Trabalhos Aprovados 2018

Ficha do Proponente

Proponente

    Juliano Gomes (PPGCOM ECO UFRJ)

Minicurrículo

    Crítico e professor. Formado em Cinema, Doutorando (ECO-UFRJ). Lecionou na Pós Grad. em Audiovisual na UNOCHAPECO, além do curso de audiovisual da Vila das Artes (Fortaleza -2014), Academia Internacional de Cinema, e no Festival Fronteira (Goiânia). Redator na Revista Cinética. Faz a concepção audiovisual de espetáculos de teatro e dança desde 2010. É performer em “Help! I need somebody”. Dirigiu os curta “…”(2007) e “As Ondas”(2016), com Léo Bittencourt. Programa a Sessão C

Ficha do Trabalho

Título

    Entre o não ser e o ser outro: o cinema decolonal de André Novais

Seminário

    Cinema Negro africano e diaspórico – Narrativas e representações

Resumo

    A proposta deste trabalho é analisar como três curtas do realizador mineiro André Novais (Fantasmas, Pouco mais de um mês, Quintal) se estruturam a partir da construção gradativa de uma indefinição. Os filmes se encaminham para uma espécie de estatuto de incerteza da sua forma de ser, de seu registro. Analisaremos as imagens em diálogos com as ideias de “zona de não ser” (Fanon) e fugitividade (Moten&Harney), em busca de pavimentar um pensamento acerca um cinema decolonial hoje.

Resumo expandido

    A proposta deste trabalho é analisar como três curtas do realizador mineiro André Novais (Fantasmas, Pouco mais de um mês, Quintal) se estruturam a partir da construção gradativa de uma indefinição. Os filmes, cada uma a sua maneira, ao mesmo tempo que se constroem, que avançam em sua narrativa, se encaminham para uma espécie de estatuto de incerteza da sua forma de ser, de seu registro.

    Interessa aqui analisar como cada filme instaura esse estado de indefinição e pensar os desdobramentos estéticos e políticos deste gesto dos filmes. Desdobrar como que as relações que os filmes constituem se tornam ações de resistência em relação a forças de contenção, ordenamento e indexação.

    A hipótese é que esta tendência nos filmes está relacionada ao que o escritor Frantz Fanon chama de “Zona de não ser”, ao referir-se a experiência do negro. A aposta é que a atuação e a construção dessas zonas de não ser, espaço-tempos onde que se é não está plenamente definido, é uma forma de resistência estética e existencial à à forças que querem ordenar os corpos e as imagens.

    A potência do cinema de Andr´r Novais estaria justamente não maneira aparentemente serena com que os filmes constroem sua irrupção, sem dar sinais de um repertório superficialmente iconoclasta.

    Nesse corpo de filmes está em curso uma insuspeita associação entre a vida de uma comunidade não branca, a banalidade do cotidiano de uma cidade média brasileira (Contagem, MG, no caso) e o irromper de outros mundos, ou de outras ordens, no seio desta aparente normalidade. Não há pureza aqui, somente a convivência e montagens de mundos, de formas de mundo distintas, que os filmes fazem dialogar.

    Fanon caracteriza essa “zona de não ser” como “uma ontologia irrealizável, uma posição aquém do domínio do ser, essa rampa essencialmente despojada, onde um autêntico ressurgimento pode acontecer”. O cinema como rampa onde a permanência das estruturais coloniais irá tomar belos tombos.

    O horizonte desta comunicação é o trabalho decolonial das imagens, onde este “ressurgimento” possa ser construído e exercido pelo manejo das imagens e experiências. O trabalho político se dá à medida em que os filmes não se coadunam com a estabilidade das expectativas e das forças que o querem encerrar em categorias, registros, ou conceitos estanques. Os filmes insistem em ser mais, em ser mais uma outra coisa, e outra mais.

    Fanon dirá em “Os condenados da terra” que a descolonização é “um programa de desordem absoluta”. Interessa-me justamente esta possibilidade construção da desordem, de uma forma ativa de “não ser” como forma de fuga das forças do poder que nos açoitam com ordem e encarceiramento.

    Neste sentido, outra aposta teórica é a ideia de fugitividade, a partir do livro “The undercommons – Fugitive planning and black study”, de Fred Moten e Stefano Harney. Penso que estes filmes ativam este estado prenhe móvel, instável, precário, que não se deixa capturar, nem imobilizar.

    Como intuito final, se deseja estabelecer uma ponte entre uma contribuição conceitual que este cinema formula e uma fortuna crítica que sugere um tipo de ação política que se caracteriza por sua força em criar cisões na episteme colonial e sua sede de ordenamento. O cinema de Novais, onde o banal se torna veículo de explorações infradelirantes, nos parece um território fértil para praticar estas fricções.

    Todo cinema verdadeiramente político tem a obrigação ética de formular uma língua. O exercício desta formulação é o nossa matéria principal de estudo.

Bibliografia

    FANON, Frantz. Pele Negra, Máscaras Brancas. Salvador: Editora da Universidade Federal da Bahia, 2008.

    _____________. Os Condenados da Terra. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968.

    GOMES, Paulo Emílio Sales. Cinema: trajetória no subdesenvolvimento. São Paulo:
    Paz e Terra, 1986.

    HARNEY, Stefano & MOLTEN, Fred. The undercommons – Fugitive planning and black study. Nova Iorque, Minor composition, 2013

    MBEMBE, Achille. Crítica da Razão negra. São Paulo: N-1 edições, 2018

    MOMBAÇA, Jota. Não se nasce monstra, tampouco uma se torna: sobre inexistência social e fim de mundo. Dissertação de Mestrado. PPGCS-UFRN. Natal, 2017