Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Carolina Soares Pires (USP)

Minicurrículo

    Carolina Soares é pesquisadora e crítica de cinema. Realiza pesquisas em audiovisual, com foco na relação entre literatura e cinema/TV, adaptação e cinema brasileiro. É Doutora em Meios e processos audiovisuais pela ECA-USP. É também educadora e realizadora audiovisual.

Ficha do Trabalho

Título

    Analisando adaptações: transtextualidade como conceito-chave

Resumo

    Este trabalho tem o propósito de entender o processo metodológico de análise de adaptações de literatura, de outras artes e mídias, sob o enfoque teórico da intertextualidade e da “transtextualidade’ de Stam. Com essa base teórica, delineiam-se aspectos preponderantes da adaptação na prática da análise audiovisual, formulando questões relativas às implicações desses processos analítico-comparativos no campo dos Estudos cinematográficos.

Resumo expandido

    Como analisar adaptações de outras artes, particularmente da literatura, para o audiovisual?
    As mídias audiovisuais contêm elementos de diversas artes, tais como o teatro, a música, a dança, a pintura, a escultura e, com maior relevância para o atual estudo, a literatura. Desde os primórdios e ao longo do percurso evolutivo desses meios, há evidências de que a sua linguagem é, em certo sentido, subsidiária de outras artes, cujas influências manifestam-se nas diversas intersecções com o audiovisual . A diferença entre a literatura e os meios audiovisuais faz-se patente no problema da enunciação. Fundamental para a narrativa, a enunciação na obra audiovisual, diferentemente do que ocorre no texto literário, não é constituída apenas pela palavra. A natureza da narrativa audiovisual implica um processo enunciativo complexo, em que estão imbricados a mise-en-scène, os enquadramentos, ângulos de câmera, voz narradora, ponto de vista, trilha sonora, montagem, entre outros elementos. A própria narração audiovisual é um compósito, em que esses elementos estão todos entrelaçados. A combinação desses diversos dispositivos de comunicação é o que Seymour Chatman chama de “narrador cinematográfico”. Robert Stam constrói uma base teórico-metodológica para a análise de adaptações cinematográficas de textos literários. Para o autor, as adaptações são fruto de uma rede intertextual, mas, ainda assim, são um novo texto. Stam considera que seria produtivo, na análise de adaptações, propor questões acerca dos intertextos evocados pelo texto-fonte e pela adaptação e avalia que adaptações seriam mais bem entendidas por meio da hipertextualidade, proposta por Genette, já que filmes adaptados podem ser vistos como hipertextos derivados de hipotextos preexistentes, sendo estes transformados por meio de operações de seleção, amplificação, concretização e atualização. Diferentes versões de uma mesma obra – ou hipotexto – podem ser consideradas diferentes hipertextos, ou leituras. Assim, a crítica de adaptações abandonaria o discurso fundado em visões moralistas e hierárquicas e passaria a estudá-las de forma mais contextualizada com base em seu processo de criação, sendo este intertextual e dialógico. Mais recentemente, explora o conceito de adaptação em diferentes contextos artísticos e culturais, examinando as maneiras pelas quais obras literárias, filmes e outras mídias são adaptados e transformados além das fronteiras nacionais e culturais. Stam discorre sobre como o conceito de adaptação pode ser usado para sondar as maneiras pelas quais as obras culturais são transformadas, reinterpretadas e reimaginadas em diferentes contextos. Ao explorar as interseções entre literatura, cinema e mídia em um contexto global, Stam traz outra vez à tona o conceito de intertextualidade, como um dos axiomas que estudos audiovisuais e literários compartilham. Ele propõe uma abordagem/método transdisciplinar, transtextual, translinguística, transartística, transseccional, transmidiática e transregional: um exame abrangente das artes e mídias audiovisuais e digitais, transcendendo as fronteiras tradicionais e incorporando literatura, cinema e novas mídias, assim como várias disciplinas e categorias. O foco está em como as diferentes mídias interagem e influenciam umas às outras, reconhecendo o impacto dos contextos históricos, geográficos e culturais. Pensar o papel da adaptação na globalização cultural, especialmente no contexto da era digital, em que surgem fenômenos como o remix, mostra-se uma abordagem prolífica. As contribuições mais recentes de Stam ajudam a entender as implicações políticas e sociais da adaptação e como as adaptações moldam e são moldadas pelas tendências culturais locais e globais e podem apontar caminhos profícuos não só para a análise de adaptações, como também para a análise fílmica de forma mais abrangente, em um contexto cultural em que a intertextualidade se mostra cada vez mais presente.

Bibliografia

    AUMONT, Jacques. “Raison de la comparaison”. In: Comment pensent les films: Apologie du filmique. Milão: Ed. Mimesis, 2021, p.195-216.
    CHATMAN, Seymour. Story and discourse: narrative structure in fiction and film. Ithaca, NY: Cornell U.P., 1978.
    _____. Coming to Terms: The Rhetoric of Narrative in Fiction and Film. Ithaca, NY: Cornell U. P., 1990.
    ELSAESSER, Tomas; HAGENER, M. Film Theory: An introduction through the senses. New York: Routledge, 2010.
    JOHNSON, Randal. Literatura e cinema. Macunaíma: do modernismo na literatura ao cinema novo. São Paulo: T. A. Queiroz, 1982.
    STAM, Robert. A literatura através do cinema: realismo, magia e a arte da adaptação. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2008.
    ______. Teoria e prática da adaptação: da fidelidade à intertextualidade. Ilha do Desterro, Florianópolis, n. 51, p.19-53, jul/dez, 2006.
    ______. World Literature, Transnational Cinema and Global Media: Towards a Transartistic Commons. London; New York: Routledge, 2019.