Ficha do Proponente
Proponente
- Fabio Rodrigues da Silva Filho (UFMG)
Minicurrículo
- Atua em curadorias, montagem e crítica de cinema. Doutorando em Comunicação na Universidade Federal de Minas Gerais, é mestre também pela UFMG. Baiano, graduou-se na UFRB. Atualmente, está na coordenação do Cinema do Dragão. Compôs a comissão de seleção de festivais como CachoeiraDoc, FestCurtasBH, Goiânia Mostra Curtas, FIANB, entre outros. Realizou os filmes “Tudo que é apertado rasga” e “Não vim no mundo pra ser pedra”. Membro do grupo Poéticas da Experiência. É cineclubista e cartazista.
Ficha do Trabalho
Título
- Em torno de uma curadoria territorializada
Seminário
- Políticas, economias e culturas do cinema e do audiovisual no Brasil
Resumo
- A partir do conceito de gestão territorializada, discutimos aqui a proposta de uma curadoria territorializada. Tal práxis será defendida não como método de programação, mas uma elaboração em curso, a partir do campo da exibição no Brasil, especialmente nas salas públicas, ancorando-nos em um caso situado: o Cinema do Dragão. Pensando os cinemas como política pública continuada, ressaltamos a necessidade das salas de cinema para um comum que não silencie as diferenças e que desenvolva contextos.
Resumo expandido
- Sabemos que a experiência de ver filmes em uma sala de cinema se baseia, antes, em uma radical desterritorialização. Ao estender sobre nós sua espessa noite experimental, em companhia de desconhecidos ou do vazio, a sala escura suspende, por um tempo, a gravidade da realidade. Ora nos levando ao mundo próprio do filme, ora nos devolvendo ao mundo em que vivemos, numa intensa fricção, o cinema se vale do território-algum, mesmo quando se trata de filmes fortemente ancorados em um dado contexto, para tornar crível o algum-território proposto em sua escritura. No entanto, esta experiência estética demanda espaço propício onde tal viagem possa acontecer. Mais que isso, não prescinde do ancoramento. Território e seu oposto não se antagonizam, mas potencializam a experiência cinematográfica. Ao falar de territorialização aqui, estamos lançando um olhar sobre a engenharia que torna possível a política do cinema acontecer, as imagens fazerem seu trabalho, o comum gerar comunidade.
Um rápido balanço de 2024 aponta para um horizonte animador para o parque exibidor: aumento expressivo do número de espectadores, em comparação com os últimos quatro anos, 313 obras nacionais lançadas, 3.515 salas em funcionamento (o maior número em pelo menos dez anos)… No entanto, a realidade da exibição/difusão passa por consideráveis mudanças e desafios. A interrogação sobre a importância das salas de exibição, especialmente aquelas de rua, é uma questão recorrente para qualquer profissional da exibição.
Esta comunicação tenta tirar consequências da ideia de curadoria territorializada, inspirando-se, assim, no conceito de gestão territorializada (SANTOS, DAVEL, 2019; BARBOSA, 2024). Esta prática curatorial, por assim dizer, estudada aqui a partir de um exemplo situado, não será defendida como um método de programação em cinema, mas como uma elaboração a partir do campo da exibição no Brasil, notadamente a partir das salas públicas e sua tarefa enquanto política pública continuada de democratização do acesso e criação de repertório crítico junto às imagens. No intuito de “reimaginar o cinema como espaço social”, tal como propõe a chamada deste seminário, lançaremos um olhar sobre o campo da exibição, ressaltando aquilo que mais forte se apresenta: a necessidade das salas de cinema para um comum que não silencie as diferenças.
A partir da experiência do Cinema do Dragão, em Fortaleza (Ceará), num recorte de dois anos, pretende-se pensar esta dimensão aqui chamada de curadoria territorializada. De maneira geral, o termo refere-se à concepção que guia a práxis curatorial a partir de uma vinculação ao território onde o cinema está inserido (sua dimensão histórica, as comunidades nas quais o equipamento é vizinho, a dimensão econômica que instaura/interage), mas também ao próprio território que o cinema é. Lançaremos um olhar sobre a programação enquanto “historicidade viva” (ALVES, 2010), a política de vizinhança com os agentes que fazem o cinema e, sobretudo, ao esforço de situar o filme no curso de uma programação, seja para produzir diálogo e cotejos, ou, mais diretamente, encontro com as obras, permitindo assim que os filmes façam morada, ocupando as telas e produzindo permanentes e insuspeitos diálogos entre a produção dita regional e aquelas de outros lugares.
O cinema enquanto território será explorado a partir das proposições formativas, do trabalho de comunicação atrelado a um trabalho de mobilização de públicos potencialmente interessados em determinados filmes, permitindo também canais diretos para que os públicos apresentem seus interesses. A dimensão econômica, que envolve remunerações e o uso estratégico do capital simbólico do cinema, também será explorada nesta hipótese provocada. Imaginamos que tal proposta pode ter força de exemplo, e não de modelo, para pensarmos a dimensão de uma curadoria (e também de um cinema) que desenvolve contextos (CESAR, 2020), mas também para repensar formas de reaproximação do público às salas de cinema.
Bibliografia
- BARBOSA, Helena. Gestão territorializada e a política da encruzilhada: é esse ritual que impede o céu de cair. In: COLETTA, Marcos (Org.). Revista Subtexto – Revista de Teatro do Galpão Cine Horto, n. 18, 2024. p. 57-69.
SANTOS, Fabiana Pimentel. DAVEL, Eduardo Paes. Equipamentos culturais, identidade e território: elementos para uma gestão territorializada. In: LEAL, Nathali; KAUARK, Giuliana; RATTES, Plínio (Orgs). Um lugar para os espaços culturais: gestão, territórios, públicos e programação. Salvador/BA: EDUFBA, 2019.
GUIMARÃES, César. O que é uma comunidade de cinema?. Revista Eco-Pós, v. 18, n. 1, p. 45–56, 2015.
CESAR, Amaranta. Conviver com o cinema: curadoria e programação como intervenção na história. CESAR, A. [et. al.] (Orgs.). In: Desaguar em cinema: documentário, memória e a..o com o CachoeiraDoc. Salvador/BA: EDUFBA, 2020. p. 137-156.
ALVES, Cauê. A curadoria como historicidade viva. In: RAMOS, A. Dias (Org.). Sobre o ofício do curador. Porto Alegre/RS: Zouk, 2010.