Ficha do Proponente
Proponente
- Eduardo de Andrade Santiago Santos (UFPE)
Minicurrículo
- Eduardo Santiago é realizador audiovisual e mestrando do PPGCOM – UFPE. Formado em Cinema e Audiovisual, é pós graduado em Escrita Criativa e tem sua atuação profissional voltada ao cinema, com foco na escrita de roteiros. Dentro da carreira acadêmica, pesquisa cinema queer no Brasil Contemporâneo, tentando descobrir as particularidades estéticas e narrativa do cinema feito por pessoas LGBTQIAP+, Email: eduardo.eass@ufpe.br
Ficha do Trabalho
Título
- Buscando uma estética queer: O sexo em Seguindo Todos os Protocolos (2022)
Eixo Temático
- ET 1 – CINEMA, CORPO E SEUS ATRAVESSAMENTOS ESTÉTICOS E POLÍTICOS
Resumo
- O presente trabalho pretende investigar as particularidades estéticas de como o sexo é retratado em filmes queer, com foco na obra Seguindo Todos os Protocolos (2022), de Fábio Leal. Partindo do pressuposto de que pessoas LGBTQIAP+ vivem uma experiência de dissidência sexual, buscaremos perceber como o mundo se apresenta a elas e como isso é traduzido na tela do cinema.
Resumo expandido
- Um filme é um poderoso aparelho de comunicação, que usa da estética para contar histórias e, em alguns casos, perpetuar narrativas. Teresa de Lauretis (1994) descreve o cinema como uma “tecnologia social”. A partir dos elementos estéticos que o constituem (iluminação, enquadramento, edição, etc), o cinema pode ser usado para reforçar os papéis de gênero, buscando manter a relação de poder que este conceito impõe. Tentando fugir das atribuições impostas, a resistência a esses papéis habita os corpos queer, como coloca LOPES LOURO (2001, p. 546), “queer representa claramente a diferença que não quer ser assimilada ou tolerada e, portanto, sua forma de ação é muito mais transgressiva e perturbadora”. Perturbação essa que é traduzida ao campo estético assim que esse ponto de vista e modo de vida é traduzido na tela do cinema.
No livro A partilha do sensível, Jacques Rancière diz que a estética de obras de arte é um reflexo ou uma perpetuação política. Um objeto estético é “um recorte dos tempos e dos espaços, do visível e do invisível, da palavra e do ruído que define ao mesmo tempo o lugar e o que está em jogo na política como forma de experiência” (RANCIÈRE, 2005, p. 16). O autor também fala que “atos estéticos configuradores da experiência (…) propõem novas formas de sentir e induzem novas formas de sensibilidade política” (2005, p. 18). O campo da estética está, em geral, localizado em um espaço e tempo na sociedade e, a partir dela, são perpetuadas ideias políticas e novos caminhos para retratar sentimentos.
Enquanto filmes mainstream tentam funcionar dentro de uma lógica de “enquadramentos e códigos considerados realistas” (GUIDO; PRYSTHON, 2023, p. 180), tais noções de “equilíbrio, constância, discrição e sobriedade, propriedades (…) não condizem com proposições queer” (idem, p. 181). Sendo assim, o cinema queer usa os próprios códigos e proposições estéticas, numa tentativa de traduzir visualmente parte dessa experiência.
Em Seguindo Todos os Protocolos (Fábio Leal, 2021), a história de Francisco é contada em meio à pandemia de COVID-19. O filme trata de uma narrativa pandêmica sobre sexo em que o protagonista, ao terminar um namoro de anos por videochamada, passa a buscar prazer. Como o ato sexual é parte fundamental na história do filme, ele se faz bem presente na obra e é filmado de várias formas diferentes, colocando os corpos que ocupam a tela em destaque. Em alguns dos planos, a mis-en-scene é totalmente composta pelo corpo de algum dos personagens.
Segundo Paul Preciado, o cinema “não busca representar toda a verdade do sexo, mas questionar (…) os códigos visuais que determinam a normalidade ou a patologia de um corpo ou de uma prática” (2020, pg. 88). No filme de Fábio Leal, o sexo e os corpos habitam a tela não só em um contexto erótico, mas também numa busca de normatização dos afetos e das expressões de gênero que cercam os personagens, o sexo e o desejo servem pra contar histórias de pessoas que vivem com medo: da morte, de doenças, etc, mas que buscam uma forma de ultrapassar isso, realizar seus desejos e tornar a vida um pouco mais palatável. Segundo Foucault, no primeiro volume de A História da Sexualidade, “se o sexo é reprimido, (…) o simples fato de falar dele e de sua repressão possui como que um ar de transgressão deliberada” (2014, pg. 11).
Nesse sentido, a transgressão acontece no cinema com o simples fato da presença dos corpos queer e se intensifica quando estão despidos, transando, vivendo e existindo dentro das suas expressões de sexualidade e gênero. É um posicionamento contra alguns aparelhos que já foram e continuam sendo usados para perpetuar ideias de controle de gênero e demonstrar na prática a potência destes corpos. Se a estética é política, as pessoas LGBTQIA+ se apropriam dela para comunicar e mostrar que existem dentro e fora da tela.
Bibliografia
- GUIDO, Bruna; PRYSTHON, Angela. Luz e cor: a estética artificial do cinema queer brasileiro contemporâneo. in: Estudios LGBTIQ+, Comunicación y Cultura, v. 3, n. 2, p. 175–182, 2023.
FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade, Vol. 1: A vontade de saber. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 2014.
LAURETIS, Teresa de. A tecnologia do gênero. In: HOLLANDA, Heloísa Buarque de (Org.). Tendências e impasses: o feminismo como crítica da cultura. Rio de Janeiro: Rocco, 1994, p. 206 – 241.
LOPES LOURO, Guacira. Teoria Queer – Uma política pós-identitária para a educação. In: Revista Estudos Feministas V. 9 (pg. 541 – 553). Florianópolis, 2001.
LOURO, Guacira Lopes. O corpo estranho. Ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.
PRECIADO, Paul. Cinema e Sexualidade in: Um Apartamento em Urano. São Paulo: Zahar, 2020.
RANCIÉRE, Jaques. A Partilha do Sensível: Estética e política. São Paulo: Ed. 34, 2005.
SEGUINDO TODOS OS PROTOCOLOS. Direção de Fábio Leal. Recife: V