Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Bruno F. Duarte (UFRJ)

Minicurrículo

    Bruno F. Duarte é doutorando e mestre em comunicação e cultura pela Escola de Comunicação da UFRJ, graduado em Comunicação Social – com ênfase em Cinema – pela PUC-Rio. Em 2022, realizou a curadoria da mostra “Bixaria Negra – O cinema de Marlon Riggs”, no Instituto Moreira Salles.

Ficha do Trabalho

Título

    Técnica do êxtase – a dimensão espiritual das fotografias de Rotimi Fani-Kayode

Seminário

    (Re)existências negras e africanas no audiovisual: epistemes, fabulações e experiências

Resumo

    Este trabalho analisa o artigo “Traces of Ecstasy”, de Rotimi Fani-Kayode, destacando como sua fotografia, marcada por espiritualidade e desejo, desafia convenções ocidentais a partir de referências iorubás. Seguindo a pista da criação de imagens como feitiços de resistência, analisa-se a obra de Fani-Kayode em aproximação ao cinema de Marlon Riggs e à ideia de “bixaria negra” como força estética e política contra a morte, a epidemia de HIV/aids e a marginalização de corpos dissidentes.

Resumo expandido

    No artigo “Traces of Ecstasy”, o fotógrafo nigeriano Rotimi Fani-Kayode reflete sobre sua tripla condição de outsider: sua sexualidade não normativa, o deslocamento cultural e geográfico como refugiado da Guerra Civil da Nigéria, e a frustração familiar por não atender às expectativas convencionais. Apesar dos desafios, essa condição lhe proporcionou um senso de liberdade frente às convenções hegemônicas, ao mesmo tempo em que mantinha vivas as tradições ancestrais, permitindo abordagens singulares e espirituais em sua arte.

    Fani-Kayode se distancia das concepções ocidentais de objetividade ao enfatizar que sua fotografia busca uma “dimensão espiritual”, inspirada na arte africana tradicional, onde a máscara não representa a realidade material, mas sim uma conexão com o espiritual. Sua prática artística é uma “técnica do êxtase”, segundo ele, similar à dos sacerdotes e artistas iorubás. A fotografia, para Fani-Kayode, é um instrumento de autoexpressão que transforma fúria e desejo em imagens que desestabilizam convenções e revelam mundos ocultos.

    Essa abordagem encontra eco em outras produções de artistas negros queer. O texto dialoga com a obra do cineasta Marlon Riggs, particularmente Tongues Untied, onde Riggs buscava preservar a memória de uma comunidade gay negra vibrante nos EUA nos anos 1980, em meio à devastação da epidemia de HIV/aids. O autor propõe uma leitura encantada e ritualística dessas produções, enxergando nelas práticas de feitiçaria e resistência – uma “bixaria negra” – que desafiam a morte e celebram o amor entre homens negros. A célebre frase de Joseph Beam, “Homens negros amando homens negros é o ato revolucionário dos anos 1980”, ressoa com força neste contexto.

    Fani-Kayode deixa claro que sua produção é intencionalmente homossexual, guiada por uma ética e estética que subvertem os paradigmas da imagem ocidental. Seu trabalho fotográfico é também uma crítica direta à objetificação do corpo negro e africano, propondo, em vez disso, uma investigação imaginativa sobre negritude, masculinidade e sexualidade. Ele rejeita a visão colonial de civilizações africanas como primitivas e denuncia a mercantilização de símbolos culturais nas metrópoles e ex-colônias, como o Brasil e o Haiti.

    A espiritualidade que permeia sua obra está intimamente ligada à sua ancestralidade iorubá. O próprio nome do artista, Rotimi – abreviação de Oluwarotimi, que significa “Deus fique comigo” – carrega o simbolismo de resistência à morte precoce, associado à crença nos abiku, espíritos que nascem e morrem várias vezes. Mesmo tendo morrido jovem, aos 34 anos, Fani-Kayode permanece presente por meio de suas imagens revolucionárias que celebram o amor e a existência de bixas pretas com beleza, poder e encantamento. Seu legado é um verdadeiro feitiço no tempo.

    Sigo buscando pistas para compreensão do processo de produção de imagens enquanto bons feitiços para o trabalho de vencer a morte – abundante no início dos anos 1980 para homens gays, em especial para aqueles de populações historicamente marginalizadas, com o início sinistro da epidemia de HIV/aids. Neste trabalho, a partir das fotografias de Fani-Kayode, pretendo me debruçar mais sobre esta ideia das bixas pretas bruxas macumbeiras fazendo magia negra em arquivos.

Bibliografia

    FANI-KAYODE, Rotimi. Traces of Ecstasy, Ten.8 Magazine, No 28: Rage & Desire, 1988.
    GUPTA, S. Stuart Hall – Sobre fotografia. Revista ECO-Pós, [S. l.], v. 21, n. 3, p. 170–174,
    2018. DOI: 10.29146/eco-pos.v21i3.22529. Disponível em:
    https://revistaecopos.eco.ufrj.br/eco_pos/article/view/22529. Acesso em: 2 ago. 2021.
    HEMPHILL, Essex. Brother to brother – new writings by black gay men. Washington, DC: Redbone Press, 1991.
    NYONG’O, Tavia. Afro-fabulations: the queer drama of black gay life. Nova Iorque: NYU Press, 2018.
    SOVIK, Liv. “Através do olhar da representação”: Sobre o estereótipo e a comunicação.
    Heterotopías, [S. l.], v. 3, n. 6, p. 1–27, 2020. Disponível em:
    https://revistas.unc.edu.ar/index.php/heterotopias/article/view/31839. Acesso em: 3 ago. 2021.