Trabalhos Aprovados 2018

Ficha do Proponente

Proponente

    Denise Trindade (UNESA)

Minicurrículo

    Dra.Comunicação e Cultura UFRJ. Professora no Curso de Cinema da Unesa. Pesquisadora em Poéticas Visuais Faperj/Unesa.

Ficha do Trabalho

Título

    Abstração e Memória no Cinema Brasileiro Contemporâneo

Resumo

    Nesse artigo verificaremos nas narrativas de três filmes brasileiros atuais a presença de imagens abstratas que em uma relação plástica com as vanguardas cinematográficas e o cinema expandido propõem deslocamentos temporais, colocando em cena a memória como acontecimentos de imagens. Os diversos usos do vídeo realizam imagens figurais estendendo a temporalidade fílmica, afirmando a intensidade e apreensão corporal dos fenômenos no encadeamento de imagens.

Resumo expandido

    A cineasta Paula Gaítan realiza em seus filmes obras que alternam passado e presente, vivido e imaginado, por meio do vídeo em uma relação com as artes plásticas. Ao intervir na própria natureza de uma imagem documental, ela recria atmosferas intervindo em imagens do passado, como no filme Diário de Sintra (2010) no qual vemos fotos de Glauber Rocha que brotam nos galhos de uma árvore ou quando ela dispõe uma fotografia do cineasta em meio às ondas, e em voz off diz: “Do oceano, entra em cena uma miragem”. Julia Murat, em seu primeiro filme “Histórias que só existem quando lembradas” (2011), utiliza imagens produzidas por meio de pin-hole, utilizando uma técnica artesanal no filme digital, enfatizando que além da cena ou do retrato, uma foto registra a própria inscrição do tempo. A imagem de uma personagem idosa projetada sobre um muro com fungos, é uma inscrição cinemática na qual o tempo é o protagonista. Em “Aboio” (2005) de Marília Rocha, câmeras velozes retratam paisagens intensificadas por tons sépia e estouradas, alternadas por imagens coloridas e abstratas em que o céu é o limite, interrompem os relatos dos vaqueiros do sertão. Seja nas fotografias ampliadas, recortadas, em detalhes, seja no giro das imagens em movimento, a memória irrompe em brechas temporais, unindo passado e presente. Ao evocarem todos os tempos, como os das narrativas imemoriais, sagradas e filosóficas, entre silêncios e cantos um sertão antigo se confunde ao atual. Por vezes factuais, por vezes imaginárias e literárias, os relatos dos vaqueiros reconfiguram sua beleza e a magia em camadas de sons e imagens em sua plasticidade.
    Philipe Dubois ao aproximar plasticidade e figural aponta que nossa memória e percepção são marcadas por acontecimentos de imagens nos quais a imagem fílmica nos atingiria mais pela potencia de sua abordagem plástica, da ordem do afeto, que de sua dimensão narrativa, tornando presente a força intrínseca da matéria da imagem.
    Deleuze, em a Lógica da Sensação diferencia figural e figurativo, afirmando que o figurativo implica na relação de uma imagem a um objeto, que ela é encarregada de ilustrar e narrar, realizando assim o objetivo da representação, e o figural ocorre como um corte nesse objetivo, procurando afirmar, através da relação de uma imagem com outras imagens, o que ali escapa ou tende a escapar.
    Os detalhes figurais de Rocha assim como as paisagens abstratas de Gaítan e Murat apresentam-se assim como fissuras nas narrativas figurativas por onde a memória escapa como presença intensiva da matéria.

Bibliografia

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    Plasticidade e Cinema: a questão do figural. In HUCHET, Stéphanie. (Org.) Fragmentos de uma teoria da arte. São Paulo. Edusp. 2012.

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    RICOUER, P. A memória, a história, o esquecimento. SP. Ed.UNICAMP. 2007.
    SENRA, Stela. A parte do segredo: Diário de Sintra e a interlocução do cinema