Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Karla Bessa (Unicamp)

Minicurrículo

    Pesquisadora do Nucleo de Estudos de Genero Pagu, professora dos programa de pos-graduação em Multimeios, Instituto de Artes, Unicamp.

Ficha do Trabalho

Título

    Contra-realismos antirracistas no audiovisual feminista contemporâneo

Seminário

    (Re)existências negras e africanas no audiovisual: epistemes, fabulações e experiências

Resumo

    Nesta apresentação proponho uma análise do episódio Mancha, da série Histórias Impossíveis (2022). Idealizada, escrita e dirigida por um time de criadoras negras e indígenas, as Histórias impossíveis apresentam o que Rosalind e Schoonover denominam de imaginários anticoloniais, queer e afrocentrados. Destaco no episódio o modo como as tensões e conflitos raciais e sociais são abordadas na clássica relação entre patroa/empregada, dentro de uma proposta estética que aproximo do contra-realismo.

Resumo expandido

    Partindo das reflexões de Galt (2023) sobre o cinema e sua longa história na construção de imaginários anticoloniais, este trabalho se volta para as Histórias Impossíveis (2022/2023), composta por cinco episódios independentes, elaborados por Renata Martins, Jaqueline Souza e Grace Passô, em colaboração com as escritoras Thais Fujinaga, Hela Santana, Graciela Guarani e Renata Tupinambá. A série tem como eixo narrativas femininas, de autorias negras e indígenas, estruturadas dentro do realismo mágico ou, como prefiro denominar, de contra-realismo (Fisher, 2022), como uma estratégia estética de crítica social.
    O episódio Mancha comporta algumas das características fundamentais das contranarrativas feministas mencionadas por Johnston, como: experimentações estéticas que vão além da denúncia das desigualdades de gênero nas telas e das disputas de visibilidade, além de modos de ver objetificadores e fetichizantes. No entanto, a série vai muito além, ao mobilizar as dinâmicas e os poderes dos modos de racialização, expondo, de maneira escurecida, a tentativa da branquitude de ser invisível. O conflito entre a Patroa (branca) e a Empregada Doméstica (negra) é apresentado de forma a interseccionar as diferenças raciais com as de classe, ambas confrontadas no mesmo gênero (mulher cis).
    Escurecer é um verbo que afirma a proposta estética de Everlane: “O que eu faço, esteticamente, é cultura negra; nós não clareamos as coisas, nós as escurecemos porque é na escuridão que residem as reflexões e introspecções mais profundas”. Para realizar a análise aqui proposta, alinho a perspectiva de Everlane com a noção de corpo e agentividade de Ann Lafont, a fim de pensar uma iconografia da emancipação das mulheres negras nas diásporas (ou seu legado), em contrapartida à necessária reterritorialização subjetiva de mulheres brancas de classe média e escolarizadas.
    Em um segundo momento do texto, analiso os recursos estéticos utilizados na construção das personagens, a narrativa como um todo e as construções visuais do episódio, para refletir sobre o “jogo de cena” na colocação cara a cara dos limites da democracia racial. Limites estes que conduzem ao desespero da máscara branca pseudo-passiva da personagem Mayara (Isabel Teixeira). Por sua vez, a protagonista Laura (Luellen de Castro) e suas amigas encenam algo muito próximo ao que Beatriz Nascimento denominou de devir negro (Nascimento, 2022), ressignificando, em Mancha, a própria noção de “quarto de empregada”.

Bibliografia

    FISHER, Mark. Realismo Capitalista: Não Há Alternativa? Tradução de Rodrigo Nascimento. São Paulo: Autonomia Literária, 2020.

    GALT, Rosalind; SCHOONOVER, Karl. “Os mundos do cinema queer: da estética ao ativismo”. ArtCultura, Uberlândia, v. 17, n. 30, p. 97-107, jan./jun. 2015. Disponível em: https://seer.ufu.br/index.php/artcultura/article/view/34814.

    JOHNSTON, Claire. “Women’s Cinema as Counter-Cinema”. In: THORNHAM, Sue (Ed.). Feminist Film Theory: A Reader. Nova York: New York University Press, 1999. p. 31-40.

    LAFONT, Anne. Uma Africana no Louvre: A História de uma Obra de Arte. Tradução de André Telles. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2021.

    MARTINS, Renata; SOUZA, Jaqueline; PASSÔ, Grace, em colaboração com FUJINAGA, Thais; SANTANA, Hela; GUARANI, Graciela; TUPINAMBÁ, Renata. Histórias Impossíveis. Série audiovisual, 2022/2023.

    NASCIMENTO, Beatriz. O Negro e o Poder: sua história, seu legado. Organização de Alex Ratts e Maria Inês Dolci. São Paulo: Perspectiva, 2022.