Ficha do Proponente
Proponente
- Ivana Bentes (UFRJ)
Minicurrículo
- Professora Titular da UFRJ, doutora em Comunicação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Professora e pesquisadora do Programa da Pós Graduação em Comunicação da UFRJ.
Ficha do Trabalho
Título
- Visualidades Amazônidas
Mesa
- Imaginários Amazônidas: Mitos, Imagens e Zonas de Turbulência
Resumo
- A Amazônia como território simbólico e estético em disputa, entre narrativas de preservação, desenvolvimentismo, destruição e regeneração. Através de autores, artistas e obras (Uýra, o projeto NAVE, O Esplendor dos Contrários), analisa as disputas entre discursos preservacionistas e desenvolvimentistas, articulando conceitos como “devir-indígena” e “devir-amazônida”, que propõem uma ecologia espiritual e tecnológica baseada na coevolução entre humanos e a floresta.
Resumo expandido
- A Amazônia tem sido historicamente um território de experimentações radicais e intensas disputas simbólicas e materiais. Sua representação oscila entre os mitos do “Paraíso Perdido”, do “pulmão do mundo” e de um espaço apocalíptico marcado pela destruição ambiental. Encarada como uma “reserva de mundos”, a região se torna palco de confrontos entre discursos preservacionistas e desenvolvimentistas, além de se inserir no debate contemporâneo sobre o Antropoceno, sendo alvo de narrativas negacionistas promovidas por setores da extrema-direita.
No início do século XX, Euclides da Cunha definiu a Amazônia como um “paraíso opressor”, onde a natureza supera a presença humana. Em sua expedição (1904-1905), retratou uma região hostil, marcada pelo extrativismo da borracha e pela exploração dos recursos e das populações locais. Sua visão de uma natureza intocada reforça um imaginário romântico da floresta, apagando a presença histórica dos povos amazônicos.
As disputas ecológicas e territoriais refletem perspectivas antagônicas: o preservacionismo, que sustenta o mito da floresta virgem, e o desenvolvimentismo, que promove o crescimento econômico a qualquer custo. Novos conceitos como “devir-indígena” e “devir-amazônida” propõem uma reconfiguração das relações entre natureza e tecnologia, unindo espiritualidade, ciência e ecologia.
O imaginário amazônico é também atravessado por mitos e pelo cotidiano das populações locais. Elementos como o trabalho dos seringueiros, a vida ribeirinha e seres encantados como o Mapinguari e o Curupira convivem nas narrativas e nas expressões artísticas. Um exemplo é o artista Hélio Melo, que, com pigmentos naturais, retrata cenas híbridas entre o real e o fantástico.
As estéticas amazônidas contemporâneas transitam entre o naïf, o mítico e o pop futurista. O conceito de “Internet Verde” e os futurismos amazônicos apontam para uma relação simbiótica entre natureza e tecnologia. Artistas como Uýra, indígena trans de Manaus, usam performances para abordar questões de biodiversidade, racismo e transfobia, em criações que fundem corpo, floresta e arte.
A figura de Leona Vingativa simboliza a regeneração de padrões estéticos e políticos. Como ícone pop e trans da periferia, sua imagem dialoga com o futurismo afro-indígena, ao combinar ancestralidade, cosmologias ameríndias e crítica social.
No cinema, a Amazônia aparece em obras como Avatar, onde a floresta é representada como um organismo vivo conectado a seus habitantes. A Teoria de Gaia, que propõe a Terra como sistema autorregulado, é incorporada à ficção como rede biológica e espiritual, contrapondo-se a visões distópicas da crise ambiental.
A disputa simbólica também se manifesta em fenômenos como Ratanabá — suposta cidade perdida na Amazônia — propagada por grupos conspiracionistas. Baseada em imagens do filme *The Road to El Dorado*, essa narrativa busca apagar culturas indígenas em favor de delírios tecnofantasiosos.
Na série fotográfica O Esplendor dos Contrários, Arthur Omar trata a Amazônia como um território mítico e magnético. Suas fotografias revelam os contrastes entre destruição e regeneração, entre tradição e modernidade, inserindo a região no campo das humanidades compósitas.
A Amazônia é retratada como espaço híbrido e plural em NAVE, video instalação imersiva da artista visual Roberta Carvalho, que articula ficção científica, arte pop, ancestralidade e realismo mágico.
A proposta é, a partir da análise dessas obras e autores, mapear a disputa simbólica e política em torno desse território, identidades, presente urgente e futuros que se entrecruzam apontando para um imaginário em construção.
Bibliografia
- ANDRADE, Mário de. O turista aprendiz. Brasília: Iphan, 2015.
ARLINDO DE OLIVEIRA, José. Ratanabá, a cidade perdida. [S.l.]: Amazon Books (Kindle Edition), 2024.
BATISTA, Djalma. Amazônia: cultura e sociedade. Manaus: Valer, 2003.
CHAGAS, Andrey Rodrigues. Bicha preta, o que nos conta? 2020. Dissertação (Mestrado em Comunicação e Cultura) – Escola de Comunicação, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2020.
CUNHA, Euclides da. À margem da história. Organização de Leopoldo M. Bernucci, Francisco Foot Hardman e Felipe Pereira Rissato. 1. ed. São Paulo: Editora Unesp, 2019.
GONDIN, Neide. A invenção da Amazônia. Manaus: Valer, 2019.
KOPENAWA, Davi; ALBERT, Bruce. A queda do céu: palavras de um xamã yanomami. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.
NUGENT, Stephen. Scoping the Amazon: image, icon, ethnography. London: Routledge, 2016.
OMAR, Arthur. O esplendor dos contrários. São Paulo: Cosac & Naify, 2003.