Trabalhos Aprovados 2018

Ficha do Proponente

Proponente

    Fábio José Paz da Rosa (UFRJ/UNESA)

Minicurrículo

    Doutorando em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Integrante do grupo de Pesquisa Currículo e Linguagem Cinematográfica. Mestre em Educação, Cultura e Comunicação, especialista em Organização Curricular e Prática Docente e Licenciado em Pedagogia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro . Professor auxiliar da Universidade Estácio de Sá e coordenador do Projeto de pesquisa “Cinema, Raça e Gênero na produção curricular: Perspectivas Interculturais na formação docente.

Ficha do Trabalho

Título

    A presença negra em Abolição: uma perspectiva pedagógica Decolonial

Seminário

    Cinema e Educação

Resumo

    Este trabalho visa compreender de quais formas a presença negra se constitui em Abolição (1988), de Zózimo Bulbul, por meio de corporeidades, estéticas e histórias. O cineasta propõe uma pedagogia singular em que o filme evidencia novas epistemologias quando os conhecimentos são presentificados pelas análises de intelectuais negros. Dessa forma, o documentário constitui uma pedagogia decolonial ao questionar as opressões e reconceituar a existência por meio de oralidades antes subalternizadas.

Resumo expandido

    Abolição (1988) é um documentário dirigido e produzido por Zózimo Bulbul. O filme demonstra novas formas de analisar as conjunturas tanto da opressão quanto da liberdade por meio da ressignifcação da produção de presença.
    Hans Ulrich Gumbrecht (2010) conceitua presença em primeiro lugar às coisas tangíveis aos nossos corpos. Em seguida, a presença se constitui pela experiência estética que se relaciona pela quantidade de desafios radicais que se produz tanto em nossas mentes quanto em nossos corpos. Por último, a história é problematizada enquanto presentificação dos mundos passados ou como um desejo de presentificação desse passado (GUMBRECHT, 2010).
    Em Abolição (1988), o corpo negro é problematizado por Zózimo Bulbul para romper com as formas como se analisam os subjugamentos. No plano 8, os corpos negros são evidenciados pela alegria proporcionada pelo carnaval. No entanto, logo em seguida, esse corpo continua a sofrer no interior dos trens urbanos no retorno às suas comunidades após o desfile das escolas de samba.
    A participação de intelectuais e ativistas negros possibilita a produção de corporeidades que não são apenas resultados de uma alegria fugaz. Os contatos visuais e auditivos com pensadores negros em Abolição possibilitam acalmar os corpos para que os espectadores se coloquem atentos ao mundo e consigam construir novas sensibilidades.
    A produção estética na cinematografia bulbuliana deve ser compreendida nessa relação de constituição dos sujeitos negros em meio às oposições entre opressões e liberdades, corpos livres e potentes e reanalisados por meio dos estereótipos, do passado e do presente, para assim tornar audível e visível os paradigmas das culturas afro-brasileiras fundamentados em não-hierarquizações dos conhecimentos.
    Essa interdependência de conhecimentos pode ser analisada no plano 30 em que mostra um dos pesquisador em Abolição narrando a importância da Praça Onze, na Zona central do Rio de Janeiro, como território de resistência fundamentado nas mulheres negras ao apresenta Tia Carmem, uma das guardiãs da cultura afro-brasileira.
    Apesar da anciã não se pronunciar e apenas balançar a cabeça ao concordar com as palavras do pesquisador, há uma construção estética que demonstra a ideia da mulher como a guardiã do conhecimento ancestral. Enquanto o pesquisador está em pé explicando, mas em um nível do solo bem abaixo, Tia Carmem está acima, delicadamente com as mãos pousadas sob o parapeito da janela de sua casa. As vestimentas de cor branca sob a cabeça e o corpo da referente senhora evidenciam o caráter ao mesmo tempo religioso e de respeito ao samba nascido naquela região.
    Essa construção estética é uma potencialidade que rompe com a dualidade do passado e do presente em que diferentes tempos históricos são construídos através de palavras ditas e não ditas. Jacques Rancière (2010) problematiza o regime estético das artes em uma relação com o antigo em um princípio de artisticidade fundamentados em tempos e povos historicamente desconsiderados.
    Bulbul demonstra em Abolição que a oralidade é o canal para que corporeidades e diferentes estéticas sejam evidenciadas por novas epistemologias que colocam em xeque a própria História. Dessa forma, Abolição apresenta o posicionamento de Zózimo Bulbul que busca reestabelecer uma Pedagogia de resgate da memória ancestral pensado, problematizado e reconceituado pela intelectualidade negra. Esse posicionamento está em consonância com a Pedagogia Decolonial em que Catherine Walsh (2009) afirma que é uma prática capaz de pluralizar, problematizar e desafiar as colonialidades epistêmicas construindo retóricas em que a insurgência negra é uma constante nos processos de produção dos conhecimentos.

Bibliografia

    GUMBRECHT, Hans Ulrich. 2010. Produção de presença: o que o sentido não consegue transmitir. Rio de Janeiro: Contraponto: Ed. PUC-RIO.

    RANCIÉRE, Jacques. 2010. O espectador emancipado. Lisboa: Orfeu Negro.

    WALSH, Catherine.2009. Interculturalidade crítica e Pedagogia decolonial: In-surgir, re-existir e re-viver; In CANDAU, Vera Maria (org.). Educação intercultural na América Latina: entre concepções, tensões e propostas. Rio de Janeiro: 7letras.