Ficha do Proponente
Proponente
- Jyan Carlos Sales de França (UFPE)
Minicurrículo
- Doutorando em Comunicação pelo Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco (PPGCOM-UFPE), pesquisando imagens de violência no cinema brasileiro do século XXI. Mestre em Comunicação pelo PPGCOM-UFPE, com dissertação publicada acerca das conexões entre cinema e literatura na obra de Marguerite Duras. Graduado em Cinema e Audiovisual, trabalhando na intersecção entre cinema e educação.
Coautor
- Taís Marques Monteiro (UFPE)
Ficha do Trabalho
Título
- Substituição figural, imagens sem órgãos: por uma dialética negativa em Hipernormalização (2016)
Resumo
- Este trabalho analisa “Hipernormalização” (Adam Curtis, 2016) como filme-ensaio que mobiliza imagens de arquivo numa economia visual tormentosa. Analisamos três momentos: as relações políticas nas imagens do 11/9; o impacto metanarrativo da primeira decapitação pública, e o papel da música como dispositivo sensível. Há conexões entre gestos de montagem e da imagem. Sugerimos duas possibilidades de relação estética: substituição figural ondulante e imagens sem órgãos.
Resumo expandido
- Tomamos o filme Hipernormalização (Adam Curtis, 2016) como objeto de análise, nos encampando um enclave entre a forma (das coisas e do mundo), pela imagem e pela matéria, que se depreende de uma relação de imagerie, olhando por sob uma economia de imagens em tormenta. O filme-ensaio, por uma montagem compassada pelo argumento-narração de Curtis, encadeia imagens de arquivo ritmado pelo impacto das mudanças nas formas dominantes de poder e de controle social das últimas décadas. Em um movimento centrípeto, considerando as tensões e as distâncias criadas na e pela imagem (Rancière, 2012), alcançamos as indeterminações, dessemelhanças e ambiguidades postas em cheque pelo filme de Curtis, especialmente no que diz respeito a uma dialética negativa (Didi-Huberman, 2015), mobilizada pelo processo de montagem, e pela recursividade do uso do arquivo.
Assim, junto à noção de imagens sem órgãos que desenvolveremos, herdada da filosofia de Gilles Deleuze e Félix Guattari (2011), investigaremos o uso da violência como dado recuperável apesar de tudo (Didi-Huberman, 2021). Por outro lado, e olhando para o limite côncavo do visível, do mostrável, do representável e do imaginável, buscaremos fazer a operação — inversa ao filme de Curtis — de uma dialética aberta às contaminações de uma diferença geratriz, cujo mecanismo expõe um mundo de imagens imaginadas (Flusser, 2012).
A investigação se faz pelo mesmo dispositivo fílmico de implicar percepções das imagens que emanam, pela superfície lisa, um mundo em descontrole. Apontamos, pois, em interlocução com Adam Curtis (2016), a observação da imagem de controle em pleno descontrole, em uma tormenta de imagens. Elegeremos três momentos fílmicos como condutores do pensamento: a sequência do 11 de setembro de 2001, a sequência da primeira decapitação pública em contorno com três adolescentes que dançam e as escolhas das imagens e músicas de transição, como dispositivos sensíveis de atmosfera — como o boneco de ar, a videoarte de Martha Rosler — A Semiótica da cozinha (1975). Nosso movimento se dá em busca de um entre-meio da imagem, que não existe senão no fio sensível dos gestos e das palavras — tanto daqueles que a qualificam e a destroem, em busca do que organiza o policiamento dos olhares (Mondzain, 2009).
Nossas conclusões seguem na via da substituição figural ondulante: em certa zona de figurabilidade, identificamos um tipo de imagem que se desprende do medium no qual se origina, e erra, sem órgãos, eventualmente se apropriando da dessemelhança e da distância da sua própria composição. Tal imagem, ainda sem definição sedimentada, mas largamente observada, anuncia: entre o desprendimento de uma ideia de real, a imagem como superfície lisa e o imaginado que se ondula em substituições achatadas de profundidade, nos dá vestígios de figuráveis que, cada vez mais, se desprende do não-figurável.
Bibliografia
- DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. O anti-Édipo. São Paulo–SP: Editora 34, 2011.
DIDI-HUBERMAN, Georges. 2015. A Semelhança Informe: ou o gaio saber visual segundo Georges Bataille. Rio de Janeiro–RJ: Contraponto, 2015.
FLUSSER, Vilém. O universo das imagens técnicas: elogio da superficialidade. São Paulo–SP: Annablume, 2012.
FLUSSER, Vilém. Gestos. São Paulo–SP: Annablume, 2014.
MONDZAIN, Marie-José. A imagem pode matar? Lisboa: Vega Passagens, 2009.
RANCIÈRE, Jacques. O destino das imagens. Rio de Janeiro–RJ: Contraponto, 2012.