Ficha do Proponente
Proponente
- Breno Buswell Braga (UERJ)
Minicurrículo
- Mestrando em Comunicação pela UERJ, possui graduação em Cinema e Audiovisual pela UFF (2022). Membro da equipe de audiovisual do grupo NAI – Núcleo de Artes Integradas, onde atua como videomaker desde 2021, tendo trabalhado em projetos de videoarte, performances cênicas e videoinstalações. Em 2024, participou como assistente de direção e editor da mostra “Casa Comum”, realizada no espaço Oi Futura, no Rio de Janeiro, e estreou como diretor e roteirista com o curta-metragem “Cronos Despedaçado”.
Ficha do Trabalho
Título
- Uma valsa pensando sobre nossos corpos: Suspiria e a ressignificação queer de um clássico
Eixo Temático
- ET 1 – CINEMA, CORPO E SEUS ATRAVESSAMENTOS ESTÉTICOS E POLÍTICOS
Resumo
- Este artigo analisa as duas versões de Suspiria (1977 e 2018), focando em suas diferenças narrativas, estéticas e políticas. A comparação examina como a adaptação de Luca Guadagnino reformula a trama original de Dario Argento, destacando questões contemporâneas como a potencialidade feminina, a opressão política e identidades queer.
Resumo expandido
- Lançado em 1977, o filme de terror Suspiria é muitas vezes descrito como um conto de fadas gótico. Embora contenha diversos elementos que não só são familiares a filmografia do diretor Dario Argento, mas ao gênero giallo como um todo – como mortes sanguinolentas e um assassino misterioso – Suspiria se distingue por apresentar diversos elementos de sobrenaturais sob uma ótica maior de horror. Enquanto o paranormal não seja algo estranho ao giallo, o uso que Argento faz neste filme está muito mais próximo ao horror gótico, mesmo que ele o ainda faça utilizando sua gramática visual construída no giallo. Quatro décadas após sua estreia, Suspiria ganharia uma nova versão, dessa vez comandada pelo também italiano Luca Guadagnino. Porém, além da premissa básica e alguns nomes de personagens, os filmes pouco tem em comum, seja em narrativa ou estética. Quando se junta as problematizações levantadas a cerca da violência, mas principalmente misoginia, envolvendo a obra de Argento, com o fato de que Guadagnino não só cresceu no mesmo cenário político em que o original foi realizado, mas como é um homem assumidamente queer, pode-se inferir que nas discrepâncias que nascem nessa reimaginação, reside uma conversa interessante a ser feita sobre potencialidade de vozes queer no cinema de horror?
O objetivo deste trabalho é comparar as duas versões de Suspiria, focando nestas divergências narrativas, estéticas e políticas que ambos os filmes apresentam. Ao considerar a dinâmica entre as versões, o estudo se aprofunda na maneira como a adaptação de 2018 ressignifica temas como o poder feminino, a opressão política, e as identidades sexuais não normativas, que emergem no contexto contemporâneo.
O roteiro de Argento e Daria Nicolodi é muito mais descolado da realidade política da época do que a reimaginação de Guadagnino. Há certa abstração da geografia urbana representada no filme, quase como se a Alemanha que Susie chega não fosse o país em si, mas sim este mundo de perpétuo pesadelo, que é impossível de se apontar como um lugar pertencente ao nosso mundo. Embora trate da mesma temática de violência e poder da qual a versão de Guadagnino bebe direto do contexto histórico, Argento está mais preocupado em transmitir a sensorialidade do horror em uma forma mais generalista, de um sentimento mais universal.
A versão de Guadagnino é notoriamente mais sóbria em tom e esética. Aqui Guadagnino foca na complexidade das relações entre as personagens femininas, onde o papel de vítimas e algozes parece ser muito mais complexo e fluido, realmente explorando as dinâmicas de abuso de poder dentro de um regime autoritário, assim como em suas silenciosas disputas internas. Se para Argento as bruxas e o oculto eram forças malignas primordiais, em Guadagnino a bruxaria é um eterno equilíbrio entre o prazer e a dor, a libertação e a submissão.
Os corpos femininos em Guadagnino não são objeto vulneráveis, mas verdadeiras potencias que transitam entre a violência e o prazer. Aqui, é o corpo em dança de Susie que é usado como instrumento para a violação e destruição do corpo de uma de suas colegas da academia. Mesmo corpo este que tanto Blanc, quanto Markos disputam para possuir – de formas bem distintas; uma através da completa subjugação e controle, enquanto a outra parece resistir a uma conexão bem mais íntima. Nesse ponto, a sexualidade aqui não é somente uma questão de prazer, mas também de poder sobre sua própria existência, igualmente capaz de oprimir ou libertar.
Pode-se dizer que ambas as versões de Suspiria são produtos de suas épocas. Também se pode dizer que são destilações das sensibilidades artísticas de ambos os seus autores. Muito provavelmente ambas as afirmações estariam corretas, simultaneamente. Uma reimaginação de um clássico do horror jamais substituirá o original, mas que conseguiu se erguer ombro à ombro ao oferecer uma nova leitura sobre a história, que ao invés de só a repetir, busca criar um diálogo em que ambos os filmes se engrandecem.
Bibliografia
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