Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    BRUNA MARTINS NOBREGA ARAUJO DIAS (UFPB)

Minicurrículo

    Bruna Dias nasceu em Pombal (1989), sertão da Paraíba. Faz mestrado em Letras pela UFPB, especialização em Escrita Criativa pela UNIESP. É arte educadora, artista visual, roteirista, fotógrafa, escritora e artesã. Pesquisa sobre relações étnico raciais e de gênero nas artes e na sociedade brasileira.
    Atua/estuda/aprende/transforma nas artes desde 2017.
    Lançou seu primeiro curta, ‘Sobre voos renascidos’, em 2024, e irá lançar esse ano, junto com a realizadora Carine Fiuza, ‘Um oceano inteiro’.

Ficha do Trabalho

Título

    Poesia e subjetividade negras no filme ‘O dia que te conheci’, de André Novais

Eixo Temático

    ET 1 – CINEMA, CORPO E SEUS ATRAVESSAMENTOS ESTÉTICOS E POLÍTICOS

Resumo

    Este artigo se propõe a fazer uma análise do filme “O dia que te conheci”, do cineasta Andre Novais, refletindo sobre a importância de produções onde pessoas negras são realizadoras e protagonistas de suas próprias histórias. Discorreremos sobre como a representatividade de narrativas negras no cinema ganha outros contornos na medida em que estes personagens passam a se libertar de antigas amarras que aprisionavam sua existência, através da enunciação, da resistência e do empoderamento.

Resumo expandido

    É sabido que a cultura e a arte detém grande influência para a construção do imaginário social, bem como no reforço das relações de poder. Nisso, compreendemos que a literatura, o cinema, a fotografia, dentre outras expressões artísticas, funcionam como um mediadores culturais, visto que revelam e influenciam nos comportamentos, além de também reforçar os sensos de pertencimento, identidade, reconhecimento, bem como, os preconceitos, estereótipos e exclusões.
    Pensando nisso, lembro que, como criança nos anos 90, o que eu assistia na televisão era uma experiencia onde eu não via corpos, narrativas ou a beleza negra sendo exaltadas ou apresentadas como algo positivo. Longe disso, quando muito apareciam, era de maneira subalternizada ou estereotipada, o que reforçava em mim a ideia de que o lugar da feitura ou usufruto da arte não era para pessoas como eu, visto que nossa imagem e subjetividade era sempre representadas como algo negativo. A respeito disso, embora que com enfoque na experiência e representação do negro na mídia televisiva, Nascimento (2022, p. 43), diz que:
    “O “preto” veiculado pela TV não é uma realidade histórica, social e individual que corresponde à vivência de todos os componentes do grupo étnico […]. São conceitos, ou melhor, pré-conceitos: tolo, dócil, servil, ignorante, medroso, fala errado.”
    Hoje percebo a importância das produções artísticas e culturais que apresentam narrativas diferentes das tradicionais, abrindo espaço para construções antirracistas, pós-coloniais e decoloniais. A importância das narrativas elaboradas e enunciadas pela população negra se torna ainda mais evidente. Essa construção permite a nós, pessoas negras, que retomemos nossas histórias, valores e expressões culturais, dando visibilidade às nossas experiências, conquistas e lutas, que muitas vezes foram silenciadas ao longo da história.
    Refletir sobre a presença negra no cinema brasileiro é compreender que, por meio da construção de imagens e narrativas contra-hegemônicas sobre as populações negras do país, surge a possibilidade de romper com os estereótipos que historicamente foram impostos pela indústria cinematográfica tradicional. Dessa forma, ele se torna um instrumento poderoso para a construção de novas possibilidades de vida, resgatando a complexidade e a riqueza das vivências negras e promovendo um movimento de transformação nas percepções sociais e culturais.
    A ficção como instrumento para a reinvenção de realidades negras é claramente representada no trabalho do cineasta André Novais, que nasceu na periferia de Contagem (MG), e é diretor, produtor e roteirista. Dentre os filmes que dirigiu, podemos citar Uma Homenagem a Aluízio Netto (2004), Fantasmas (2010), Pouco Mais de um Mês (2013), Ela Volta na Quinta (2014), Quintal (2015), Temporada (2018), e O Dia Que Te Conheci (2024), sendo este último o que discutiremos a seguir.
    Na trama, que é uma comédia romântica, o protagonista Zeca (Renato Novaes) é bibliotecário de uma escola na Região Metropolitana de Belo Horizonte, e sofre diariamente para acordar cedo e cumprir o trajeto de 1h30 para chegar ao trabalho com seu horário de trabalho. Sua rotina muda quando ele descobre, através de Luísa (Grace Passô), que será demitido, e apesar de trabalharem na mesma escola, somente ali eles dois se conhecem. Apesar do motivo delicado deste primeiro contato, Luísa oferece carona a Zeca, e a partir daí eles podem conversar, dividir experiências de vida, afetos, e interesse mútuo um pelo outro.
    Através de uma construção de narrativa que se desenrola e considera os imprevistos de uma vida real, poder ver um filme protagonizado por duas pessoas negras, com seus atravessamentos e delicadezas, nos faz pensar no quão pode ser transformador e revolucionário acessar histórias onde a população negra não esteja sendo estereotipada, ridicularizada ou exposta a todo tipo de violências e empobrecimento de possibilidades de vida.

Bibliografia

    FANON, Frantz. Pele Negra Máscaras Brancas. Tradução de Renato da Silveira. – Salvador: EDUFBA, 2008.
    FREITAS, K., & MESSIAS, J. O futuro será negro ou não será: Afrofuturismo versus Afropessimismo – as distopias do presente. Imagofagia, (17), 402–424, 2021.
    GONZALEZ, Lélia. Por um feminismo afrolatinoamericano. São Paulo: UFMG, 2020.
    HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 11 ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2006.
    KILOMBA, Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. Editora Cobogó, 2020.
    LIMA, Diane. “Negros na piscina: arte contemporânea, curadoria e educação”. São Paulo: Fósforo, 2023
    NASCIMENTO, Beatriz. O NEGRO VISTO POR ELE MESMO, ENSAIOS, ENTREVISTAS E PROSA. Editora UBU, 2022.
    RODRIGUES, José Carlos . O negro brasileiro e o cinema. Rio de Janeiro: Pallas,2001
    ZENUN, Maíra. Cinema Negro: sobre uma categoria de análise para a sociologia das relações
    raciais.