Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    João Victor de Sousa Cavalcante (UFC)

Minicurrículo

    Cientista social e jornalista. Doutor em Comunicação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e mestre em Comunicação pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Atualmente, é professor do curso de Comunicação Social – Publicidade e Propaganda da UFC. E-mail: joaosc88@gmail.com.

Ficha do Trabalho

Título

    Lobos, cães e fantasmas: anotações sobre a relação humano/animal no cinema queer

Resumo

    O trabalho propõe uma leitura comparada dos filmes O Fantasma (João Pedro Rodrigues, 2000) e Wolf (Nathalie Biancheri, 2021), a partir da relação entre corpo, desejo e animalidade. O objetivo é pensar as dinâmicas entre o humano e o animal como a proposição de modos outros de existir e de habitar o mundo. Interessa, sobretudo, perceber as tensões e as dissidências provocadas pelos distintos modos de filiação com a animalidade que os dois filmes operam.

Resumo expandido

    O trabalho propõe uma leitura comparada dos filmes O Fantasma (João Pedro Rodrigues, 2000) e Wolf (Nathalie Biancheri, 2021), a partir da relação entre corpo, desejo e animalidade. O objetivo é pensar as dinâmicas entre o humano e o animal como a proposição de modos outros de existir e de habitar o mundo. Interessa, sobretudo, perceber as tensões e as dissidências provocadas pelos distintos modos de filiação com a animalidade que os dois filmes operam.

    Nas duas obras, a alteridade aciona modos outros de pensar o corpo e o desejo que não os engendrados por uma gramática heteronormativa, que elabora o reconhecimento do humano como espécie a partir de códigos ligados a sexualidade e gênero. Essa gramática, a saber, parte de uma cisão histórica entre natureza e cultura, e de pares correlatos, como sexo e gênero, selvagem e doméstico, animal e pessoa.

    O Fantasma, importante obra do cinema queer dos anos 2000, e Wolf apresentam personagens que, a partir de filiações e devires com a animalidade, denotam uma recusa a formas disciplinares de identidade e de usos do corpo. Nesse sentido, o trabalho busca pensar as duas obras a partir de uma leitura queer, em que a dissidência e as formas de vidas precárias (Butler, 2019) aproximam-se de uma monstruosidade, ou seja, de possibilidades de vida que recusam a normatividade antropocêntrica (Cavalcante, 2022). Como pensar, então, o político e o queer a partir de uma recusa à identificação com o humano disciplinar?

    A investigação propõe a hipótese de que as relações entre humanidade e animalidade, ao engajar criativamente pontos de vista não antropocêntricos, produzem modos outros de existir e experienciar o mundo. Nos dois filmes, a relação com o animal não é estabelecida a partir de posicionamentos fixos da alteridade e do reconhecimento da diferença, mas sim como fronteiras móveis e heterogêneas.

    Em O Fantasma e em Wolf, o animal surge como uma possibilidade de variação ontológica dos sujeitos. A animalidade intersecta o desejo, o uso dos corpos, os modos de habitar a vida comum e as possiblidades de existir fora do domínio de uma inteligibilidade cultural normativa. Nesse sentido, ao comparar os dois filmes, interessa menos elencar as semelhanças observadas do que entender como as narrativas trazem o corpo e animalidade para o centro de uma disputa política, especialmente levando em conta o arco temporal que distancia as duas obras.

    A variação ontológica perpetrada pela filiação com o animal abre espaço para a discussão sobre qual vida política é possível para os corpos que desviam das partições binárias que conceituam o sujeito humano.

    Nos filmes, a distinção tradicional entre natureza e cultura não pode ser acionada para explicar as variações intensivas do corpo e dos sujeitos no filme. A insurgência desses sujeitos implica em uma subversão do domínio interno da cultura e de suas modalidades de inclusão excludente que conceituam a natureza. Nessa episteme disciplinar, a animalidade e a natureza são relegadas ao domínio do outro: do selvagem, do incontrolável, do desviante, dos anormais.

    Nesse sentido, essa investigação busca explorar a subversão dessa dicotomia a partir dos modos de vida das pessoalidades dissidentes apresentadas pelos filmes. Em lugar de fronteiras rígidas e de um reconhecimento com base na exclusão do animal, os filmes abrem espaço para pensar os corpos a partir do devir-animal (Deleuze e Guattari, 2012) e do perspectivismo (Viveiros de Castro, 2020), que indica que o mundo é habitado por pessoas humanas e não humanas, que experimentam o mundo a partir de uma multiplicidade de pontos de vista.

Bibliografia

    BUTLER, Judith. Corpos que importam: os limites discursivos do “sexo”. São Paulo: N-1 Edições, 2019.
    CAVALCANTE, João Victor de Sousa. A vida política dos monstros: pessoalidades dissidentes na ficção contemporânea. 2022. 215 f. Tese (Doutorado) – Curso de Comunicação, Universidade Federal de Pernambuco, Fortaleza, 2022.
    DELEUZE, Gilles & GUATTARI, Félix. Mil Platôs (vol.4). São Paulo: Editora 34, 2012.
    FOUCAULT, Michel. OS Anormais. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2010.
    HALLBERSTAN, Jack. A Arte Queer do Fracasso. Recife: CEPE Editora, 2020.
    HALLBERSTAN, Jack. Wild Things: the disorder of desire. Durhan and London:
    Duke University Press, 2020.
    GIORGI, Gabriel. Formas Comuns: animalidade, literatura, biopolítica. Rio de Janeiro: Rocco, 2016.
    VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. Metafísicas Canibais: elementos para uma antropologia pós-estruturalista. São Paulo: Ubu Editora, 2018.
    VIVEIROS DE CASTRO. A Inconstância da Alma Selvagem. São Paulo: Ubu Editora, 2020.