Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Márcio Henrique Melo de Andrade (UERJ)

Minicurrículo

    Roteirista, Pesquisador, Produtor e Educador. Doutor em Comunicação (UERJ), com período sanduíche na Universidad de Navarra (Espanha) – com financiamento CAPES – e Mestre em Educação Tecnológica (UFPE). Autor do livro Autobiografias do Outro – Camadas de Selfies em Documentários Pernambucanos (2015) e de artigos em periódicos como Revista Doc-Online (UBI/Portugal), Rumores (ECA/USP) e Galáxia (PUC/SP). Suas áreas de investigação incluem narrativa, roteiro, documentário e escritas de si.

Ficha do Trabalho

Título

    Dos vestígios e à fabulação: videoarte, escritas de si e a pesquisa artística em Pa_Terno

Seminário

    Teoria de Cineastas: dos processos de criação à dimensão política do cinema

Resumo

    O artigo apresenta os processos de criação da videoarte Pa_Terno, de Márcio Andrade, a partir da vivência com o Alzheimer do pai para investigar o luto e a memória por meio de imagens de arquivo, animação e autoficção. A pesquisa articula teoria e prática, situando-se no campo das escritas de si (Lejeune, 1989; Arfuch, 2010), em diálogo com a videoarte autorrepresentativa (Vieira, 2003), propondo-se como gesto de resistência à dissolução da memória e à invisibilidade das subjetividades.

Resumo expandido

    Este artigo apresenta uma pesquisa artística em desenvolvimento que resultará na videoarte Pa_Terno, concebida por Márcio Andrade. O projeto parte da vivência do autor com o adoecimento e falecimento do pai por Alzheimer, explorando como as linguagens audiovisuais podem reconfigurar experiências subjetivas de perda, luto e memória em formas poéticas e críticas. A videoarte, com duração prevista entre 15 e 20 minutos, combina imagens de arquivo pessoal, trilhas sonoras autorais, animações feitas à mão e elementos ficcionais que tensionam as fronteiras entre documento e invenção. A obra propõe-se como exercício de fabulação sensível, em que o gesto de rememorar se entrelaça a estratégias de autorrepresentação, autoficção e reinvenção identitária. A pesquisa insere-se no campo das escritas de si, articulando processos criativos e investigações teóricas sobre os modos de inscrição da subjetividade na arte contemporânea. Escritas de si são aqui entendidas como práticas em que o sujeito se constitui ao narrar-se, reinscrevendo sua presença no tempo e no espaço (LEJEUNE, 1989; ARFUCH, 2010). Em PA_TERNO, a videoarte é mobilizada como linguagem capaz de expandir tais escritas, ao reunir fragmentos visuais, sonoros e discursivos que operam simultaneamente como documento e metáfora, arquivo e afeto. A composição do eu fílmico, assim, revela-se como gesto ético e estético de resistência à dissolução da memória. A metodologia empregada é híbrida, reunindo instrumentos da pesquisa acadêmica e das práticas artísticas, ancorada no ponto de vista do artista-pesquisador, que experimenta, registra e reflete criticamente sobre seu processo criativo. O projeto articula leitura e fichamento de textos teóricos, análise de obras audiovisuais, escrita de diário de criação, elaboração de roteiro e realização de experimentos práticos em vídeo e animação. Conforme Rey (2002), a pesquisa em artes visuais exige um trânsito constante entre conceitos e prática, em que as ideias se constroem a partir da experimentação e são devolvidas ao gesto criador com novos sentidos. A videoarte, enquanto meio expressivo, é abordada como campo expandido que acolhe linguagens híbridas, entre o cinema, as artes visuais e a performance. Desde os anos 1960, artistas como Rafael França, Sandra Kogut e Regina Silveira vêm explorando o vídeo como espaço de autorrepresentação (VIEIRA, 2003). Na contemporaneidade, essas produções configuram-se como zonas de invenção subjetiva, em que a imagem se torna superfície de inscrição do corpo, da voz e da memória do artista. A proposta de PA_TERNO busca dialogar com esse percurso histórico, ao acionar o vídeo como forma de elaboração simbólica da perda e do afeto, compondo um autorretrato movente e descontínuo. Para Arfuch (2010), essas formas configuram um “espaço biográfico” onde o testemunho individual adquire densidade coletiva, permitindo reconhecer-se e reconhecer o outro. No campo do cinema, autores como Bergala (1998), Macdonald (2013) e Mesquita (2007) indicam que o gesto autobiográfico se intensifica no documentário contemporâneo ao privilegiar o recorte mínimo, o cotidiano, os afetos. Tais obras deslocam a noção de verdade documental ao assumir a subjetividade como operador estético. Assim, PA_TERNO busca refletir sobre a memória, a paternidade e o apagamento, ancorando-se em uma perspectiva que reconhece o íntimo como território político e a imagem como espaço de insurgência afetiva.

Bibliografia

    ARFUCH, Leonor. O espaço biográfico: dilemas da subjetividade contemporânea. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2010.
    BERGALA, Alain. Si “je” m’était conté. In: BERGALA, Alain (org..) Je est un film. Editora Acor, París, 1998.
    LEJEUNE, Philippe. On Autobiography, Minneapolis: University of Minnesota Press, 1989.
    MACDONALD, S..American Ethnographic Film and Personal Documentary: The Cambridge Turn.Berkeley: University of California Press, 2013
    MESQUITA, Cláudia. Outros Retratos – Ensaiando um panorama do documentário independente no Brasil. In: Roberto Cruz. (Org.). Sobre fazer documentários. São Paulo: Itaú Cultural, 2007, v., p. 44-51.
    REY, Sandra. Da prática à teoria: três instâncias metodológicas sobre a pesquisa em artes visuais. Porto Arte, Porto Alegre: PPGAV-UFRGS, n.13, v.7, 1996.
    VIEIRA, Leandro G.. Video em primeira pessoa – Autobiografia e auto-imagem na produção audiovisual brasileira. 2003. 89f. Dissertação (Mestrado em Multimeios) – Instituto de Artes (UNICAMP). Campinas, 2003.