Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Talitha Gomes Ferraz (ESPM/ PPGCine-UFF)

Minicurrículo

    Professora da ESPM-Rio e do PPGCINE-UFF. Doutora em Comunicação em Cultura pela ECO-UFRJ, com pós-doutorado pelo Centre for Cinema and Media Studies – Ghent University (CIMS-UGENT). Coordenadora do GP Modos de Ver (ESPM-UFF/CNPq) e do HoMER Network – History of Moviegoing, Exhibition and Reception Network, além de pesquisadora membra do IMNN – International Media and Nostalgia Network.

Ficha do Trabalho

Título

    Ruínas de cinemas de rua: hauntologia, imaginários e espacialidades

Seminário

    Cinema e Espaço

Resumo

    Discutimos a desaparição de cinemas de rua, fenômeno que se intensificou a partir dos anos 1980, associado a transformações urbanas, socioculturais e tecnológicas. Examinamos os processos de arruinamento de tais dispositivos, tendo como uma das bases teóricas a noção de hauntologia. Enfocamos os casos das ruínas de dois cinemas abandonados do bairro de Ramos, subúrbio do Rio de Janeiro, analisando como esses espaços deteriorados refletem a relação entre cinema, cidade e públicos.

Resumo expandido

    Os processos de desaparição e arruinamento de cinemas de rua nas cidades se associam a intrincadas transformações que incluem tanto as reorganizações dos lugares e da quantidade de tempo destinados ao lazer cinematográfico nas realidades urbanas, dinâmicas socioculturais e cotidianos dos indivíduos quanto mutações tecnológicas e industriais ocorridas no âmbito das mídias audiovisuais a partir das últimas décadas do século XX. De modo generalizado, o apagamento físico de equipamentos coletivos de lazer cinematográficos em meio às calçadas (não apenas no Brasil) é um fenômeno iniciado com maior força nos anos 1980, aproximadamente.

    Desde então, muitos cenários urbanos vivenciaram a subtração de cinemas de rua (dos palácios da exibição às salas mais modestas), os quais após terem suas funções exibidoras encerradas foram destinados a outras atividades comerciais/culturais (mantendo ou não características arquitetônicas e design originais), demolidos ou simplesmente abandonados à mercê das ações do tempo.

    São justamente os extintos cinemas de rua remanescentes deste último caso o objeto de nossa discussão, isto é: antigas casas exibidoras abandonadas e inoperantes, cujas estruturas, em variados graus de deterioração, permanecem visíveis nas paisagens citadinas como ruínas urbano-cinematográficas. Refletiremos sobre como essas ruínas– que se aderem a diferentes camadas temporais– são capazes de reverberar, conjugar e representar memórias, nostalgias, experiências e imaginários ligados à relação entre cinema de rua-públicos-cidade, tendo em vista contextos que tanto podem elogiá-las como relegá-las ao desprezo ou ao plano dos interditos.

    Interessa-nos neste trabalho aproximar a ideia de ruínas urbano-cinematográficas da noção de hauntologia pensada por Mark Fisher (2022) a partir de Jacques Derrida, além de acepções sobre o conceito de ruína elaboradas por Walter Benjamin (1984), Svetlana Boym (2011) e Andreas Huyssen (2014), principalmente no que se refere à imagem de presença-ausência que este termo reflete e às possibilidades de tensionamento de critérios tais como corporeidades, ambiências e espacialidades que, por sua vez, orbitam em torno da figura da sala de cinema e seus engendramentos com a cidade e as pessoas.
    Ao mesmo tempo, recorreremos à expressão “ruínas urbano-industriais” (SANTOS e SPADONI, 2022) para pensar os espaços decadentes resultantes da derrocada de um projeto de mundo pautado pelas intenções da mega industrialização e da racionalidade técnica.

    Entendido como um dispositivo/tecnologia de época que reinou quase absoluto por boa parte do século XX, fortemente ancorado em um primado simbólico de legitimidade (a despeito das poderosas investidas de outros modelos de sala de cinema e demais dispositivos de circulação/acesso/fruição audiovisual), o cinema de rua convencional estaria, nesse sentido, entre tais equipamentos destituídos de protagonismo ou validade imediata diante de novas funções e expectativas de uso dos espaços traçadas pelas lógicas do capitalismo contemporâneo. Portanto, daí também advêm os casos de extintos cinemas de rua hoje transformados em ruínas ou destroços.

    Para isso, nos valemos dos casos de dois extintos cinemas localizados no bairro de Ramos, subúrbio da cidade do Rio de Janeiro. Por meio da observação dos escombros do Cine Rio Palace (1962-1972) e das ruínas do Cinema Rosário/Ramos (1938-1992), e das percepções acerca da paisagem atual que os vestígios urbano-cinematográficos ajudam a compor no espaço, pretendemos refletir sobre as implicações materiais e simbólicas que se entrelaçam nos processos de destituição e arruinamento de tais cinemas, tendo em vista a abordagem teórica acima anunciada.

Bibliografia

    BENJAMIN, W. Origem do drama barroco alemão. Tradução, apresentação
    e notas de Sérgio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 1984.
    BOYM, S. Ruinophilia: appreciation of ruins. In: Atlas of Transformation. Transit, 2011. Disponível em: http://monumenttotransformation.org/atlas-of-transformation/html/r/ruinophilia/ruinophilia-appreciation-of-ruins-svetlana-boym.html Acesso em: 04.abr.2025.
    FISHER, M. Fantasmas da minha vida: escritos sobre depressão, assombrologia e futuros perdidos. São Paulo: Autonomia Literária, 2022.
    HUYSSEN, A. Culturas do passado-presente: modernismos, artes visuais, políticas da memória. Rio de Janeiro: Contraponto, 2014.
    SANTOS, M. S.; SPADONI, F. Contravenção em ruínas arquitetônicas contemporâneas. V!RUS, n. 24, 2022. [online]. Disponível em: http://www.nomads.usp.br/virus/papers/v24/729/729pt.php. Acesso em: 04.abr.2025.