Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Iomana Rocha de Araújo Silva (UFPE)

Minicurrículo

    Professora do Núcleo de Design e Comunicação da UFPE/ CAA, doutora e mestre em comunicação pela UFPE, desenvolve pesquisa ligada ao cinema brasileiro contemporâneo e à direção de arte. Desenvolve trabalhos práticos na área de direção e produção de arte para cinema desde 2007.

Ficha do Trabalho

Título

    Naturalismo, território e direção de arte: Uma observação de `Cidade; Campo`

Seminário

    Estética e Teoria da Direção de Arte Audiovisual

Resumo

    Esta pesquisa propõe observar camadas da construção da visualidade naturalista sob a perspectiva da direção de arte. A partir da observação estética do filme Cidade;Campo (Juliana Rojas, 2024) analiso essas imagens naturalistas evocando Milton Santos, que propõe em seus escritos o que chama de sistema dos objetos. A partir desses conceitos lemos as diversas camadas sensíveis que os objetos evocam, focando na relação entre as personagens, os objetos e os espaços cênicos.

Resumo expandido

    O objetivo desta pesquisa é observar camadas da construção da visualidade naturalista sob a perspectiva da direção de arte, dando ênfase especial aos objetos utilizados para vestir esses espaços. Defendo que a construção dos espaços cênicos naturalistas precisam estar diretamente ligados a uma compreensão clara e fiel dos territórios e das culturas representadas pela narrativa. Apesar de ser muitas vezes taxada como invisível, é por meio da intervenção e curadoria da direção de arte no processo de construção da imagem fílmica naturalista que as nuances e sutilezas dos objetos cotidianos ganham potência dramática e sensível, comunicam sobre um povo, uma cultura, um espaço e suas temporalidades. Para exemplificar esta observação trago o filme Cidade;Campo (Juliana Rojas, 2024), um filme composto por duas histórias paralelas que perpassam questões ligadas a território, reconfiguração de espaços e memórias. Na primeira parte acompanhamos Joana, uma agricultora que se muda para São Paulo após o rompimento de uma barragem inundar a cidade em que morava desde que nasceu, ela se vê diante de um processo de desterritorialização, à deriva em meio ao recomeço e suas memórias. Na segunda parte acompanhamos Flávia e Mara, um casal que decidiu se mudar para a fazenda que Flávia herdou do recém falecido pai, essa mudança vai trazer diversos embates e frustrações, levando as personagens a lidar com memórias e a reconfigurar seus caminhos.Para observar essas imagens naturalistas do cinema evoco Milton Santos (1996) e seus escritos nos quais define o que ele chama de sistema dos objetos. Segundo Santos toda criação de objetos responde a condições sociais e técnicas presentes num dado momento histórico. Esses objetos também não funcionam isoladamente. A partir do reconhecimento dos objetos na paisagem, e no espaço, somos alertados para as relações que existem entre estes e os lugares. Essas relações são respostas ao processo produtivo, incluindo desde a produção de mercadorias à produção simbólica. Para Santos, os objetos são tudo o que existe na superfície da Terra, toda herança da história natural e todo resultado da ação humana que se objetivou. Ele propõe a existência dos objetos como sistemas: sua utilidade atual, passada, ou futura vem do seu uso combinado pelos grupos humanos que os criaram ou que os herdaram das gerações anteriores. A partir desses conceitos se enfatiza a importância da relação que se estabelece entre objetos, pessoas e espaços na formação do que se entende por território. Em Cidade;Campo a direção de arte,por meio de recursos estéticos naturalistas, colabora na construção de territórios, propondo tanto conexões como estranhamentos. A leitura das diversas camadas sensíveis construídas pela direção de arte a partir de cores, texturas, mas em especial por objetos é intermediada aqui por este sistema desenvolvido por Santos, que nos leva a ler os vestígios sensíveis que os objetos evocam, bem como a observar a relação entre as personagens, os objetos e os espaços cênicos como algo determinante. Em Cidade-campo é por meio dos objetos, seus usos e suas relações com as pessoas e os espaços que os territórios se configuram e se reconfiguram. A dinâmica dos objetos, neste filme, evidencia as relação entre os personagens e os territórios, tanto os que estão sendo vivenciados no presente, como os que foram vivenciaram no passado, propondo uma espécie de coexistência de temporalidades. Buscamos apontar que o gesto criativo da direção de arte, nesta e em outras produções com estética naturalista, busca construir um universo fílmico que leve o espectador a experienciar de forma sensível este sistema de objetos.Tanto a construção como a leitura destas imagens se dá por meio da compreensão desta dinâmica entre pessoas, espaços e objetos, evidenciando com isso as peculiaridades culturais, de formas e de uso dos objetos como aspectos importantes na construção da imagem.

Bibliografia

    AUMONT, J. A imagem. Campinas: Papirus, 2012.
    FERREIRA, Benedito (org.) et al. Dimensões da direção de arte na experiência audiovisual. Rio de Janeiro: NAU Editora, 2023.
    HAESBAERT, Rogerio. Território. GEOgraphia, Niterói, vol: 25, n. 55, e61073, 2023.
    HAMBURGER, Vera. Arte em cena: a direção de arte no cinema brasileiro. São Paulo: Ed. Senac e Edições Sesc, 2014.
    LEFEBVRE, Martin. Landscape and film. Nova York: Routledge, 2006. 363 p.
    RANCIÈRE, J. A partilha do sensível: estética e política. São Paulo: Editora 34, 2009.
    SANTOS, M. A Natureza do Espaço. São Paulo: Hucitec, 1996.