Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Marcio Blanco (UFMS)

Minicurrículo

    Professor do curso de Audiovisual da UFMS. Doutor em Comunicação na linha de Tecnologias de Comunicação e Cultura pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Curador e diretor do Festival Visões Periféricas. Autor do livro “Imagens da Pedagogia. Uma genealogia das relações entre cinema e educação no Brasil”. Desenvolve pesquisas e projetos de festivais, curadoria, cinema e educação com foco na produção audiovisual em escolas e periferias. Presidente do Fórum dos Festivais (2022-2024).

Ficha do Trabalho

Título

    Curadoria de curtas e produção de sentido na primeira Semana de Cinema Negro de Belo Horizonte.

Resumo

    A análise das diversas linhas de força que compõe a curadoria de curtas-metragens da primeira Semana de Cinema Negro de Belo Horizonte mostra que o formato se presta a uma montagem que ao mesmo tempo que forja uma noção de cinema negro que dialoga com as lutas identitárias do seu tempo, também procura ultrapassar essa mesma lógica, propondo novos horizontes de discurso por meio da programação dos filmes.

Resumo expandido

    Esta proposta de comunicação parte da noção de que o conceito de raça é um efeito de discurso construído em meio a disputas simbólicas localizadas em um determinado tempo e espaço. No caso da primeira Semana de Cinema Negro de Belo Horizonte (SCNBH), ocorrida em 2021, tais contingências são operacionalizadas e articuladas pelas ferramentas das quais o Festival dispõe em sua curadoria de filmes de curta-metragem.
    O primeiro sentido produzido pela curadoria do SCNBH está vinculado ao próprio nome do Festival. Trata-se de um recorte que privilegia o cinema negro. Não um cinema que apenas tematize a negritude no filme, mas um cinema produzido por negros, como expressa o regulamento de inscrição: “a Semana de Cinema negro de Belo Horizonte tem como objetivo circular, divulgar e debater filmes de realizadores negros contemporâneos”. Neste caso, trata-se da presença de realizadores negros na direção dos filmes selecionados, algo que alguns pensadores irão considerar como chave para a qualificação de uma autoria que abra espaço para emergência de outros discursos sobre a negritude que não somente aqueles produzidos por brancos no cinema. (CANDANDA, BORGES, OLIVEIRA, 2022).
    Se por um lado esse recorte procura corrigir uma distorção histórica sobre a ausência de realizadores negros em lugares de poder na construção do discurso fílmico, por outro, irá atribuir uma grande responsabilidade ao diretor e seu filme pela representação de questões raciais no cinema. STAM e SHOHAT (1995) irão falar do “ônus da representação” ao se referir ao fardo que um filme teria para representar grupos socialmente sub-representados no cinema. A ocupação desigual de lugares de poder no cinema tornaria as representações de grupos marginalizados potencialmente alegóricas, ou seja, elas confeririam à cada obra o fardo de estar sempre representando o coletivo, o que não aconteceria em filmes feitos por grupos dominantes.
    Realizado no auge da pandemia, a primeira edição da Semana selecionou 33 filmes brasileiros. Destes, 29 filmes são curtas-metragens, distribuídos em sessões nomeadas da seguinte forma: “Vivências afro-diaspóricas”, “Afetos e Partilhas” e “Gritos e Fabulações”. Segundo o texto curatorial, as sessões de filmes propõe “avizinhamentos entre as obras, mais do que propor um único caminho por sessão para a experiência de sujeitos que sabemos serem múltiplos” (MATOS, COSTA, SANTOS, 2021, pg. 31). Cada sessão de filmes foi acompanhada de debates on-line feitos em torno do tema e de uma ordem estabelecida pela curadoria em cada sessão.
    Por força do tipo de programação por agrupamento que o formato do curta-metragem enseja em uma Mostra, a produção de discurso a respeito da negritude na curadoria surge como resultado de um avizinhamento entre os filmes, um esforço de “montagem”, aqui entendida como forma de desenhar linhas de legibilidade entre os curtas, e de “imaginação”, entendendo a imaginação não como fantasia, mas como uma faculdade que “percebe as relações íntimas e secretas das coisas, as correspondências e as analogias.” (DIDI-HUBERMAN, 2015, p. 135).
    Apesar da programação de curtas e debates da Semana no catálogo emular uma exibição presencial (cada sessão agrupou os filmes em um tempo médio de 1 hora de duração), os 29 curtas foram disponibilizados em bloco em uma plataforma durante 7 dias, podendo serem vistos em qualquer ordem e duração de tempo pelo espectador na internet, permitindo múltiplas montagens e produções de sentidos a partir da fruição das obras.
    A análise da curadoria da Semana de Cinema Negro de Belo Horizonte mostra que a programação do formato do curta-metragem ao mesmo tempo que se presta a uma montagem que forja uma noção de cinema negro que dialoga com as lutas identitárias do seu tempo, também estimula ultrapassar essa mesma lógica, propondo novos horizontes de discurso por meio da programação de filmes.

Bibliografia

    CANDANDA, D. D. do N.; BORGES, R. C. da S.; OLIVEIRA, S. S. R. de. “Cinema Negro Brasileiro: histórias, conceito e panorama de um movimento cinematográfico”. Revista da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN), [S. l.], v. 14, n. Ed. Especi, p. 279–300, 2022. Disponível em: https://abpnrevista.org.br/site/article/view/1453. Acesso em: 3 fev. 2024.

    DIDI- HUBERMAN, Georges. “Diante do tempo: história da imagem e anacronismo das imagens”. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2015.

    STAM, Robert; SHOHAT, Ella. “Estereótipo, realismo e representação racial. In: CARVALHO, Noel dos Santos (org.). Cinema negro brasileiro. Campinas, SP: Papirus Editora, 2022.

    MATOS, Natalie; CARVALHO, Tatiana; SANTOS, Vanessa. Cinema Negro Contemporâneo Online: e agora? In: BRAZ, Layla; OLIVEIRA, Janaína; VALE, Glaura Cardoso (organizadoras). Semana de Cinema Negro de Belo Horizonte. Belo Horizonte: Ed. Do Autor, 2021.