Ficha do Proponente
Proponente
- Mariana Porto de Queiroz (UNIFOR)
Minicurrículo
- Realizadora audiovisual, doutora em Comunicação social (PPGCOM/ UFPE), mestre em Artes Cênicas (PPGAC/ UFBA) e Psicóloga (UFC). Atua com pesquisa e docência audiovisual, interessada principalmente no desenvolvimento de jogos audiovisuais colaborativos. Atualmente leciona no curso de Cinema e Audiovisual da Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Dirigiu quatro curtas-metragens autorais Trabalhou como Game Designer e roteirista de 24 Jogos digitais para o ensino médio (Projeto MEC/ CIN-UFPE).
Ficha do Trabalho
Título
- Espírito, sinestesia, mutação: por um novo instrumentário para pensar o cinema e a formação
Mesa
- Territórios sensíveis: cosmologias, corpos e encruzilhadas audiovisuais
Resumo
- O presente trabalho busca fundamentos teóricos para pensar a avaliação de processos formativos audiovisuais com pessoas neuro-divergentes, considerando as possibilidades de o cinema ser agente ativo na incorporação de sensibilidades diversas nos espaços de ensino e aprendizagem.
Resumo expandido
- Este trabalho propõe uma reflexão acerca dos fundamentos de uma prática pedagógica com pessoas neuro-divergentes, considerando as possibilidades de o cinema ser agente ativo na incorporação de sensibilidades diversas nos espaços de ensino e aprendizagem. Experiencias com sujeitos que se encontram, de certo modo, em tensionamento com a linguagem, nos levam a pensar sobre os indicadores considerados para medir o aprendizado, reflexos dos alicerces de nossas práticas. Analiso alguns jogos realizados no projeto de extensão Ganhando asas, na UNICAP, destacando os aspectos que motivaram a associação com domínios pouco utilizados no âmbito acadêmico.
Miguel (2018, p.5) destaca que ao encarar o autismo não como uma doença a ser tratada e curada, mas como um ponto de vista sobre a vida e a linguagem, Deligny dá um passo para fora e além das linhas de segmentaridade dura do falo-logo-etnocentrismo: “A inadaptação diz assim respeito a “imagens icônicas” que o corpo singular deve mais ou menos incorporar, às quais deve “tender virtualmente” para que ele seja considerado “adaptado”. A linguagem cristaliza uma forma única, unifiante e esvaziada, universalista, totalizante e totalitária.” Penso que parte das dificuldades vividas nos espaços de formação para incorporar sujeitos cujas experiências se alicerçam em diferentes modos de trocar com o mundo diz respeito à dificuldade de incorporar outros modos de produzir sentidos. Não se trata de desistir da linguagem, mas de habitar seus domínios de uma outra forma, errática, auto-poética, autônoma O papel dos/das professores/as na mise-en-scéne escolar seria, no modo mágico, relacional, portanto semelhante, em alguns sentidos, com o trabalho dos xamãs, “dedicados a comunicar e administrar as perspectivas cruzadas, estão sempre aí para tornar sensíveis os conceitos ou inteligíveis as intuições.” (VIVEIROS DE CASTRO, 2013, p. 351).
Ao adotar parâmetros de avaliação focados na reprodução de um modo de fazer e pensar já estabelecidos, deixamos de contemplar processos que singularizam e caracterizam a produção de conhecimento como um processo autônomo, como apontam Mizoguchi e Passos (MIZOGUCHI; PASSOS, 2021, p. 24): “A dimensão micro diz respeito aos processos de mutação subjetiva, de autopoiesis. Todo sistema autopoiético é autônomo, já haviam designado Maturana e Varella (1995; 1997)”.
Se consideramos a educação instrumento para incorporação efetiva de grupos sociais emergentes, não integrados à ordem discursiva dominante, ressaltamos o papel crucial que o cinema pode desempenhar. Como destaca Khel (2015, p 29): “Os verdadeiros avanços civilizatórios, quando ocorrem, não são necessariamente avanços da técnica, mas sim avanços nas possibilidades de simbolização do Real.”
Encontro forte ressonância entre estas relações nas culturas amazônicas e a referência a um tipo de inteligência teorizada por Bergson e aqui descrita por Lapoujade: “Existem dois lados da experiência em Bergson: o lado da Inteligência, vasto plano em que tudo se dobra segundo a lógica da representação, e o lado da intuição ou da emoção profunda, operando segundo um tempo e uma lógica de outra natureza. (LAPOUJADE, 2017, p. 12).
O cerne das questões colocadas aqui é um convite a habitar intencionalmente um lugar de vulnerabilidade e contaminação pelo outro, tomando esta capacidade empática como uma tecnologia humana e como principio de uma pedagogia mágica. Desejo neste trabalho mapear alguns dos rastros deixados por alguns estudantes ao conhecer e desenhar os contornos de seu modo de existir e usar o cinema como suporte atualizador de seus devires mitologizantes. Em uma época em que a compartimentação do conhecimento é a base para o trabalho contemporâneo, gostaria de identificar um instrumentário alinhado a uma formação humanista e perpassada fortemente pela singularização do uso da linguagem, propondo um uso das imagens e sons como suportes para uma mutação subjetiva.
Bibliografia
- CARVALHO, José Jorge. Mutus liber – O livro mudo da alquimia. Ensaio preliminar, notas e comentários. São Paulo: Attar editorial, 1995.
KHEL, Maria Rita. O tempo e o cão – a atualidade das depressões. São Paulo: Boitempo, 2015.
LAPOUJADE, David. Potências do tempo. 2. ed. São Paulo: N-1 edições, 2017.
LARROSA, Jorge. Tremores – escritos sobre experiência. Tradução: Cristina Antunes e João Wanderley Geraldi. Belo horizonte: Autêntica, 2015.
MIZOGUCHI, Hausen Danichi; PASSOS, Eduardo. Transversais da subjetividade – arte, clínica e política. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 2021.
VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. A inconstância da alma selvagem. São Paulo: Cosac Naify, 2013.
VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. Metafísicas canibais. Elementos para uma antropologia pós-estrutural. São Paulo: Cosac Naify, 2015.
MIGUEL, Marlon; ROCHA, Maurício. Cadernos Deligny, v. 1, n. 1. Rio de Janeiro: PUC Rio, 2018.