Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Marcelo Monteiro Costa (UFPE)

Minicurrículo

    Marcelo Costa é doutor em Comunicação com ênfase em estética pelo PPGCOM da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Atualmente é professor adjunto do Departamento de Comunicação e coordenador do curso de Cinema e Audiovisual da UFPE. Também atua como roteirista e realizador de filmes.

Ficha do Trabalho

Título

    Cosmopoéticas do sensível e ecoansiedade no cinema contemporâneo.

Resumo

    A eclosão de narrativas marcadas pela ansiedade ecológica parece ecoar traços de um novo paradigma estético. O presente trabalho dedica-se a pensar como o colapso ambiental encontra ressonância no cinema contemporâneo, ao propor regimes de imagens que remontam a uma cosmopoética do sensível como aprofundamento da experiência de mundo. Três filmes norteiam a investigação: Memória (Apichtapong Weerashetakul, 2021); O Mal não existe (Ryusuke Hamagushi, 2023) e Cidade campo (Juliana Rojas, 2023).

Resumo expandido

    A recente aparição de filmes e narrativas em que a questão ambiental desponta como um sintoma parece propor novos regimes de imagens e sons, que remontam a uma cosmogonia da imanência ser-humano e natureza.

    Em Memória, a orquidófila escocesa Jessica Holland está em Bogotá para visitar sua irmã, quando é atormentada por um estrondo metálico que lhe priva do sono. Isso a leva a investigar sua origem em estúdios de som e na selva colombiana, numa jornada em que memória, história colonial e reconhecimento ancestral ganham sentido; sobretudo na floresta, espécie de refúgio das forças cósmicas e contraponto à cosmofobia da cidade. Os planos longos e contemplativos associam-se à natureza gutural do som que se repete, como bombardeios cósmicos, soluços telúricos, num cinema em que a presença da paisagem parece reveladora de uma cosmopoética do sensível.

    O esgotamento dos recursos naturais pela voracidade capitalista é o mote de O Mal não existe. Takumi, líder ambiental, vive com sua filha Hana uma vida simples, ditada pelos ciclos da natureza, num vilarejo nos arredores de Tóquio. A chegada de emissários de um grande empreendimento de turismo ambiental, um escape das grandes cidades, surge como ameaça à água e aos recursos naturais. A dicotomia cidade e campo assume aqui a imagem de um abismo, entre formas inconciliáveis de viver e de se relacionar com a natureza. A radicalidade da não conciliação vocaliza a inconformidade e a revolta que caracterizam o sentimento de angústia ambiental. As imagens contemplativas da natureza, combinadas ao tempo estendido, remontam a uma temporalidade que refuta sua mercantilização. A escalada do conflito ganha contornos míticos, quando forma animal e humana conjuram-se no mesmo propósito cósmico, numa deambulação da imagem entre a metáfora, o fantástico e a metamorfose (Coccia, 2020).

    Em Cidade campo, a relação entre os espaços se dá numa via de mão dupla, já que o filme apresenta duas histórias de migração entre cidade e campo. Num primeiro momento, Joana é uma trabalhadora rural que vai à São Paulo para encontrar sua irmã, após o rompimento de uma barragem inundar sua terra natal. É interessante notar que o movimento do campo para a cidade não mais obedece a uma dinâmica social de busca de oportunidades, é antes um gesto de sobrevivência ao desastre ambiental que soterrou cidades inteiras, e cujo efeito paradigmático expõe a relação trágica entre desenvolvimentismo desenfreado e inconsequência ambiental. Já na segunda parte, Flávia se muda com Mara, sua companheira, para a fazenda que herdou do pai, falecido recentemente. E nesse revirar de memórias familiares em meio à paisagem idílica e ao convívio com os animais, as personagens enfrentam suas frustrações e fantasmas numa temporada em que ancestralidade e natureza flertam com o fantástico.

    No diálogo entre os três filmes é possível encontrar ressonâncias estéticas que apontam para uma cosmopoética do sensível como (re)conhecimento do mundo.

Bibliografia

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    FERDINAND, Malcolm. Uma ecologia decolonial: pensar a partir do mundo caribenho. São Paulo: UBU editora, 2022.
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