Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Cristina Alvares Beskow (UNICAMP)

Minicurrículo

    Cristina Alvares Beskow é doutora em Meios e Processos Audiovisuais pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP). De 2018 a 2020, foi professora de audiovisual na Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR). Atualmente, é pesquisadora de Pós-Doutorado no Instituto de Artes/Unicamp e professora credenciada no Programa de Graduação em Comunicação Social – Midialogia da Unicamp.

Ficha do Trabalho

Título

    (In)visibilidades do documentário social/militante de Dolly Pussi

Seminário

    Cinema e audiovisual na América Latina: novas perspectivas epistêmicas, estéticas e geopolíticas

Resumo

    Dolly Pussi (1938-2022) foi uma documentarista do Nuevo Cine Latinoamericano. Apesar da pouca projeção, dirigiu os curtas-metragens El hambre oculta (1965), Pescadores (1968), Operativo Estanislao Lopez (1973) e Historia argentina: la nación desmembrada (1973), em meio às turbulências políticas e ditaduras militares na Argentina. Esta apresentação analisará as (in)visibilidades destes documentários sociais e militantes, buscando refletir sobre os apagamentos das cineastas mulheres do período.

Resumo expandido

    Entre as décadas de 1960 e 1970, Dolly Pussi (1938-2022) foi uma das cineastas do Nuevo Cine Latinoamericano. Neste período, em meio às turbulências políticas e ditaduras militares na Argentina, tornou-se documentarista e uma das articuladoras do I Encontro de Cineastas Latino-Americanos, ocorrido no Festival de Viña del Mar, em 1967, no Chile. No entanto, apesar de sua participação nesse processo, sua trajetória e filmografia são pouco citadas na historiografia.

    Dolly Pussi estudou na Escola Documental de Santa Fé, onde realizou seu primeiro fotodocumental. O exercício envolvia pesquisa de campo, registro fotográfico e escrito sobre a realidade social nos rincões da cidade. Dolly Pussi produziu um fotodocumental no Hospital de los Niños, sobre desnutrição infantil, material que teve continuidade no segundo ano do curso, com a produção de seu primeiro curta-metragem El hambre oculta, de 1965, que apresenta alguns dos recursos utilizados em Tire Dié, como uma espécie de voz sociológica (Bernardet) e entrevistas dubladas. Esta estratégia narrativa se tornou uma das marcas dos documentários de denúncia do período: uma voz over, masculina, grave e professoral que apresenta dados e informações sobre o tema tratado com imagens ilustrativas. Em contraste com essa voz, o depoimento de uma mulher, Mariana, moradora de um bairro pobre que carrega sua filha nos braços em direção ao hospital. Sua voz, no entanto, está dublada, provavelmente pelas limitações técnicas de captação de som direto. El Hambre oculta foi um dos quatro documentários dirigidos por mulheres exibidos no Festival de Mérida, Venezuela, em 1968, de um total de 61filmes.

    O segundo filme de Dolly Pussi é resultado de seu trabalho de conclusão de curso, o curta-metragem Pescadores, de 1968. Dolly Pussi queria captar as entrevistas com som direto, mas não tinha os equipamentos necessários. Assim, contou com o apoio do amigo Raymundo Gleyzer, que tinha um gravador Nagra que poderia ser conectado à câmera Reflex e, assim, junto ao companheiro da cineasta, o produtor Edgardo Pallero, captaram o som das gravações. O curta-metragem aborda o trabalho de pescadores da ilha e tem como dispositivos narrativos a observação da realidade, alguns depoimentos com som direto e música do compositor uruguaio Daniel Viglietti. Pelas filmagens na água, o filme foi considerado ousado na época e chegou a ser exibido no Festival de Viña del Mar, no Chile, em 1969.

    Quando Dolly Pussi se formou, tornou-se professora e diretora do Centro Experimental da Escola de Santa Fé, responsável pelos trabalhos práticos dos alunos. Em 1973, produziu Operativo Estanislao Lopez, que aborda uma ação política da Juventude Peronista, a JP, organização na qual militava no período. Neste mesmo ano, também dirigiu o documentário Historia argentina: la nación desmembrada, que teve um primeiro corte ainda em 1973 e depois foi remontado no ano de 2010.

    De uns anos para cá, a história do cinema vem sendo recontada de outro ponto de vista, de uma perspectiva contra-hegemônica daqueles e daquelas que foram invisibilizados das narrativas oficiais. Michelle Perrot (2007) ao indagar se existe uma história das mulheres aponta que esta foi constantemente apagada pela falta de vestígios e de interesse público em guardar e preservar arquivos que retratassem sua existência cotidiana, resultando numa invisibilidade histórica. A cinematografia de Dolly Pussi ainda é pouco pesquisada, assim como as intersecções de sua trajetória com a história do Nuevo Cine Latinoamericano. Este trabalho pretende aprofundar a trajetória filmográfica desta documentarista por meio da exposição de arquivos documentais e fotográficos encontrados em acervos brasileiros e argentinos, fotos de making off de Pescadores, trechos do roteiro El hambre oculta, além de entrevista realizada com a cineasta em 2014, com a intenção de trazer à tona as (in)visibilidades de seus documentários.

Bibliografia

    BERNARDET, Jean Claude. Cineastas e imagens do povo. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
    BESKOW, Cristina Alvares. O documentário no Nuevo Cine Latinoamericano: olhares e vozes de Geraldo Sarno (Brasil), Raymundo Gleyzer (Argentina) e Santiago Álvarez (Cuba). Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo, São Paulo, 2016.
    BIRRI, Fernando. La escuela documental de Santa Fe. Santa Fé: Editorial Documento del Instituto de Cinematografia de la Universidad Nacional del Litoral, 1964.
    FRANCIA, Aldo. Nuevo cine latinoamericano en Viña del Mar. Santiago: Artecien/Cesoc, 1990.
    PERROT, Michelle. Minha história das mulheres. São Paulo: Contexto, 2007.
    PUSSI, Dolly. Breve Historia del Documental en la Argentina. Cine Cubano, Havana, n.84/85, 1978.
    TEDESCO, Marina. Tedesco, M. C. Nuevo Cine Latinoamericano: uma análise do cânone a partir do gênero. Aletria: Revista De Estudos De Literatura, 2020.