Ficha do Proponente
Proponente
- João Paulo Lopes de Meira Hergesel (PUC-Campinas)
Minicurrículo
- Professor da Escola de Linguagem e Comunicação e pesquisador do Programa de Desenvolvimento Humano e Integral da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas). Doutor em Comunicação (UAM), com pós-doutorado em Comunicação e Cultura (Uniso). Membro do grupo de pesquisa SOLARIS – Solidariedade, Ações Responsáveis e Inovação Social (CNPq/PUC-Campinas).
Ficha do Trabalho
Título
- A telenovela “Travessia” e a representação da adolescência cuir
Resumo
- O presente trabalho tem por objetivo discutir a representação do menino adolescente assexual na telenovela brasileira, com enfoque no personagem Rudá, de “Travessia”, obra com autoria de Gloria Perez (TV Globo, 2022-2023). Com apoio da FAPESP (2023/05698-8) e ancorado nos estudos cuir e no método de análise de personagens, a pesquisa discorre sobre a reconfiguração da masculinidade e a presença de adolescências não heterossexuais no audiovisual.
Resumo expandido
- A telenovela é um exemplo emblemático de produção televisiva com amplo alcance e forte aceitação na cultura audiovisual brasileira. Ela não apenas reflete a sociedade, mas também atua como um meio de discussão histórica e política, facilitando o acesso a questões sociais e promovendo inclusão e cidadania (Motter, 2023). Com uma estrutura narrativa enraizada no melodrama, a telenovela desempenha uma função educativa, apresentando conceitos de forma acessível e estimulando o diálogo (Lopes, 2021). Nesse contexto, temáticas cuir são cada vez mais exploradas, desafiando conceitos tradicionais e promovendo a diversidade, como exemplificado por “Travessia”.
Escrita por Glória Perez e exibida em horário nobre pela TV Globo entre outubro de 2022 e maio de 2023, “Travessia” abordou temas que fomentaram diálogos sobre as relações humanas contemporâneas, entre eles, a assexualidade. Muitas vezes negligenciada pela sociedade e pela grande mídia, a assexualidade é uma expressão legítima da diversidade humana e é reconhecida como uma categoria de identidade (Oliveira, 2015). Membros da comunidade LGBTQIAPN+, sujeitos assexuais têm atração sexual nula ou mínima por outras pessoas, e essa condição não está associada a problemas hormonais ou traumas (Bogaert, 2012). Um dos personagens que se identifica nesse espectro é Rudá, um adolescente em processo de autodescoberta e autoaceitação.
O adolescente pode ser visto como alguém em preparação para enfrentar a vida adulta, lidando com desafios sociais, morais e emocionais, e desenvolvendo maturidade e pensamento crítico; ele é um agente ativo na construção de sua identidade e na exploração do mundo ao seu redor (Calligaris, 2014). Por muito tempo, a representação midiática da adolescência se baseou em estereótipos simplificados; no entanto, as narrativas contemporâneas têm adotado uma abordagem mais complexa, explorando temáticas cidadãs por meio de personagens multifacetados (Coutinho, 2009).
No caso de Rudá, ao longo da telenovela, o jovem enfrenta violência verbal e psicológica, principalmente devido à perspectiva sexista de seu padrasto, que insiste em encontrar uma namorada para ele, e à reação preconceituosa de sua mãe, que vê a assexualidade como um sintoma psicológico. Diante desse contexto, surge a pergunta: como o adolescente assexual está sendo retratado na ficção televisiva, especialmente no processo de autodescoberta e autoaceitação? Este estudo visa analisar as inovações e rupturas, estereótipos e clichês na representação da assexualidade na telenovela brasileira, com foco específico na adolescência, utilizando como base o personagem Rudá, interpretado pelo ator Guilherme Cabral.
Ao realizar uma análise de personagens, fundamentada em estudos narratológicos e estilísticos, devidamente contextualizados socioculturalmente (Cassano Iturri, 2019; Jakubaszko, 2010), é evidente a relevância de trazer a discussão sobre a assexualidade ao público, destacando como isso pode ampliar as perspectivas sobre identidade e desconstruir normas sociais. A análise confronta as interpretações obtidas, articulando a construção teórica e empírica do objeto de estudo, a fim de compreender como a telenovela contribui para a formação da cuiridade juvenil masculina e os significados sociais que a ela estão associados.
Consideramos que Rudá responde aos desafios das masculinidades contemporâneas, as quais, conforme apontado por Muszkat (2018), destacam como as expectativas tradicionais de poder e controle estão sendo reavaliadas frente às novas demandas por igualdade e diversidade, sugerindo a necessidade de repensar as construções de gênero para promover relações mais equitativas. No personagem, também se evidencia uma visão masculina mais sensível e capaz de verbalizar seus sentimentos, algo que Ortega (2018) já havia destacado em galãs contemporâneos.
Destaca-se que o presente trabalho foi realizado com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) – Processo: 2023/05698-8.
Bibliografia
- BOGAERT, A. F. Understanding Asexuality. Lanham: Rowman & Littlefield, 2012.
CALLIGARIS, C. A adolescência. São Paulo: Publifolha, 2014.
CASSANO ITURRI, G. Representaciones de género y melodrama televisivo en el Perú. Tese – PUC-Perú, Lima, 2019.
COUTINHO, L. M. Uma representação midiática de jovem e de escola. Dissertação – UESC, Florianópolis, 2009.
JAKUBASZKO, D. A construção dos sentidos da masculinidade na telenovela “A Favorita”. Tese – USP, São Paulo, 2010.
LOPES, M. I. V. Telenovela e direitos humanos. In: LEMOS, L. P.; ROCHA, L. L. F. (org.). Ficção seriada (v. 3). São Luís: UFMA, 2021. p. 11-33.
MOTTER, M. L. Ficção e realidade – telenovela. In: LEMOS, L. P.; ROCHA, L. L. F. (org.). Ficção seriada (v. 6). São Luís: UFMA, 2023. p. 13-24.
MUSZKAT, M. O homem subjugado. São Paulo: Summus Editorial, 2018.
OLIVEIRA, E. R. B. “Minha vida de ameba”. Tese – USP, São Paulo, 2015.
ORTEGA, D. A. De Tarcísio a Cauã. Dissertação – USP, São Paulo, 2019.