Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Danielle Parfentieff de Noronha (UFS)

Minicurrículo

    Danielle Parfentieff de Noronha é professora do curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal de Sergipe (UFS). Doutora em Mídia, Comunicação e Cultura pela Universitat Autònoma de Barcelona (UAB), mestra em Antropologia pela Universidade Federal de Sergipe (UFS) e graduada em Comunicação Social – Jornalismo pela Universidade Metodista de São Paulo. É pesquisadora do Grupo de Estudos Culturais, Identidades e Relações Interétnicas – GERTs (UFS) e do Grupo Documentário e Fronteiras (UFF).

Ficha do Trabalho

Título

    Reflexões sobre o cinema documental biográfico de Heloisa Passos

Mesa

    Mulheres no cinema: experiências de organização, práticas e políticas

Resumo

    Nesta comunicação apresento algumas reflexões sobre o trabalho da documentarista Heloisa Passos. A partir de um diálogo entre a antropologia, os estudos feministas e as teorias do cinema de mulheres, principalmente por meio da análise das obras e de entrevistas, busco discutir sobre a relação entre o privado e o público nas narrativas, além de trazer questões sobre os elementos de construção da linguagem das obras e os modos de produção, visibilizando a relação entre a forma e o conteúdo.

Resumo expandido

    Com uma ampla trajetória na direção de fotografia, Heloisa Passos iniciou o seu percurso como diretora de longa-metragem em 2017 com o documentário “Construindo Pontes”, que foi seguido por “Eneida”, lançado em 2022. Ambos os filmes abordam sua família: em especial sua relação com o pai, no primeiro caso, e a relação de sua mãe com a irmã mais velha, no segundo. Ao olhar para o entorno familiar, Heloisa filma a si mesma. Seus pontos de vista e seus modos de fazer cinema são expostos. Por um lado, ao mesmo tempo que acompanhamos a intimidade de sua família, somos apresentadas a um contexto social maior, que discute questões como a situação política do Brasil ou as marcas do patriarcado na vida das mulheres. Por outro lado, a construção da linguagem do filme é posta em cena, uma forma coletiva de pensar e fazer cinema, que privilegia as mulheres atrás das câmeras e que pensa a câmera como um instrumento do sentir. A partir de um diálogo entre a antropologia do cinema, os estudos feministas e as teorias do cinema de mulheres, principalmente por meio da análise dos filmes e de entrevistas com a diretora, esta comunicação discute a relação entre o privado e o público nas narrativas dos filmes, além de refletir sobre os elementos de construção da linguagem e da produção das obras, visibilizando a relação entre a forma e o conteúdo de seu cinema documental biográfico.

    A trajetória profissional de Heloisa, assim como de outras mulheres, está permeada pela enorme desigualdade de gênero que existe no campo cinematográfico no Brasil e no mundo. Primeiro, por ter iniciado em uma das áreas mais desiguais, o departamento de câmera, e ter preciso se impor para conseguir se manter como diretora de fotografia. Como conta Marina Tedesco (2020), “sua primeira assistência de câmera data de 1991, e ela permaneceu na função até 1998, quando decidiu não aceitar mais trabalhos como assistente para começar a ser vista apenas como diretora de fotografia”. Hoje, Heloisa tem no currículo muitos filmes, tendo sido premiada diversas vezes dentro e fora do país. Apenas para exemplificar essa questão, em 2018, a Ancine divulgou um estudo sobre a diversidade de gênero e raça no cinema brasileiro a partir da análise dos longas lançados comercialmente em 2016. Como exemplo, a pesquisa mostrou que 75,4% dos filmes foram dirigidos exclusivamente por homens brancos. As mulheres brancas dirigiram sozinhas apenas 19,7% dos projetos, também exercendo pouco outras funções como roteiro (16,2%) e fotografia (7,7%). Os dados são ainda mais alarmantes quando olhamos para a diversidade de raça: naquele ano, nenhuma mulher negra ou indígena assinou a direção de um longa. Além disso, também chama atenção que quando focamos nos dados com recorte de gênero por tipo de obra podemos perceber uma presença maior de mulheres em obras documentais, que normalmente dependem de estrutura e investimentos menores.

    Depois de ter dirigido alguns curtas, e também acumulando a função de produtora, Heloisa estreia na direção de um longa com “Construindo Pontes”, “um filme que não distingue a política da vida”. Como apresenta a sinopse, a obra parte da relação entre um pai engenheiro e uma filha cineasta para questionar a trajetória política do Brasil. Ainda no âmbito de sua família, lança “Eneida”. A personagem que dá nome a obra é sua mãe, de 84 anos, a quem ela acompanha numa jornada ao seu passado em busca da primogênita que não vê há mais de 20 anos. Nesse sentido, em diálogo com Consuelo Lins e Thais Blank (2012), apesar dos enfoques um pouco diferentes, nesta pesquisa, iniciada no projeto “Speculum – Filmar-se e ver-se ao espelho”, proponho pensar “como transformar filmes de família que interessam apenas aos que neles estão envolvidos em imagens de uma memória comum, a ser compartilhada com um público mais amplo? e “como fazer que a vida de personagens quaisquer se confunda com os destinos de uma época, dissolvendo as fronteiras entre as memórias pessoais e a “memória do mundo”?

Bibliografia

    HOLANDA, Karla. Por que Não Existiram Grandes Cineastas Mulheres no Brasil? Cadernos Pagu, 2021, p. 1-21.
    LINS, Consuelo; BLANCK, Thais. Filmes de família, cinema amador e a memória do mundo. Significação: Revista de Cultura Audiovisual, 39(37), 2012, p. 52-74.
    PEREIRA, Ana C. Filmar-se e ver-se ao espelho: a auto-representação de documentaristas portuguesas e brasileiras. Journal of Communication. Universidade de Salamanca (Espanha). Número 19, 2019.
    TEDESCO, Marina C. Heloísa Passos: Interpelando uma trajetória a partir do gênero. In: Atas do IX AIM, 2020, p. 38-48.
    VEIGA, Ana Maria.. Teoria e Crítica Feminista: Do contracinema ao filme acontecimento. In: Holanda, Karla (org.). Mulheres de Cinema. Rio de Janeiro: Numa, 2019, p. 261-278.