Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Mariana de Lima Siqueira (UFF)

Minicurrículo

    Mestranda pelo PPGCine(UFF), onde mantém vínculo com o laboratório Kumã. Tem interesse nas relações entre a criação de imagem e as políticas comunitárias. Atua como oficineira nos projetos Cine Quilombola e Cinema de Griô do Instituto Marlin Azul (Vitória- ES). Participou da coletânea “Cinemas da terra”, com organização de André Brasil e Cláudia Mesquita pela Fafich/PPGCOM UFMG, em 2024. É integrante da Associação Mulheres Coralinas. Edita, escreve e faz cartazes.

Ficha do Trabalho

Título

    CINEMA, QUILOMBOS E PRODUÇÃO DE SUBJETIVIDADES

Eixo Temático

    ET 5 – ETAPAS DE CRIAÇÃO E PROCESSOS FORMATIVOS EM CINEMA E AUDIOVISUAL

Resumo

    A partir da experiência de uma oficina de cinema em um quilombo no Espírito Santo e a realização de um filme a partir desse encontro, a apresentação pretende analisar como o território e as corporeidades em uma comunidade quilombola se envolvem em certos processos de criação. Tomando o cinema como elemento que pode ativar processos de produção de subjetividade, desejamos pensar em como o território, a amizade, a memória e a força de invenção de um quilombo incidem nas imagens.

Resumo expandido

    Em junho de 2022 estivemos em Monte Alegre, quilombo localizado ao sul do Espírito Santo, pela primeira vez. Na ocasião, ministramos uma oficina de cinema realizada pelo Instituto Marlin Azul com um grupo de mais ou menos 15 moradores da comunidade, entre crianças e adultos. No primeiro dia da oficina, propusemos que cada pessoa escrevesse uma carta contando um pouco da vida que levava. A partir dessas cartas construímos coletivamente um roteiro de imagens e sons a serem captados junto aos participantes da oficina e depois montamos um curta com o material produzido. Retornamos ao quilombo no final daquele mesmo ano para exibir o filme finalizado. Na manhã seguinte à sessão de exibição, nos reunimos para conversar com as pessoas que moravam ali, as que participaram da oficina e outras interessadas que compareceram à roda. Já no fim da conversa, pergunto a um dos homens que tinha participado da oficina “O que você sentiu quando escutou sua voz naquela cena final?”, ele responde, “Doeu um cadinho, eu nunca tinha escutado a minha voz ainda não”. O que nos faz perguntar: o que é essa máquina que nos leva a escutar nossa própria voz, como se fosse pela primeira vez, justo porque foi projetada do lado de fora de nós? Lá, onde já não era bem “eu” quem falava.
    A cena que disparou nossa conversa consiste em dois meninos bem pequenos sentados numa cama, brincando com uma garrafa de plástico cheia de bolinhas de gude, sobre essa imagem escutamos a voz desse homem que endereça uma carta a seu irmão, que mora longe daquela comunidade. Mais tarde, numa exibição do filme na 27a Mostra de Cinema de Tiradentes, descobrimos em conversa com outros moradores de Monte Alegre, que talvez esse irmão para quem a carta foi endereçada não existe. Penso que esse homem, que talvez tenha inventado um irmão para dedicar uma carta e que sentiu seu coração doer ao escutar a própria voz sobreposta ao rosto de dois meninos brincando, nos devolve uma fina questão: a produção de subjetividade implicada nesses processos. Subjetividade que não tem a ver com interioridade, mas com a exterioridade, com processos de criação coletivos, com os efeitos do encontro de um corpo com outros (GUATTARI e ROLNIK, 1986).
    Dispondo da imagem como elemento disparador das relações, essa apresentação pretende expor a proposta metodológica adotada nas oficinas e analisar as imagens que nasceram dessa prática para pensar em: 1. Como o território e as corporeidades de um quilombo recebem e devolvem processos de criação; 2. Como um filme realizado em contexto comunitário perturba as centralidades preexistentes e desencadeia outras formas possíveis para as imagens e sons se criarem; 3. Como o cinema pode disparar a produção de subjetividades.

Bibliografia

    BRITO, Alessandra Pereira. A rememoração nas imagens dos quilombos. Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas. Orientador: César Geraldo Guimarães, 2021.

    Fórum Nicarágua. A pedagogia do dispositivo. Revista Devires – UFMG v.15, n.1. Belo Horizonte, jan.jun 2018.

    GUATTARI, Félix; ROLNIK, Suely. Micropolítica: cartografias do desejo. Petrópolis: Vozes, 1986.

    MARTINS, Leda Maria. Performances do tempo espiralar, poéticas do corpo-tela/ Leda Maria Martins. – 1. Ed. – Rio de Janeiro: Cobogó, 2021.