Ficha do Proponente
Proponente
- Ana Carolina Lopes Francisco (UERJ)
Minicurrículo
- Graduada em Comunicação Social – Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) com intercâmbio acadêmico na Universidade de Liverpool (UoL) e Universidade da Califórnia, Los Angeles (UCLA). Pós-graduada, lato sensu, em Escritas Performáticas pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Atualmente, é mestranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), sendo bolsista CAPES.
Ficha do Trabalho
Título
- A intersecção de gêneros narrativos e a intertextualidade entre realidade e ficção no documentário
Eixo Temático
- ET 3 – FABULAÇÕES, REALISMOS E EXPERIMENTAÇÕES ESTÉTICAS E NARRATIVAS NO CINEMA MUNDIAL
Resumo
- Esta análise examina a tênue fronteira entre fato e representação no cinema documental, em narrativas híbridas que mesclam ficção e realidade, assim como integram diferentes linguagens artísticas – cinema, teatro e literatura. Faz-se a defesa de uma abordagem híbrida para adaptar obras clássicas, podendo, através de práticas como a autorrepresentação e autoficção, contribuir para a visibilidade de vivências antes limitadas ou marginalizadas pelos meios tradicionais de produção cultural.
Resumo expandido
- Este trabalho é fruto da pesquisa que desenvolvo no Mestrado e que está em processo. Ele partirá da noção de hibridismo dentro da área do cinema documental para examinar a tênue fronteira entre fato e representação em narrativas híbridas que mesclem fabulações e fatos verídicos, assim como integrem diferentes linguagens artísticas – cinema, teatro e literatura. Procura-se compreender de que forma adaptações de textos literários e teatrais para um documentário híbrido entre ficção e realidade pode produzir sentidos múltiplos através das diferentes camadas de linguagem estética – a partir das quais performance e histórias reais têm o potencial também de se hibridizar narrativamente, por meio das personagens.
Esses filmes abrem possibilidades de engajar novas gerações em um diálogo com textos dramatúrgicos e literários clássicos, promovendo uma ferramenta cultural que provoque reflexão, inclusive sobre a relação intertextual entre real e ficção, fato e representação. Encontramos exemplos dessa noção de intertextualidade e polifonia em filmes como Trágicas (Aída Marques, 2019), Moscou (Eduardo Coutinho, 2009), Ricardo III – Um Ensaio (Al Pacino, 1996) e The arbor (Clio Barnard, 2010).
Para abordar o fenômeno da hibridização, parto do conceito de midiatização (Auslander, 2008), que integra a mediação à uma experiência ao vivo e performática. A análise da relação entre a presença da câmera e o sujeito dialoga com os estudos de Ismail Xavier (2014) que apontam como a presença do aparato técnico instaura um “privilégio ontológico” e uma “ansiedade exibicionista” (Ibid, p.34), estruturando situações de teatralidade em que cada indivíduo assume “um papel — ou imagem” (Ibid.).
Para Bill Nichols, os documentários tornaram-se peças centrais no cinema de engajamento social e não seriam uma reprodução da realidade, mas uma representação do mundo em que vivemos (2010). Comolli enfatiza o papel político do cinema ao revelar o que faz funcionar os sistemas de representação nas sociedades, definindo o real como a parte que escapa às narrativas já formadas, demandando novas ou desafiando as existentes (2008).
Nas discussões contemporâneas sobre o cinema argumenta-se que rotular um filme como documentário “não autentica seus significados” (DA-RIN, 2006, p. 221), pois “não existe método ou técnica que possa garantir acesso privilegiado ao real” (Ibid). O foco se volta para investigar os processos de produção de sentido (Ibid, p. 223), e a intersecção de gêneros surge como um caminho para que, através de tensões criativas, atinja-se uma conscientização dos meios pelos quais “a realidade é mediatizada através da arte” (STAM, 1981, apud DA-RIN, 2006, p. 210).
Outro conceito essencial é o da autoficção, que representa o desejo do eu de estar “também inscrito na ficção” (SOUZA, 2017, p. 109). Isso rompe com a ideia aristotélica de separação entre mimese e realidade, baseando-se na “hibridização de seus procedimentos de atuação” (AZEVEDO, 2008, p. 46). No campo da adaptação, Patrick Cattrysse propõe uma aproximação entre adaptação cinematográfica e tradução, destacando que a transposição de textos literários e teatrais pode assumir um papel inovador quando “a estabilidade do gênero fílmico está em perigo” (DINIZ, 1999, p. 42). Um aspecto recorrente é a intersecção de linguagens, que não se limitam a uma única fonte, pois “muitas outras práticas servem simultaneamente como modelos para o processo de produção da obra (filme) em diferentes níveis” (Ibid.).
Desta forma, a partir das obras e autores citados, pretendo elaborar uma análise sobre como filmes documentais híbridos, atravessados por diferentes linguagens, podem questionar a distância entre criação e veracidade. E compreender, se ao trazer pessoas reais para o protagonismo através da autorrepresentação, pode-se contribuir para a visibilidade de grupos sociais sub-representados ou estereotipados nos tradicionais suportes narrativos, abordando em tela uma pluralidade de perspectivas sociais.
Bibliografia
- AZEVEDO, Luciane Almeida de. Autoficção e literatura contemporânea. Revista Brasileira de Literatura Comparada, vol. 10, no. 12, 2008. Disponível em: http://revista.abralic.org.br/index.php/revista/article/view/179. Acesso em: 7 set. 2024.
COMOLLI, Jean-Louis. Ver e poder. Belo Horizonte: UFMG, 2008.
DA-RIN, Silvio. Espelho partido: tradição e transformação do documentário. 3. ed. Rio de Janeiro: Azougue Editorial, 2006.
DINIZ, Thais. Literatura e cinema: da semiótica à tradução cultural. Ouro Preto: UFOP, 1999.
NICHOLS, Bill. Introduction to Documentary. 2. ed. Bloomington: Indiana University Press, 2010.
SOUZA, Eneide Maria (2017). Autoficção e sobrevivência. La Palabra, no. 30, p. 107 – 114, janeiro-junho, 2017. Disponível em:
http://www.scielo.org.co/pdf/laplb/n30/0121-8530-laplb-30-00107.pdf. Acesso em: 7 de set. de 2024
XAVIER, Ismail. A teatralidade como vetor do ensaio fílmico no documentário brasileiro contemporâneo. Aniki, vol. 1, no. 1, p. 33-48, 2014.