Ficha do Proponente
Proponente
- Bruno Leites (UFRGS)
Minicurrículo
- Professor do ‘Departamento de Comunicação’ (DECOM) e do ‘Programa de Pós-Graduação em Comunicação’ (PPGCOM) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Atualmente, coordena a linha “Agenciamentos da Imagem” (GPAGI), incluída no grupo de pesquisa ‘Semiótica e Culturas da Comunicação’ (GPESC) e articulada com a Rede de Pesquisa Teoria de Cineastas. Autor de ‘Cinema, Naturalismo, Degradação: Ensaios a partir de filmes brasileiros dos anos 2000’ (Ed. Sulina, 2021).
Ficha do Trabalho
Título
- Criação e crítica de conceitos na teoria de cineastas
Seminário
- Teoria de Cineastas: dos processos de criação à dimensão política do cinema
Resumo
- O objetivo da comunicação é sistematizar definição, possibilidades e desafios da pesquisa com foco em criação e crítica de conceitos dentro da teoria de cineastas. Para tanto, pretendo evidenciar como cineastas criam e se apropriam de conceitos em seu processo produtivo e reflexivo, a partir da experiência de pesquisas realizadas e em andamento na linha de pesquisa Agenciamentos da Imagem (GPAGI/GPESC). Finalmente, será o caso de avaliar a utilização da expressão “criação e crítica”.
Resumo expandido
- O objetivo da comunicação é sistematizar definição, possibilidades e desafios da pesquisa com foco em criação e crítica de conceitos dentro da abordagem teoria de cineastas.
A teoria do conceito de Deleuze e Guattari se preocupa em afastá-lo de um discurso (explicativo, opinativo, demonstrativo etc) sobre um estado de coisas. O conceito é uma espécie de obra do teórico, embora, claro, haja tantas diferenças entre conceito e obra de arte. Antes de perguntar se tal conceito explica esta ou aquela situação no mundo, devemos questionar: trata-se um bom conceito? Que articulação de pensamentos ele traz consigo? Que ética habita essa rede de relações? Que pressupostos estou assumindo ao utilizá-lo?
Com Deleuze e Guattari, poderíamos distinguir duas grandes tendências dentro da teoria de cineastas, aquela de inspiração científica, com ênfase em teses explicativas de relações no mundo, e aquela de inspiração filosófica, com ênfase na pesquisa de conceitos propostos por cineastas ou pesquisadores(as) a partir do pensamento de textos e filmes de cineastas.
A separação pouco fluida entre arte, ciência e filosofia (Deleuze e Guattari) foi algo que muito incomodou Jacques Aumont em seus textos sobre teoria de cineastas (Leites, 2024). Semelhantes reservas encontramos no que tange ao uso dos conceitos nas ciências humanas (Barros, 2016), uma vez que todo campo de pesquisa deve necessariamente produzir seus conceitos fundamentais e atualizá-los ao longo do tempo.
Cada conceito implica uma ampla rede de relações a partir de seus componentes. Barros propõe qualificá-lo como um “acorde”, necessariamente formado por uma reunião de notas. A escassez de notas pode tornar o conceito pobre, mas o excesso pode torná-lo inútil. O campo da “história dos conceitos” pesquisa a constituição de conceitos ao longo da história, partindo do pressuposto de que o conceito entra em relações fundamentais com o “estado de coisas”, pesquisado pela história social. Como afirma Koselleck (2020, p.69), “sem conceitos não há experiência e sem experiência não há conceitos”.
Nesta comunicação, pretendo evidenciar como cineastas criam e se apropriam de conceitos em seu processo produtivo e reflexivo. Para citar alguns casos, há conceitos que surgem para aglutinar uma série de reflexões e decisões no processo criativo, funcionando posteriormente para orientar a produção e eventualmente ganhando autonomia para expressar uma compreensão teórica do cinema. É o caso, por exemplo, de bloco autônomo estruturante (Aiano Bemfica e Pedro Maia de Brito, em torno de “Entre nós talvez estejam multidões”). Há conceitos que surgem da apropriação de teorias e técnicas na história do cinema, recebendo todo tipo de modificação em processos específicos da prática cinematográfica. É o caso, por exemplo, do conceito de noite americana (Ana Vaz, em torno de “É noite na América”, que parte de uma técnica para transformá-la em estética e conceito sobre imagem, animalidade e modernidade na América Latina). Há conceitos que são utilizados em títulos ou palavras ditas em filmes, funcionando como articuladores teórico-estéticos nas próprias obras – é o caso do conceito de multidão, no já citado filme de Bemfica e Maia de Brito.
Finalmente, será o caso de avaliar a utilização da expressão “criação e crítica”. Em que sentido é possível afirmar que o(a) pesquisador(a) faz criação e/ou crítica de conceitos na teoria de cineastas? Partindo do pressuposto de que esta abordagem se propõe a “fazer a teoria do cinema a partir de cineastas” (Penafria, 2020), o conceito pode ser observado como pretexto para uma criação colaborativa, embora a crítica de conceitos (que inclui sistematização de componentes, interpretação de relações, proposições e contraposições com outros conceitos etc.) seja postura metodológica mais comum. Por outro lado, pode ocorrer de a crítica ser a tal ponto propositiva que faça deslocamentos nos conceitos originais, não necessariamente formulados completamente.
Bibliografia
- AUMONT, Jacques. As teorias dos cineastas. Campinas, SP: Papirus, 2004.
BARROS, José D’Assunção. Os conceitos: seus usos nas ciências humanas. Petrópolis, RJ: Vozes, 2016.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. O que é a filosofia? Rio de Janeiro: Ed. 34, 1992.
KOSELLECK, Reinhardt. Histórias de conceitos: estudos sobre a semântica e a pragmática da linguagem política e social. Rio de Janeiro: Contraponto, 2020.
LEITES, Bruno. O programa de Jacques Aumont para estudos em teoria de cineastas. In: MELLO, Jamer; RODRIGUES, Carla; CARVALHO, Marcelo; BASTOS, Thalita. Processos de criação e reflexões teóricas no cinema. São Paulo: Gênio Editorial, 2024. p. 72-100
PENAFRIA, Manuela; LEITES, Bruno; BAGGIO, Eduardo; CARVALHO, Marcelo. Fazer a teoria do cinema a partir de cineastas – entrevista com Manuela Penafria. Intexto, n. 48, p. 6-21, jan./abr. 2020.