSM)

Minicurrículo

    Doutoranda e mestre do Programa de Pós Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e especialista em Cinema pela Universidade Franciscana (UFN). Autora do livro O nosso cinema era super, sobre o Super-8 no interior do Rio Grande do Sul. Seus estudos estão ligados à apropriação de equipamentos amadores para a realização cinematográfica. Atualmente, pesquisa a trajetória de vida do imigrante Sioma Breitman, tendo como metodologia a história oral e a pesquisa narrativa.

Ficha do Trabalho

Título

    Casa Aurora: onde o cinema amador encontrou sua vitrine

Resumo

    Nos anos de 1930, a vitrine de um estúdio fotográfico do Rio Grande do Sul, a Casa Aurora, foi transformada em tela de exibição de registros fílmicos. Isso ocorreu graças à apropriação da tecnologia amadora do 16mm para o fazer cinematográfico pelo imigrante Sioma Breitman. Propomos construir memórias sobre as produções que Breitman batizou de Cinejornal Aurora, refletindo como elas constituem mídias da memória e nos convidam a outros olhares sobre o universo da experiência cinematográfica.

Resumo expandido

    A bitola 16 milímetros foi lançada em 1923 para uso amador. Quando esse tipo de película começou a ser comercializada pela Eastman Kodak Company, que se tornou a maior fabricante dessas filmadoras, a intenção era colocar no mercado um equipamento que atendesse às necessidades das filmagens caseiras. Mas seu uso acabou indo mais longe do que o dos registros de casamentos, batizados, aniversários, nascimentos. Apropriado para o cinema por realizadores amadores, esse tipo de câmera, por ser mais leve e mais barato que os equipamentos profissionais, possibilitou o surgimento de diferentes iniciativas ligadas ao campo cinematográfico. Uma delas é o Cinejornal Aurora, de Sioma Breitman (1903-1980), em Santa Maria, na região central do Rio Grande do Sul. Breitman não apenas filmou, devido às facilidades trazidas pelo 16 milímetros, como a venda de projetores caseiros, ele criou seu próprio circuito exibidor e transformou a vitrine de seu estúdio fotográfico, a Casa Aurora, na tela onde projetou o cotidiano da cidade nos anos de 1931 e de 1932.
    Uma vez que Breitman é um fotógrafo profissional reconhecido no Brasil, mas que seus fragmentos fílmicos são praticamente desconhecidos e pouco foi divulgado até hoje a respeito das exibições que realizava na vitrine de sua loja, a proposta desta comunicação é promover uma construção de memórias sobre o Cinejornal Aurora. Além disso, pretendemos apresentar a Casa Aurora como um espaço físico onde a experiência do cinema era vivenciada. Finalmente, pretendemos promover uma reflexão sobre como esse tipo de projeção fora do ambiente da sala de projeção tradicional dialoga com uma manifesta vontade de memória de seu realizador e caracterizar essas produções como “mídias da memória” (Assmann, 2011).
    Adotamos como base metodológica uma pesquisa qualitativa, que se ampara em pesquisa documental e bibliográfica e que antevê a necessidade de olhar para esses registros sem uma análise puramente estética do que foi filmado, mas que dê conta de compreender, acima de tudo, de que forma eles dialogam com a vontade de memória de seu realizador. Também trazemos para possibilitar essa leitura o cruzamento das informações com um livro de memórias escrito por Breitman nos anos de 1970.
    Como já foi destacado por Anita Simis (1997) antes dos anos de 1930 o cinema já havia se tornado um dos meios de comunicação mais importantes de seu tempo. No Brasil, os cinejornais se inserem nesse contexto tendo uso destacado para fins educativos e, posteriormente, com o Estado Novo, o de contribuir para a formação da ideia de nação e do desenvolvimento do que era de interesse do governo.
    Porém, quando se mergulha nos filmes do ucraniano, recuperados em 2007 pelo programa de restauro da Cinemateca Brasileira, é possível identificar elementos que fogem a essas amarras. O principal deles é não ter a pretensão de chegar às telas tradicionais. Breitman usava suas produções como um atrativo para que as pessoas olhassem para sua vitrine e até mesmo para que comprasse os equipamentos que vendia ou ainda para que contratassem seus serviços de filmagem. Prova disso é quando, em um trecho de um dos filmes convida ao público: “apreciando um film V.S. reviverá momentos de alegria e felicidade por vós experimentados! Tire pois um Film da sua vida.
    Nos interessa discutir por que o realizador decidiu chamar seus filmes de cinejornais. E, ainda, investigar quais são os vestígios que nos deixam as obras de Breitman.
    Souza (2013) nos faz pensar em como “dos quatro cantos do território nacional”, “das capitais ao interior, as cidades passaram a ser vasculhadas sob a ótica da modernização, incluindo-se os espaços de exibição como um dos signos do conjunto de elementos renovadores do lazer e da vida urbana moderna”. Pensamos ser interessante pensar essa questão a partir das vitrines da Casa Aurora, afinal, foi ali que os olhares de muitos moradores da cidade voltaram-se para o cinema pela primeira vez.

Bibliografia

    ASSMANN, Aleida. Espaços da recordação: formas e transformações da memória cultural. Tradução: Paulo Soethe. Campinas: Editora da Unicamp, 2011.
    BREITMAN, Sioma. Respingos de revelador e rabiscos. Porto Alegre, edição do autor, 1976.
    FIELDING, R. The march of time: 1935-1951. New York: Oxford University Press, 1978.
    FOSTER, Lila Silva. Cinema amador brasileiro: História, discursos e práticas (1926-1959). São Paulo, 2016. Tese (Doutorado em Meios e Processos Audiovisuais) — Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo.
    SIMIS, Anita. Cinema e cineastas em tempo de Getúlio Vargas. Revista de Sociologia e Politica, Curitiba, n. 9, p. 75-80, 1997.
    SOUZA, José Inácio de Melo. O cinema na cidade: algumas reflexões sobre a história da exibição cinematográfica no Brasil. Mnemocine, 2013. Disponível em: http://www.mnemocine.com.br/index.php/cinema-categoria/24-histcinema/200-resenhafr