Trabalhos Aprovados 2019

Ficha do Proponente

Proponente

    TAIS A S NARDI (ECA-USP)

Minicurrículo

    Mestre em Audiovisual pelo Programa Meios e Processos Audiovisuais da ECA-USP (2017), começou seu doutorado sobre direção de fotografia no mesmo programa em 2018, sob orientação da Profa. Dra. Maria Dora Mourão. Possui graduação no Curso Superior do Audiovisual também pela Universidade de São Paulo (2007). Trabalha desde 2002 como diretora de fotografia. Desde 2017 é coordenadora dos cursos da área de fotografia na Bucareste Ateliê de Cinema (SP).

Ficha do Trabalho

Título

    A teoria de Eisenstein e a direção de fotografia

Seminário

    Teorias e análises da direção de fotografia

Resumo

    Esta apresentação propõe uma reflexão sobre a direção de fotografia no cinema por meio de conceitos estabelecidos por Eisenstein em seu trabalho teórico, notadamente, os princípios de conflito, organicidade e montagem expandida. De maneira sucinta, procura-se estabelecer como esses ideais podem colaborar para a atividade de criação do conceito fotográfico de um filme e na análise de uma obra já pronta. Para tanto, o artigo se baseia na análise do filme Quase Memória, de Ruy Guerra (2016).

Resumo expandido

    A obra teórica de Sergei Eisenstein é bastante influenciada por seu trabalho como realizador e professor, atividades que lhe permitem uma visão prática do cinema, referente ao processo de produção das obras. Muitos de seus textos se utilizam de análises de seus próprios filmes para explicitar a aplicação de seus conceitos teóricos ligados à importância e à expressividade do cinema, e por isso nos parecem fontes estimulantes para uma discussão sobre a fotografia cinematográfica, atividade que une conceito à prática, a busca de expressividade a escolhas técnicas.
    Além disso, é possível perceber em seus textos grande preocupação com a construção da imagem, ligada especialmente à composição do plano e à manipulação das linhas e tons, elementos sob responsabilidade do diretor em conjunto com o diretor de fotografia e o diretor de arte. Eisenstein exibe um pensamento imagético e gráfico e por isso propomos aplicar à direção de fotografia suas definições em relação à montagem.
    A proposta desta apresentação é então utilizar termos e princípios propostos por Eisenstein para analisar a direção de fotografia como ferramenta expressiva dentro da construção de um filme brasileiro contemporâneo. Para isso, vamos partir do conceito de “montagem expandida”.
    A “montagem expandida” indica uma concepção da obra que engloba tanto a montagem interna a cada plano como a relação entre as “linhas de movimento” que formam o desenrolar do filme. Podemos compreendê-la como um pensamento estruturante sobre a obra, que atravessa todos seus elementos – mise-en-scène, imagem, som e montagem (como colagem de planos) –, e utilizá-la, portanto, como fundamento para analisar os aspectos da construção da imagem, intra e entre planos, que concernem ao trabalho do diretor de fotografia.
    A importância dada a montagem intra-plano é marcada pela crença na identificação entre forma e conteúdo. Se a forma gera significados ao criar conflito entre os planos, ela é um elemento especialmente importante para a expressão do tema em si e do ponto de vista do autor em relação aos eventos que retrata (EISENSTEIN, 1932). É daqui que pulamos para o conceito de fotografia cinematográfica criativa ou discursiva, emprestando este segundo termo ao modo como muitos autores se referem à montagem de Eisenstein.
    Através das ideias de Eisenstein buscamos valorizar uma fotografia desassociada da ideia de registro e conectada à ideia de criação de sentido. Essa direção de fotografia discursiva se baseia na construção do plano como justaposição de camadas de significados estabelecidos pelos diversos elementos da imagem – enquadramento, movimentos, tom, cor, linhas, forma, profundidade e ritmo. O diretor de fotografia cria maneiras visuais de contar a história, que formam relações polifônicas com os outros elementos do filme – som, interpretação, figurinos, cenários, montagem, etc. – de modo a fortificar os sentidos da obra. Essas relações são construídas sobretudo pela organização de conflitos ou afinidades entre as imagens do filme.
    Para Eisenstein, o conflito é o princípio fundamental da montagem. Também é a essência do apelo emocional do filme e de sua construção ideológica por se apoiar no dinamismo característico do ser e da vida. O conflito é a chave da relação produzida pela emenda entre fragmentos, que permite a comparação entre eles; que por sua vez possibilita a percepção de temas e sub-temas e suas sínteses em um novo significado. É a percepção dos conflitos internos à obra que guiará a análise de Quase Memória.
    Quase Memória é um filme dirigido por Ruy Guerra, com direção de fotografia de Pablo Baião (2016), em que nos é apresentado o encontro de um personagem com ele mesmo em outro momento de sua vida. Carlos Velho e Carlos Jovem repentinamente se encontram no mesmo lugar e passam a discutir como e porque essa união aconteceu. O aparecimento de um embrulho de conteúdo incerto os faz lembrar do pai, um jornalista excêntrico chamado Ernesto.

Bibliografia

    AUMONT, J. Montage Eisenstein. Paris: Editions Albatros: 1979.

    BLOCK, B. A narrativa visual: Criando a estrutura visual para cinema, TV e mídias digitais. Tradução Cláudia Mello Belhassof. São Paulo: Elsevier, 2010.

    EISENSTEIN, S. A Forma do Filme. Tradução de Teresa Ottoni. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1990, p. 49-70.

    ________. The Film Sense. Edição e tradução de Jay Leyda. New York: Meridian Books, 1957.

    MOURÃO, D. “A montagem cinematográfica como ato criativo” In Significação: revista de cultura audiovisual. v. 33, n. 25, p. 229-250. São Paulo, 2006.

    QUASE Memória. Direção: Ruy Guerra. Roteiro: Ruy Guerra, Bruno Laet e Diogo Costa, a partir da obra de Carlos Heitor Cony. Direção de fotografia: Pablo Baião. Brasil: Canal Brasil, Globo Filmes, Kinossaurus Filmes, 2016.