Ficha do Proponente
Proponente
- Emily Cristina Ferreira de Almeida (UFRJ)
Minicurrículo
- Emily Cristina Ferreira de Almeida é mestranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPGCOM-UFRJ). Graduou-se em Comunicação Social (habilitação em Jornalismo) pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Trabalha como jornalista na Revista piauí desde 2019, onde escreve sobre negritude, estética e cultura.
Ficha do Trabalho
Título
- A experiência afrofabulativa em O Dia que te Conheci
Eixo Temático
- ET 1 – CINEMA, CORPO E SEUS ATRAVESSAMENTOS ESTÉTICOS E POLÍTICOS
Resumo
- O presente estudo propõe uma análise do filme O dia que te conheci (2023), de André Novais Oliveira, a partir do conceito de afrofabulação como instrumento crítico para a elaboração de novas possibilidades de existência negra. A pesquisa dialoga com Tavia Nyong’o e outros autores que articulam afrofabulação, afrofuturismo e afrossurrealismo.
Resumo expandido
- Este trabalho propõe uma reflexão sobre a afrofabulação no cinema brasileiro contemporâneo a partir da análise do filme O Dia que te Conheci (2023), de André Novais Oliveira. A pesquisa parte do entendimento de afrofabulação não como um conceito fechado, mas como um campo em constante expansão, que se expressa por meio de novas experiências estéticas. Ao evitar definições rígidas, Tavia Nyong’o (2019) afirma estar “menos interessado em oferecer uma definição precisa de afrofabulação do que em comunicar algo como as diversas formas de experiência afrofabulativa”. Nesse sentido, o que está em jogo é menos a categorização do termo e mais o reconhecimento de uma prática que reinventa o presente a partir da projeção de futuros possíveis – ainda que esses futuros não sejam necessariamente grandiosos ou tecnológicos, como comumente associados ao afrofuturismo, mas singelos, cotidianos e profundamente humanos.
É nesse contexto que se insere O Dia que te Conheci, filme que acompanha, durante pouco mais de 24 horas, a rotina de um bibliotecário negro que vive em Belo Horizonte e trabalha em uma escola na cidade vizinha. A aparente simplicidade narrativa dá lugar a uma abordagem sensível sobre a interioridade de seu protagonista e os atravessamentos de sua existência. A fabulação aqui está menos ligada à fantasia ou à ficção científica, e mais a um gesto político de reencantamento do presente – como propõe Nyong’o.
Ao lado de Nyong’o, também Delany (1994) e Burocco (2019) ajudam a compreender o papel crucial da fabulação na construção de outras imagens possíveis para a população negra. Se, como aponta Delany, pessoas negras foram historicamente privadas de representações de seu passado, isso também compromete a elaboração de imagens de futuro. Já Burocco levanta uma pergunta central: “pode uma comunidade cuja história foi deliberadamente apagada vislumbrar um futuro possível? E qual seria o caráter desse futuro?” A resposta, no caso do filme analisado, não se dá por grandes utopias, mas por brechas sensíveis de subjetividade negra.
O caráter afrofabulativo de O Dia que te Conheci pode ser observado na estética psicológica construída pelo filme. O longa oferece espaço para personagens negros que falam sobre sua saúde mental, suas medicações para ansiedade e depressão, suas angústias e desejos. Tal gesto é político, pois contraria a tradição do audiovisual que, como propõe Frank Wilderson III (2019), muitas vezes reserva à população negra lugares de violência e sofrimento, sem espaço para a complexidade de suas subjetividades. A presença da saúde mental negra na diegese do filme, com um tratamento delicado e cuidadoso, cria novos modos de representação e de existência.
Dessa forma, este estudo parte de uma metodologia qualitativa para investigar as formas pelas quais a afrofabulação se manifesta no filme, com atenção especial à construção estética, aos recursos narrativos e à maneira como esses elementos permitem pensar outras formas de vida negra no cinema brasileiro. A pesquisa busca, assim, refletir sobre a potência política da imaginação no campo do audiovisual e sobre como a fabulação pode atuar como ferramenta para vislumbrar e construir futuros negros possíveis – mesmo que, por vezes, esses futuros se expressem apenas na tentativa de viver o presente com dignidade.
Bibliografia
- BUROCCO, Laura. Afrofuturismo e o devir negro do mundo. Arte & Ensaios. Revista do PPGAV/EBA/UFRJ, n. 38, p. 49-59. 2019.
FREITAS, Kenia e MESSIAS, José. O futuro será negro ou não será: Afrofuturismo versus Afropessimismo – as distopias do presente. Imagofagia. Revista de la Asociación Argentina de Estudios de Cine y Audiovisual, n. 17, p. 402-424. 2018.
IMARISHA, Walidah. Rewriting The Future: Using Science Fiction To Re-Envison Justice”. Bitch. 2015.
NYONG’O, Tavia. Afro-Fabulations: The Queer Drama of Black Life. Nova Iorque: New York University Press, 2019.
WILDERSON III, Frank B. Afropessimismo. São Paulo: Todavia, 1ª Ed., 2021.