Trabalhos Aprovados 2018

Ficha do Proponente

Proponente

    Lucas Rocha Coimbra da Silva (PUC-Rio)

Minicurrículo

    Graduado em Cinema pela PUC-Rio, instituição na qual é mestrando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação. Possui diversas experiências no mercado audiovisual, no qual atua principalmente como roteirista. Atualmente desenvolve um projeto de mestrado analisando as representações da adolescência no cinema brasileiro, orientado pela professora doutora Andréa França Martins.

Ficha do Trabalho

Título

    Fora do Jogo: A adolescência no cinema brasileiro contemporanêo

Resumo

    É notável no cinema brasileiro contemporâneo os esforços em relação à representação da adolescência, os quais abrangem cada vez mais sua pluralidade de vivências, sejam elas devidos à fatores regionais, sociais ou de ordem emocional. O presente trabalho busca analisar essa diversidade de filmes e as escolhas estéticas de seus diretores, tendo como principal foco de análise as produções A Vizinhança do Tigre (Affonso Uchoa, 2014) e Os Famosos e Os Duendes da Morte (Esmir Filho, 2009).

Resumo expandido

    É notável no cinema brasileiro contemporâneo os esforços em relação à representação da adolescência, os quais abrangem cada vez mais toda sua pluralidade de vivências, sejam elas devidos à fatores regionais, sociais (culturais, econômicos) ou de ordem emocional. O presente trabalho busca analisar essa diversidade de filmes, e as escolhas estéticas de seus diretores ao retratar os jovens e adolescentes brasileiros, tendo como principal foco de análise as produções A Vizinhança do Tigre (Affonso Uchoa, 2014) e Os Famosos e Os Duendes da Morte (Esmir Filho, 2009).
    A idade biológica que traz a chamada “adolescência” é um período de inúmeras mudanças na vida de um indivíduo, no qual ele é colocado em uma parcela separada da sociedade e, ainda sem a capacidade econômica dos adultos, luta para entender melhor a si mesmo e quais caminhos seguir dali em diante. É o que Pierre Bordieu chama de no man’s land social, isto é, o jovem de irresponsabilidades provisórias, que para algumas situações é adulto, e para outras, criança. O autor complementa sua tese afirmando que esse é um dos efeitos mais poderosos decorrentes da situação do adolescente: a “existência separada que os coloca socialmente fora do jogo” (Bordieu, 1983, p.4). “Fora do jogo” é uma expressão que serve muito bem para definir o lugar social dos personagens apresentados no filme A Vizinhança do Tigre (Affonso Uchoa, 2014). Na narrativa em que ficção e documentário parecem se confundir, o retrato dos jovens e adolescentes moradores do bairro Nacional, em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, dá uma outra dimensão do quão fora de jogo socialmente alguém pode estar. Entrar nesse mundo e retratá-lo com honestidade foi um desafio que Affonso Uchoa dominou através de uma estética realista que dá voz, forma e espaço aos corpos adolescentes que preenchem a tela com atuações tão fortes quanto a própria realidade que os rodeia.
    Seguindo um caminho diferente, e quase oposto (tanto do ponto de vista da geografia quanto da linguagem), Esmir Filho buscou inspiração no romance Os Famosos e os Duendes da Morte, de Ismael Caneppele, para retratar a vida de outro adolescente fora do jogo. O filme de 2009 lança um olhar sensível à vida de um jovem que se vê isolado do mundo em uma pequena cidade no vale do Rio Taquari, no extremo sul do Brasil. Uma região de clima frio e úmido, na qual uma colônia alemã se instalou no século XVIII e se manteve isolada desde então em suas crenças e costumes. Esmir Filho trabalha a fotografia delicada e a edição de viés mais experimental do longa-metragem para construir essa atmosfera que cerca um protagonista dividido entre seus desejos potencializados pelas possibilidades de acesso ao mundo através da internet e as tradições coletivas ancestrais da cidade onde vive. O recorte de vida do protagonista de Os Famosos e os Duendes da Morte dialoga com o que o pensador francês Edgar Morin (1967) identificou como um período de contestação das estruturas já estabelecidas e caminhos predeterminados pelos adultos, sendo assim o momento em que o jovem desenvolve afinidade com o niilismo frente às suas próprias escolhas.
    Ambos os filmes aparecem como um potente avanço em direção a um cinema capaz de contemplar muitas das camadas de subjetividade e das questões complexas que atravessam a juventude brasileira, no caso, as experiências de uma adolescência periférica, ainda que opostas entre si. Quando um filme é colocado ao lado do outro, têm-se a dimensão da diversidade de vivências jovens possíveis em um país continental, tão marcado por suas desigualdades sociais e discrepâncias geográficas. A análise das disparidades e semelhanças entre as duas obras, que percorrem diferentes caminhos e assumem diferentes escolhas para compor o mesmo universo temático, nos permite entender a importância de um olhar mais zeloso para as novas histórias brasileiras protagonizadas por jovens e adolescentes.

Bibliografia

    MORIN, Edgar, “Juventude” in: Cultura de Massas do Séc. XX – O Espírito do Tempo – NEUROSE, Forense-Universitária, Rio de Janeiro, 1967.
    BORDIEU, Pierre, “A Juventude é apenas uma palavra” in: Questões de Sociologia, Editora Marco Zero Limitada, Rio de Janeiro, 1983.
    COMOLLI, Jean-Louis, “Sob o risco do real” in: Ver e Poder, A inocência perdida: Cinema, Televisão, Ficção, Documentário, Editora UFMG, Belo Horizonte, 2008.
    BUENO, Zuleika de Paula. “As harmonias padronizadas da juventude: a produção de um cinema juvenil brasileiro” in Comunicação, Mídia e Consumo. São Paulo, v. 5, n. 13, p.41-69, 2008
    ROCHA, Everardo; PEREIRA, Cláudia. Juventude e consumo: um estudo sobre a comunicação na cultura contemporânea. Mauad, Rio de Janeiro, 2009.
    HALL, Stuart. Cultura e representação. Rio de Janeiro: PUC-Rio; Apicuri, 2016.
    LOBO, Júlio César. O adolescente no cinema brasileiro de ficção 1953-2014, Cinémas d’Amérique latine, 23 | 2015, 26-35.