Trabalhos aprovados 2025

Ficha do Proponente

Proponente

    Mariana Dutra de Carvalho Lopes (UFMG)

Minicurrículo

    Doutoranda em Artes na Escola de Belas Artes da UFMG, na linha de pesquisa Cinema. Possui graduação em Letras pela UFMG (2004) e mestrado em Estudos de Linguagens pelo CEFET-MG (2015). Tem interesse nas áreas de Cinema Brasileiro e Teorias do Cinema.

Ficha do Trabalho

Título

    A montagem discursiva no cinema de André Novais

Seminário

    Edição e Montagem audiovisual: reflexões, articulações e experiências entre telas e além das telas

Resumo

    Este estudo concentra-se nas estratégias discursivas do cineasta André Novais e busca analisar, no filme Ela volta na quinta (2014), os significados criados a partir de recursos de montagem. Para isso, são considerados conceitos que definem as funções da montagem, bem como aspectos relacionados ao ritmo e à composição dos planos do filme. Conclui-se que a manipulação dos recursos de montagem potencializa os significados relacionados ao cotidiano de trabalho de cada personagem.

Resumo expandido

    André Novais tem sua obra marcada por um apurado uso da linguagem cinematográfica conciliado com uma aparente simplicidade da narrativa. Apresentando como protagonistas personagens negras e periféricas, seus filmes abordam temas como relações afetivas e rotinas de trabalho. Para melhor compreender o estilo do cineasta e suas estratégias discursivas, propomos aqui uma observação de Ela volta na quinta (2014) com o objetivo de analisar os significados relacionados à temática do trabalho que são criados a partir de recursos de montagem.

    Como um dos aspectos da análise fílmica, Aumont e Marie (2010) destacam o papel da montagem na produção de sentidos. Os autores estabelecem duas funções da montagem: a função discursiva, que insere elementos notadamente artificiais, e a diegética, que simula uma continuidade das ações. Martin (2005) também faz essa distinção e nomeia como montagem narrativa aquela que ordena os planos para contar uma história, e como montagem expressiva aquela que busca criar efeitos a partir da junção dos planos.

    Leone e Mourão (1993), considerando o processo do fazer fílmico, consideram que a montagem ocorre desde a concepção do filme, com a escrita do roteiro. Durante a realização, a montagem é feita no interior do plano, nos elementos de encenação. Por fim, na montagem propriamente dita, são estabelecidas relações entre os planos, que deixam de ter um significado isolado.

    Além disso, Leone e Mourão (1993) destacam que o ritmo dos filmes está relacionado com a duração dos planos e com a montagem que ocorre no interior deles. Dessa forma, a definição dos planos tem uma intenção relacionada aos efeitos e aos discursos que se pretende produzir. Murch (2004) também destaca a emoção e o enredo como aspectos decisivos para a definição do corte, sendo o ritmo condicionado a eles, uma vez que o principal nessa atividade é conduzir os sentimentos dos espectadores.

    Ela volta na quinta (2014) retrata uma família que vive situações relacionadas a uma possível separação dos pais. Paralelamente, enquanto desenvolve os dilemas pessoais de cada personagem, o filme explora suas rotinas.

    A montagem das cenas iniciais apresenta os membros dessa família reverberando entre eles o cansaço sentido por cada um. A conversa entre os pais na cozinha se encerra com a mãe falando que está cansada. Após o corte, vemos o filho mais velho dirigindo um carro com uma expressão de fadiga. Depois, no trabalho, ele liga para a mãe e diz que está muito cansado. Há, então, um corte para a cena seguinte, que mostra o filho mais novo andando na multidão. A forma de integrar essas cenas faz com que essa última imagem represente também o cansaço. Dessa forma, a descrição inicial das personagens é ampliada por meio da montagem, que cria significados adicionais que ultrapassam os fatos narrados.

    A montagem também apresenta a natureza permanente do trabalho doméstico com as cenas da mãe cuidando da casa. Ela vai ao supermercado, lava roupa, varre o quintal, cata feijão e à noite prepara o jantar. Essas cenas são filmadas em planos sem cortes, como uma forma de conferir à cena o mesmo ritmo da atividade realizada.

    Também feita sem cortes, a cena em que o pai desce uma escada carregando uma geladeira com um colega tem a câmera posicionada na parte inferior da escada, como se nos colocasse suportando o peso carregado pelas personagens, que fazem o percurso com dificuldade. Assim, a montagem da cena é feita no interior do plano e produz um efeito relacionado ao esforço das personagens.

    Assim, em Ela volta na quinta (2014), a manipulação dos recursos de montagem amplifica os significados relacionados ao trabalho realizado por cada personagem. Na montagem no interior dos planos, na definição do ritmo de cada plano e na montagem discursiva, o filme incrementa a complexidade das personagens.

Bibliografia

    AUMONT, Jacques; MARIE, Michel. A análise do filme. Lisboa: Texto e Grafia, 2010.

    ELA volta na quinta. Direção: André Novais. Brasil, 2014. 108 min.

    LEONE, Eduardo; MOURÃO, Maria Dora. Cinema e montagem. São Paulo, Editora Ática, 1993.

    MARTIN, Marcel. A linguagem cinematográfica. Lisboa: Dinalivro, 2005.

    MURCH. Walter. Num piscar de olhos: a edição de filmes sob a ótima de um mestre. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004.