Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Hannah Serrat de Souza Santos (IFNMG)

Minicurrículo

    Pesquisadora de cinema, doutora em Comunicação Social pela UFMG, onde também concluiu o mestrado e a graduação, como membro do grupo de pesquisa Poéticas da Experiência. Desde 2020, atua no IFNMG Campus Diamantina, onde é responsável pelo Núcleo de Produção em Artes Cênicas e é coordenadora do Projeto de Extensão “Cinema, Política e Educação: Cineclube Cine Pedrada”, voltado para juventudes periféricas em Diamantina/MG.

Ficha do Trabalho

Título

    Compor arranjos de imagens, enredar a escrita: notas sobre uma proposição metodológica

Seminário

    Cinemas, Comunidades, Territórios: interpelações aos gestos analíticos

Resumo

    Neste trabalho, buscamos apresentar uma proposta analítica desenvolvida durante pesquisa de doutorado dedicada ao cinema de Abderrahmane Sissako, no que concerne a investigação das relações entre as imagens e o olhar, bem como as formas de aparição dos sujeitos no cinema. Buscamos apresentar alguns “arranjos de imagens” produzidos a partir da aproximação entre diferentes filmes, enquanto uma proposta metodológica que se torna produtiva à medida em que se desenvolve junto ao trabalho da escrita.

Resumo expandido

    Atento à constituição de uma “circulação de mundos” (Mbembe, 2015, p. 69) no oeste africano, a partir de movimentos migratórios, das diásporas e da própria colonização, observamos que o cinema de Abderrahmane Sissako apresenta-se como objeto privilegiado para investigação sobre o olhar e os modos de aparição dos povos, em suas relações com o território. Observamos, em seus filmes, a constituição de uma topologia específica da imagem que se recusa a produzir, em cena, a adesão a uma única perspectiva de modo que, ao invés de nos perguntarmos pelas posições variadas (sociais, corporais e/ou territoriais) dos espectadores e espectadoras diante de uma representação oferecida (hooks, 2019), passamos a entender como os próprios filmes dispõem em cena perspectivas múltiplas, complexificando o lugar ocupado pelo próprio espectador que precisa mirar aqueles e aquelas que estão em cena, mas que também se constituem enquanto sujeitos de um olhar.

    A partir das análises dos filmes, buscando neles os insumos e instrumentos de nosso trabalho, aprendemos, com eles, algo sobre seus procedimentos, bem como sobre os modos de ver e de ouvir que eles convocam. Observamos, a partir disso, a necessidade de privilegiarmos, metodologicamente, o que inscreve marginalmente em suas diegeses e passamos a identificar o que, a princípio, poderia passar despercebido se optássemos de antemão por privilegiar uma narrativa aparentemente central ou um enredo específico. Procuramos então olhar para as imagens com desconfiança, atentos a aparentes insignificâncias e banalidades, evitando a produção de relações de causalidades diretas e buscando oferecer sentidos mais abertos ao trabalho analítico.

    A partir dessa premissa inicial, buscamos apresentar neste trabalho uma proposta metodológica que se desenvolveu em contato próximo entre as imagens, que analisamos, e as palavras, mobilizadas por elas. Se compreendemos que, muitas vezes, os filmes são capazes de oferecer uma nova aparência ao que antes aparecia sob certo regime de visibilidade, consideramos igualmente a necessidade de conferir ao próprio gesto analítico a capacidade de fazer aparecer algo que antes poderia parecer invisibilizado. Acreditamos portanto que o gesto produtivo de criar uma cena dissensual, no qual muitas vezes o cinema se engaja, continua no trabalho da escrita. Sendo assim, a partir da análise dos filmes, propomos desenvolver um gesto duplo ligado à composição de um agrupamentos de imagens (provenientes de seus enquadramentos) e ao enredamento da escrita, de forma que um venha incidir sobre o outro.

    A variedade combinatória e provisória desse conjunto de imagens que, para fins heurísticos, chamamos de “arranjos de imagens” permite comportar um grau de abertura ou de indeterminação, cara à proposta analítica que buscamos apresentar. Tendo em vista os filmes de Sissako, desenvolvemos análises que se enredam a partir de relações parciais e móveis, desenhadas e redesenhadas durante o processo, que não se interessa propriamente pela imagem do conjunto como um todo, mas pela necessidade de preservar a singularidade dos elementos postos em relação. O método propicia, nesse sentido, uma invenção à medida que ele é indutor de um processo investigativo e criativo que se faz através do manejo das imagens e dos textos, bem como do referencial teórico que nos ampara.

    Interessados pelo modo com que o cinema de Sissako dedica-se a reorientações do olhar e das formas de aparição dos sujeitos, propomos apresentar a análise de um arranjo de imagens, composto a partir de dois filmes de Sissako, Bamako (2006) e Heremakono (2002).

Bibliografia

    ARENDT, Hannah. A vida do espírito. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1995.
    hooks, bell. Olhares negros: Raça e Representação. São Paulo: Elefante, 2019.
    GLISSANT, Édouard. Poética da relação. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2021.
    MBEMBE, Achille. Políticas da inimizade. Lisboa: Antígona Editores Refractários, 2017.
    MBEMBE, Achille. Sair da grande noite. Ensaio sobre a África descolonizada. Luanda: Edições Mulemba, 2014.
    NANCY, Jean-Luc. A comunidade inoperada. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2016.
    OGUIBE, Olu. Photography and the Substance of the Image. In: BELL, Clare; ENZEWOR, Okwui; TILKIN, Danielle; ZAYA, Octavio (Orgs.). In/sight: African Photographers, 1940 to the Present. Nova Iorque: Guggenheim Museum, 2016. p. 231-252.
    RANCIÈRE, Jacques. Políticas da escrita. Trad. Raquel Ramalhete, Laís Eleonora Vilanova, Lígia Vassalo e Eloísa Araújo Ribeiro. São Paulo: Editora 34, 2017.
    RANCIÈRE, Jacques. O Método da Cena. Belo Horizonte:Quixote Do, 2021.