Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    ANA PAULA VERAS CAMURÇA VIEIRA (UFC)

Minicurrículo

    Professora do Curso de Cinema e Audiovisual da Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Doutoranda pelo Programa de Pós-graduação em Comunicação Social da UFC (PPGCom | UFC), na linha Fotografia e Audiovisual. Realizou parte de sua pesquisa doutoral Université Sorbonne Nouvelle – Paris 3, com bolsa PDSE. Mestre em Artes (PPGArtes ICA | UFC), na linha Arte e Pensamento, e graduada em Cinema e Audiovisual (UFC). Integrante do Laboratório de Estudos e Experimentação em Audiovisual (LEEA-UFC)

Ficha do Trabalho

Título

    Mapas de imagens ressonantes: cidade, tempo e desvio no cinema cearense contemporâneo

Seminário

    Cinema e Espaço

Resumo

    Investigaremos como filmes cearenses — Tremor Iê, Boca de Loba, Espavento, entre outros — instauram espacialidades dissidentes e temporalidades desviantes.Propõe-se um mapa de imagens como método especulativo, capaz de aproximar corpos, territórios e memórias. Ao romper com narrativas urbanas hegemônicas, esses filmes abrem mundos possíveis ancorados em experiências situadas e operam como ferramenta crítica e sensível, tensionando o presente e propondo outras formas de habitar o agora.

Resumo expandido

    Esta comunicação propõe uma investigação sobre como certos filmes contemporâneos realizados em Fortaleza — como Tremor Iê (2019), Boca de Loba (2018), Espavento (2018), entre outros — colaboram com uma reconfiguração crítica das noções de tempo e espaço urbano, compreendidos aqui como construções sociais e políticas em constante disputa (MASSEY, 2008; HARVEY, 2014). A partir de uma perspectiva especulativa, nossa hipótese é a de que essas obras não representam a cidade, mas disputam sua lógica dominante, ao produzirem imagens que torcem a linearidade do tempo e instauram espacialidades dissidentes a partir de formas outras de habitar. A pesquisa se ancora na interseção entre cinema, espaço e práticas especulativas, e busca compreender de que modo os filmes analisados tem operado como exercícios de imaginação radical. Inspirada nos saberes SF de Donna Haraway (2023) — “science fiction [ficção científica], speculative feminism [feminismo especulativo], science fantasy [fantasia científica], speculative fabulation [fabulação especulativa], science fact [fato científico] e so far [até agora]” (HARAWAY, 2023, p. 15) —, observamos o modo como essas obras fabulam o espaço a partir de corpos racializados, femininos, trans e periféricos, propondo mundos ancorados em experiências situadas.

    O cinema, nesse sentido, é aqui compreendido como um dispositivo sensível de fabulação política e de deslocamento do imaginário urbano. Em diálogo com o trabalho de Rasheedah Phillips (2019, 2021), especialmente no coletivo Black Quantum Futurism, percebemos que os filmes abrem espaço para táticas eficazes de desvio de uma cronologia imposta pela modernidade ocidental. Esse desvio se relaciona diretamente também com a crítica de Denise Ferreira da Silva (2016) à separabilidade dos domínios modernos — tempo, espaço, sujeito — e à lógica da razão como estrutura única de conhecimento. Nossa proposta, portanto, busca analisar os filmes como constelações imagéticas que tornam visíveis algumas zonas de indiscernibilidade, de opacidade e de encruzilhada. Uma metodologia que se baseia na construção de um mapa de imagens, uma cartografia visual que não se organiza por linearidade ou causalidade, mas por relações afetivas, poéticas e políticas entre as imagens. Ao serem aproximadas, essas imagens ativam zonas de contato entre filmes, tempos, corpos e territórios distintos.

    Nesse sentido, notamos também que os filmes instauram experiências onde a cidade de Fortaleza é simultaneamente reconhecível e estranhada: Espavento, por exemplo, projeta um futuro devastado por uma patologia respiratória provocada pela poluição, tornando literal a asfixia de corpos precarizados frente ao avanço da especulação imobiliária; Tremor Iê, por sua vez, inscreve gestos insurgentes de corpos dissidentes na noite da cidade, fazendo do som, do corpo e da memória forças de deslocamento; já Boca de Loba convoca um “espírito selvagem urbano” e promove uma redistribuição da violência (MOMBAÇA, 2017) para que a cidade seja atravessada por corpos que rompem com a normatividade dos espaços. Em ambos os casos, os filmes abrem fissuras na superfície da cidade e fazem emergir modos de vida desviantes. Ao romper com uma espacialidade ordenada e uma cronologia desenvolvimentista, imaginamos outras possibilidades para o espaço urbano, a partir das coordenadas do desejo, da memória e da resistência.

    Nesse sentido, nossa leitura busca articular o espaço como construção política, sensível e especulativa, e o tempo como um campo de disputa radical. A partir disso, buscamos contribuir com os estudos de espacialidade no cinema por meio da experimentação e da invenção metodológica.

Bibliografia

    ALMEIDA, Ana Caroline de. Cidades-gestos em melancolia: o cinema brasileiro dos anos 2010 entre vibrações de desejos e traumas urbanos. Tese de doutorado. UFPE, Recife, 2020.

    HARAWAY, Donna. Ficar com o problema: fazer parentes do Chthluceno; traduzido por Ana Luiza Braga. São Paulo : n-1 edições, 2023, 364 p.

    HARVEY, D. Condição Pós-moderna: um estudo sobre a mudança cultural. São Paulo: Loyola. 2014.

    MASSEY, D. Pelo Espaço. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil. 2008.

    MOMBAÇA, Jota. Rumo à uma redistribuição desobediente de gênero e anticolonial da violência. São Paulo: Fundação Bienal; OIP, 2017.

    PHILLIPS, Rasheedah. Counter Clockwise: Unmapping Black Temporalities from Greenwich Mean Timelines. The Funambulist, 2021.

    SILVA, Denise Ferreira. Sobre diferença sem separabilidade. Catálogo da 32ª. Bienal de Arte de São Paulo, 2016.

    SOUTO, Mariana. Infiltrados e Invasores: Uma perspectiva comparada sobre relações de classe no cinema brasileiro.