Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Mateus Costa de Oliveira (UFBA)

Minicurrículo

    Doutorando no Programa de Pós-graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas (PÓSCOM) da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Mestre pelo mesmo programa. Graduado em Comunicação Social, com habilitação em Produção em Comunicação e Cultura, pela mesma instituição. Integra o Laboratório de Análise Fílmica (LAF) e o grupo de pesquisa (An)arqueologias do Sensível. Participou como júri, da Mostra Brasil, do Festival Mimoso de Cinema (2024). Faz parte do projeto de extensão Cineclube Nanook (LAF/U

Ficha do Trabalho

Título

    Torre (2017) e Torre das Donzelas (2018): o documentário como local sugestivo da memória

Resumo

    Esta comunicação, fruto de um processo inicial de investigação, reúne dois documentários – Torre (2017), de Nádia Mangolini, e Torre das Donzelas (2018), de Susanna Lira – que, em perspectivas diferentes, tratam da extinto Presídio Tiradentes. Ambos lidam com a memória e com a ausência física do presídio. A comunicação tem como objetivo refletir sobre como o cinema documentário pode contribuir para um novo espaço de memória através da articulação da linguagem audiovisual.

Resumo expandido

    Em 1888, Pedro Américo pintou O grito do Ipiranga, que representa a Proclamação da República de 7 de setembro de 1822, onde vemos o protagonismo de D. Pedro I, que é uma idealização histórica. Elementos foram inseridos para “enaltecer a monarquia e seu primeiro imperador, e glorificar a independência como marco fundador da nacionalidade brasileira” .
    A pintura ocupa espaço em livros e no imaginário dos brasileiros. Como disse Américo “a realidade inspira, mas não escraviza o pintor”. Em minha leitura, se pretendia criar uma nova referência, um novo local de memória. No que tange aos documentários aqui reunidos, seria possível indagar: e quando um aspecto dessa realidade, como um presídio demolido, não é mais tangível? Como lidar quando as fontes oficiais, comuns aos relatos documentais, não abarcam a subjetividade dos sujeitos implicados?
    Torre (2017), de Nádia Mangolini, e Torre das Donzelas (2018), de Susanna Lira, lidam com a ausência do Presídio Tiradentes, que ficava localizado na cidade de São Paulo, e com a memória daqueles que permearam aquele espaço. Criado em 1825, o presídio foi a segunda cadeia pública da cidade, e demolido em 1972, ainda no regime da ditadura militar (FISCHER, S.; VAZ, A, 2022). Apesar desse desaparecimento físico, os dois documentários criam um novo local de memória. Nesse sentido, o cinema para Pollak (1989, p.09) “é o melhor suporte para fazê-lo: donde seu papel crescente na formação e reorganização, e portanto no enquadramento da memória. Ele se dirige não apenas às capacidades cognitivas, mas capta as emoções”. Esse novo local de memória coletiva é articulado por memórias subjetivas.
    Torre das Donzelas reconstrói cenicamente o presídio por meio de desenhos e relatos de ex-presas políticas que estiveram naquele local, propondo uma releitura do espaço. Com esse artifício, a diretora cria o seu dispositivo cinematográfico: recriar para, então, reativar a memória das atrizes sociais inseridas naquele espaço cênico. A diretora afirma que muitos documentários já foram feitos sobre a ditadura militar, mas que faltava o ponto de vista feminino, do relato das mulheres que participaram da resistência armada . A opção em não usar nenhuma imagem de arquivo ou fontes oficiais, em minha leitura, confirma a opção da diretora pela memória subjetiva das mulheres que passaram por aquele espaço.
    Torre, um documentário animado, foca nas lembranças de infância dos quatro filhos de Virgílio Gomes da Silva e de Ilda Gomes Martins da Silva durante o período da ditadura militar brasileira (1964-1985). Diferente do filme de Lira, o Presídio Tiradentes é periférico, mas é espectro que ronda a animação: somos colocados na perspectiva da mãe, que estava presa ali e via os quatro filhos por uma fresta do edifício. Cada um dos filhos, do mais novo até o mais velho, relatam as suas memórias. A animação é construída a partir dos relatos. Os depoimentos orais vão da irmã mais nova até o irmão mais velho, da memória menos específico até aquela que é mais clara. Os desenhos também vão ganhando mais cor durante essa gradação.
    A hipótese é que as realizadoras imprimem imageticamente a história e a própria política, lidando com os fatos, mas os construindo criativamente. Mais do que revelar uma questão de autoria, ocorre uma espécie de atitude autoral frente ao mundo. Nesse sentido, os documentários “não mais se orientem (se um dia chegaram mesmo a fazê-lo) rumo a uma realidade intocada, com a finalidade de apreendê-la” (Silva, 2013, p. 27).
    Assim, o relacionamento com o real perpassa por outros caminhos. Portanto, há a sugestão de um novo local de memória articulado pela linguagem audiovisual, que ajuda a refletir sobre o mundo político a partir de uma perspectiva subjetiva – aspecto que a comunicação focará.

Bibliografia

    TORRE. Direção: Nádia Mangolini. Assistente de Direção e Direção de Animação: Marcus Vinicius Vasconcelos. Brasil: Estúdio Teremim e Meus Russos. Documentário, 18 min, digital, colorido.
    TORRE DAS DONZELAS. Direção: Susanna Lira. Produção de Lívia Nunes. Brasil: Elo Company, 2019. Documentário, 97 min, digital, colorido.
    FISCHER, S.; VAZ, A. Paisagens anestésicas, espaços estésicos, convívios afetivos: Torre das Donzelas. Novos Olhares, v. 11, n. 1, p. 7–15, 29 jun. 2022.
    NICHOLS, B. Introdução Ao Documentário. 5a ed. Campinas, SP, Brasil: Papirus Editora, 2005.
    SILVA, M. D. J. D. Ponto de vista a(u)torizado: composições da autoria no documentário brasileiro contemporâneo. Doutorado em Teoria e Pesquisa em Comunicação—São Paulo: Universidade de São Paulo, 3 maio 2013.