Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Karol Souza Garcia (UFC)

Minicurrículo

    Karol Garcia é professora de língua e literaturas em língua francesa no Departamento de Letras Estrangeiras da UFC e do Programa de Pós-Graduação em Letras – Literatura Comparada da mesma instituição.

Coautor

    Guilherme Gonçalves da Luz (UFRGS)

Ficha do Trabalho

Título

    Dissolução de categorias narrativas em L’Immortelle (1963), de Alain Robbe-Grillet

Resumo

    Neste trabalho, propomos o diálogo entre a análise de uma sequência de L’Immortelle (1963), de Alain Robbe-Grillet, outro filme do autor, L’année dernière à Marienbad (1961) e as experimentações verbais do autor-cineasta do Nouveau Roman. Para tanto, contamos com os ensaios de diversos cineastas, romancistas e críticos, contidos na coletânea Les critiques de notre temps et le Nouveau Roman e na obra de Jacques Aumont, de A análise do filme (2011) a Comment pensent les films (2021).

Resumo expandido

    Nos filmes L’année dernière à Marienbad (1961) e L’Immortelle (1963), vemos repetições na construção da intriga, no manejo de certos recursos narrativos e em alguns exercícios experimentais. Dado o que as imagens nos oferecem: interrogações, propomos mapear os caminhos de expressão do autor-cineasta (como uma espécie de esboço de sua poética) do que é a sua narrativa em cinema e as relações que estabelecem com o seu trabalho literário, notoriamente aqueles vindos de seu movimento de filiação, o Nouveau Roman. Propomos uma apresentação em quatro momentos: I uma brevíssima introdução sobre o autor e sua obra; II um rápido resumo dos dois filmes mencionados, com ênfase em L’Immortelle ; III comentários sobre o movimento do Nouveau Roman e seus entusiastas e críticos e, IV finalmente, os resultados da análise de uma sequência de L’Immortelle, relacionando-os ao coletivo no qual se inscreve e ao encerramento de um ciclo de experimentações narrativas da modernidade, deixando o caminho aberto para os contemporâneos. Alain Robbe-Grillet (1922-2008) é uma figura pública controversa. Respeitado como escritor, a maior parte do seu cinema – sobretudo a partir do seu terceiro filme Trans-Europe-Express (1966) – é vista pejorativamente como gratuitamente lasciva. Engajou-se, junto aos escritores da revista Tel Quel, nas investigações meta-narrativas, em oposição à revista Les Temps modernes, dirigida por Jean-Paul Sartre, que abria-se para o mundo e suas tensões (a libertação argelina, a inserção dos escritores africanos, as grandes migrações da metade do século XX, o Vietnam, a crescente hegemonia norte- americana e outros). Junto aos colegas, erroneamente rotulados de herméticos, agitou o Nouveau Roman, aquele que seria um movimento literário de abertura do verbal para os outros modos de perceber – e por que não descrever ? – o mundo: o teatro, a fotografia e o cinema. Os modos de fazer artísticos estavam perdidos, assim como as palavras. Retumbava a assertiva de Esperando Godot (1952), de Samuel Beckett: “Não há nada a fazer”. É preciso, no entanto, continuar a viver quem vivo permanece, como nos sugere o Teatro do absurdo de Beckett quando coloca o suicídio de lado e deixa os personagens em suspenso. Como, então, pensar novos espaços? Como construir personagens que sejam capazes de agir nas narrativas desse novíssimo mundo? Como pensar o tempo e o problema da cronologia? E, antes de tudo, como narrar? Barthes (1972), em Littérature objective, coloca a literatura de Robbe-Grillet como aquela que substitui violentamente o personagem pelo objeto, repetindo nossos fetiches de consumo em diversas camadas. Os personagens não são materialmente estilhaçados, como em uma explosão de granada (para lembrar Apollinaire), eles são fantasmagóricos, emudecidos, planificados. Não possuem rosto ou personalidade, reduzem-se a suas ações que, na maioria das vezes, consistem em repetir, irrefletidamente, movimentos diários, perambular ou, ainda, andar em círculos para encontrar um final que é também o início. Em L’Immortelle, um estrangeiro flana por Istambul e encontra uma mulher misteriosa com quem tem uma breve relação. Ela desaparece e ele passa a buscá-la, em uma enorme cidade. O personagem erra pelo espaço estranho e sua musa, em cena, permanece constantemente imobilizada, destacando seus aspectos físicos ao modo de célebres planos hollywoodianos. Os personagens secundários, que povoam a cidade, são igualmente desvelados em planos congelados que se assemelham a uma fotografia, salvo por pequenas manifestações da fisiologia, como a respiração ou um espasmo, que deixam entrever um ator. A mise-en-scène do cinema, aqui, provoca estranheza, nem sempre a sequência apresenta um personagem que se direciona para sentar ou levantar, ou mover-se de um canto a outro do plano. Há uma hesitação, a revelação do ofício do ator em gestos inacabados. O roteiro fica exposto e este coloca o personagem em tensão com os outros elementos da construção cinematográfica.

Bibliografia

    AUMONT, Jacques; Michel, Marie. A análise do filme. Lisboa: Texto e Grafia, 2011.
    AUMONT, Jacques. Comment pensent les films. Paris: Mimesis, 2021.
    BARTHES, Roland. La littérature objective. In: pp 67 – 73. OUELLET, Réal et alli. Les critiques de notre temps et le nouveau roman. Paris: Garnier Frères, 1972.
    BARTHES, Roland. L’effet de réel. In:_____. Essais critiques IV: le bruissement de langue. Paris: Seuil, 1984. pp. 167-175.
    BAQUÉ, François. Nouveau roman. Paris: Bordas, 1972
    FOUCAULT, Michel. A arqueologia do Saber. Rio de Janeiro: Forense universitária, 2013.
    GRILLET, Alain-Robbe. Les Gommes. Paris: Editions Minuit, 1953.
    GRILLET, Alain-Robbe. Nouveau roman, homme nouveau. In: OUELLET, Réal et alli. Les critiques de notre temps et le nouveau roman. Paris: Garnier Frères, 1972