Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Giovana Vernilo Mendes (UAM)

Minicurrículo

    Giovana Vernilo Mendes é doutoranda e bolsista CAPES no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Anhembi Morumbi, onde também concluiu o mestrado em Comunicação Audiovisual e a graduação em Rádio, TV e Internet. Pesquisa representações de gênero e velhice no cinema de horror contemporâneo.

Coautor

    Rogério Ferraraz (UAM)

Ficha do Trabalho

Título

    A velhice como fonte de horror no cinema contemporâneo.

Seminário

    Estudos do Insólito e do Horror no Audiovisual

Resumo

    Este trabalho analisa a representação da velhice no cinema de horror contemporâneo a partir dos filmes A Visita (2015), A Possessão de Deborah Logan (2014) e Relíquia Macabra (2020). A investigação propõe que os corpos idosos são figurados como espaços de horror, atravessados por signos de decadência física, perda de identidade e colapso familiar, evidenciando ansiedades culturais ligadas ao envelhecimento.

    Palavras-chave: Cinema contemporâneo; Horror; Velhice

Resumo expandido

    Este trabalho integra uma pesquisa de doutorado em andamento no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Anhembi Morumbi, que investiga o medo de envelhecer no cinema de horror contemporâneo, com foco nas representações do corpo idoso como espaço de abjeção, ameaça e colapso identitário. Trata-se de uma das primeiras análises da tese, dedicada a observar como o corpo envelhecido é figurado como catalisador do horror em narrativas centradas na intimidade doméstica e nas relações familiares. O objetivo é compreender como essas representações dialogam com ansiedades sociais relacionadas à decadência física, à perda da autonomia e à dissolução dos vínculos afetivos frente à finitude.
    O recorte parte da análise de três filmes significativos dentro do panorama do horror familiar recente: A Visita (The Visit, M. Night Shyamalan, EUA, 2015), A Possessão de Deborah Logan (The Taking of Deborah Logan, Adam Robitel, EUA, 2014) e Relíquia Macabra (Relic, Natalie Erika James, AUS, 2020). As obras exploram o envelhecimento como ameaça ao expor o corpo idoso em estados de fragilidade, descontrole ou transformação grotesca. Essas figuras velhas surgem como agentes de ruptura e desordem, não apenas pelo que fazem, mas pelo que representam — a degradação do corpo, o esfacelamento da memória e a instabilidade da identidade, sobretudo em contextos familiares.
    Em A Visita, a velhice aparece como disfarce e perturbação. Os supostos avós das crianças protagonistas revelam-se impostores que escaparam de uma instituição psiquiátrica, e sua presença é marcada por comportamentos erráticos, invasivos e corporais que evocam o grotesco. A personagem da avó, em especial, rompe com a imagem tradicional da mulher idosa como figura cuidadora, assumindo uma postura violenta e imprevisível que associa a velhice à loucura e à monstruosidade. O corpo grotesco, tal como formulado por Bakhtin (1987), está presente nos excessos, nos fluidos, na perda do controle, evocando repulsa e desestabilização do espaço doméstico.
    A Possessão de Deborah Logan radicaliza essa lógica ao representar uma mulher idosa com Alzheimer que se encontra possuída por uma força sobrenatural. O filme borra os limites entre degeneração mental e intervenção demoníaca, tornando a protagonista uma figura ambígua, entre vítima e ameaça. A progressiva perda de autonomia e de identidade da personagem, visualizada por meio de um corpo que se transforma, urra, morde e desafia a lógica, provoca horror ao revelar um tipo de “morte em vida”, conforme aponta Sobchack (2004). A narrativa tensiona a ideia de maternidade, pois a filha, encarregada dos cuidados, precisa lidar com a destruição simbólica da mãe, cuja presença física permanece, mas cuja subjetividade se dissolve.
    Relíquia Macabra apresenta uma abordagem mais atmosférica e simbólica do envelhecimento, associando a deterioração do corpo à da casa. A personagem Edna, idosa com sintomas de demência, habita um espaço que apodrece junto com ela, criando uma metáfora visual da dissolução da memória e da identidade. O filme constrói um horror sensorial, em que o ambiente participa da angústia e o espaço doméstico torna-se hostil. A convivência entre três gerações femininas — avó, mãe e neta — expõe as tensões do cuidado, da hereditariedade e do medo de se tornar o outro. O corpo da idosa é aqui um espelho do que as mais jovens podem vir a ser, reforçando a velhice como destino temido e evitado.
    As obras analisadas representam a velhice como ameaça à ordem familiar, por meio de corpos desviantes e abjetos. Este trabalho inicia uma pesquisa mais ampla sobre o envelhecimento no horror, que será aprofundada com novos filmes e referenciais dos estudos de gênero e corporeidade, visando compreender como o gênero constrói a velhice como espaço de tensão e conflito cultural.

Bibliografia

    BAKHTIN, Mikhail. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento: o contexto de François Rabelais. São Paulo: Hucitec, 1987.
    CÁNEPA, Laura Loguercio. Configurações do horror cinematográfico brasileiro nos anos 2000: continuidades e inovações. In: CARDOSO, J. B. F.; SANTOS, R. E. (Orgs.). Miradas sobre o cinema ibero latino-americano contemporâneo. São Caetano do Sul: USCS, 2016.
    CHERRY, Brigid. Horror. Londres: Routledge, 2009.
    CLASEN, Mathias. Why Horror Seduces. New York: Oxford University Press, 2017.
    REIS, Carlos et al. (Orgs.). Dicionário Digital do Insólito Ficcional. Rio de Janeiro: Dialogarts, 2022.
    SOBCHACK, Vivian. Carnal Thoughts: Embodiment and Moving Image Culture. Berkeley: University of California Press, 2004.
    THACKER, Eugene. In the Dust of this Planet. Washington: Zero Books, 2011.