Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Diego Paleólogo Assunção (UERJ)

Minicurrículo

    Professor Adjunto da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, na Faculdade de Comunicação Social. Docente do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UERJ. Pós-doutorado em Comunicação pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Pós-doutorado em Comunicação e Cultura pela Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Pesquisa nas seguintes áreas: narrativas de terror e horror a partir de perspectivas sexo-políticas; cultura pop, produção de sentido.

Coautor

    VINICIOS KABRAL RIBEIRO (UFRJ)

Ficha do Trabalho

Título

    A criança cuir cresceu

Resumo

    Esta proposta nasce de uma constelação de ensaios sobre infâncias cuirs e memórias visuais. Investiga, por meio de um vídeo-ensaio, como a frase “a criança cuir cresceu” mobiliza fabulações do presente. A partir de autoetnografias e imagens do cinema e da TV, busca-se mapear repertórios afetivos e estéticos que moldaram desejos e agências. A infância cuir, aqui, não é universal, mas gesto político de ruptura, permanência e reinvenção diante do mundo.

Resumo expandido

    Esta proposição segue as luminescências de textos, artigos e pesquisas anteriores: “Revides infantis”: de quando fomos ao cinema e saímos do armário (2020); Tornar-nos Crianças: Auto/etnografias, cuidados e reparações (2020), desenvolvido em colaboração com Adriana Azevedo; Ensaio sobre vivências: fricções de borboletas (2020); e Sobrevivência das Borboletas (2019). Nessa constelação de ensaios e artigos, realizamos uma cartografia a partir da pergunta (tão material, tão corporal) de Preciado: “Quem defende a criança queer?”, refletindo sobre as formas pelas quais as imagens em movimento contribuem para a criação de linhas de fuga, tanto diante quanto através do nosso arquivo corporal deste mundo.
    Ao dialogar com Eve Sedgwick (Como criar filhos gays?), com Donna Haraway e Rosi Braidotti, em busca da capacidade de produzir respostas no e para o presente, com Muñoz, Anzaldúa, Lemebel e outros, as infâncias cuirs se tornam núcleos narrativos que, como um farol, iluminam as energias e a pulsão dessas pesquisas. Nesta proposta, seguimos também essas pensadoras e pensadores, como Vivian Sobchack e Jack Halberstam. Partimos do princípio de que as experiências individuais se coletivizam no encontro, no contágio, nos imaginários e nas vidas que compartilham códigos, signos, metáforas e alegorias, compondo um repertório visual vasto e semovente.
    “A criança cuir cresceu” surge, então, de experiências recentes, de episódios que marcam e assombram, mas que também trazem à luz o que antes era invisível, por meio de exercícios de siderações, conversações. Talvez, nas últimas décadas, a criança que fomos tenha desenvolvido ferramentas estético-políticas para habitar e amar no presente.
    Foi uma conversa ao telefone. Um em Caldas Novas, o outro em Tiradentes. Ao relatar um episódio, Vinicios disse: “Pois é, mas a criança cuir cresceu”. Essa frase — esse quase slogan, essa anunciação — move poeticamente o passado, desarticula e desarma violências e futuros projetados para os corpos da comunidade LGBTQIA+. A criança queer cresceu. O uso do tempo verbal é crucial, pois se refere a um movimento do passado ao presente, implica continuidade e permanência. Algumas crianças cuirs não cresceram, mas muitas sim. E essas algumas…
    O objetivo deste trabalho é a realização de um vídeo-ensaio das memórias do corpo que impulsionaram suas trajetórias para o futuro-presente e se tornaram modulações políticas para pensar, observar e deitar com as imagens do presente.
    Quais formas as imagens em movimento do cinema, da televisão, as personagens bichas, afetadas, afeminadas, povoaram os desejos de vida das crianças cuirs? E onde, nesse torvelinho do tempo colapsado, elas se proliferam, se desejam? As personagens da televisão brasileira dos anos 80 e 90, com suas afetações, coragem (não apenas a coragem escrita no roteiro, mas a coragem da entrega) e “moveções” de mundos, constituem uma gramática visual para esse vídeo-ensaio. Vera Verão, Seu Peru, Natasha, Tieta, Rogéria, Xuxa — um contínuo ethos bicha, queer, cuir. Além disso, as imagens do passado se infiltram nas do presente.
    O cinema, a cinesia da imagem , em seus devires inalcançáveis, é, por sua vez, a relação cuir/estranhada entre o corpo que assiste e a imagem que se move na tela. É nesse espaço, nesse entre, onde a suspensão se articula e o corpo se afeta, que reside a energia das imagens.
    “A criança cuir cresceu” não gera, obviamente, uma resolução dos problemas, conflitos ou violências. É menos a passagem crononormativa do tempo e mais um carregar nas tintas de uma temporalidade queer, espiralada.
    Também não se trata, como já foi salientado, de uma “infância queer” universal. Não estamos alheios às particularidades e singularidades que marcam os corpos, as experiências e as sobrevivências.
    Sem embargo, a criança cuir crescer implica um gesto político radical diante do mundo; suscita construção e continuidade de repertórios antes p/ “entendidos” e que agora resultam gestos de continuidade e rupturas.

Bibliografia

    BRAIDOTTI, Rosi. Ética afirmativa, futuros sustentáveis. In: GADANHO, Pedro. LAIA, João. VENTURA, Susana. Utopia/Dystopia: a paradigm shift in art and architecture. Milão: Mousse Publishing, 2018.
    HALBERSTAM, J. Jack. Wild things: the disorder of desire. Durham: Duke University Press, 2020.
    HARAWAY, Donna. Staying with the Trouble: Making Kin in the Chthulucene, Durham: Duke University Press, 2016.
    MUÑOZ, José. UTOPÍA QUEER El entonces y allí de la futuridad antinormativa. Caja Negra Editora. audiovisual. Tradução: Hugo Salas. 2020
    SEDGWICK, Eve. Como Criar Filhos Gays: o cerco às crianças viadas. Tradução de RIBEIRO, Vinicios; OLIVEIRA, Jefferson. Logos, [S. l.], v. 31, n. 1, 2024. Disponível em: https://www.e-publicacoes.uerj.br/logos/article/view/86186
    SOBCHACK, Vivian. Carnal Thoughts – embodiment and moving image culture. Berkeley and Los Angeles, University of California Press, 2004.