Ficha do Proponente
Proponente
- Julia Mariano de Lima Araújo (Sem vinculo)
Minicurrículo
- Mestra em Comunicação e Cultura pela ECO-UFRJ, bolsista Nota 10 da FAPERJ. Possui graduação em Comunicação Social – Jornalismo, pela ECO-UFRJ (2006) com especialização em Direção de Documentários no curso regular da EICTV (Cuba, 2005) e na Baden-Württemberg Filmakademie (Alemanha, 2007). Atua como diretora, roteirista e produtora no mercado audiovisual. Áreas de interesse: Cinema, Direitos Humanos, Cinema e Política, Arquivo e Política, Práticas de Contra-arquivo.
Ficha do Trabalho
Título
- Bak.ma e 858.ma: arquivos-ativistas da Primavera Árabe
Eixo Temático
- ET 3 – FABULAÇÕES, REALISMOS E EXPERIMENTAÇÕES ESTÉTICAS E NARRATIVAS NO CINEMA MUNDIAL
Resumo
- A dinâmica rua-rede inaugurada pela internet, conexão que gera uma produção intensa de ‘objetos audiovisuais’ (César, 2017) dos mais diversos, abriu caminhos para práticas de contra-arquivo e provocou novas experiências de arquivos ativistas digitais. Neste sentido, o presente trabalho irá apresentar duas práticas de arquivos ativistas do período histórico que ficou conhecido como a Primavera Árabe: a do arquivo egípcio 858.ma e a do turco Bak.ma
Resumo expandido
- O aparecimento da tecnologia digital, nos anos 90, possibilitou não só uma facilidade de produção e reprodução de textos e fotografias, de sons e imagens em movimento, como também permitiu o armazenamento desses materiais de forma “caseira”. Um cambio tecnológico que gerou uma mudança “epistemológica que trouxe o conceito e a experiência dos arquivos para a nossa vida cotidiana” (Eichhorn, 2013, p.5, tradução nossa) e que também impulsionou a produção de arquivos extra institucionais, independentes, autônomos e coletivos. Esta virada digital permitiu a produção de contra-arquivos, daquilo “que ficou no fora de campo das imagens oficiais produzidas e disponibilizadas pelo Estado” (Machado, 2022). Uma pratica, antes de tudo, politica de criação e preservação de relatos alternativos aos relatos das elites, de arquivamento de outras memórias.
A internet e sua dinâmica rua-rede, conexão que gera uma produção intensa de ‘objetos audiovisuais’ (César, 2017) dos mais diversos, abriu outros caminhos e práticas de contra-arquivo a partir dos anos 2000, intensificando uma produção videoativista, de um audiovisual militante gerado na urgência dos acontecimentos das ruas e em diálogo constante com as redes sociais. Este novo cenário de produção audiovisual independente provocou novas experiências de arquivos ativistas digitais. Neste sentido, o presente trabalho irá apresentar duas práticas de arquivos ativistas do período histórico que ficou conhecido como a Primavera Árabe: a do arquivo egípcio 858.ma e a do turco Bak.ma.
O 858.ma foi realizado pelo Coletivo Mosireen que atuou nas ruas do Cairo, filmando diariamente a Revolução Egípcia entre 2011 e 2014. O coletivo se organizou em torno da construção de uma Media Tent, logo nos primeiros dias de insurreição na Praça Tahrir, para combater as imagens das ruas vazias mostradas pela TV estatal. Após o golpe militar em 2013, os membros do coletivo se viram paralisados, e contam que “nossa função ficou incerta e logo paramos totalmente de trabalhar. Precisávamos fazer uma pausa para lidar com o sentimento de derrota e encontrar uma outra forma de trabalhar dentro da nova realidade política.” (2018, tradução nossa). A experiência do Coletivo Mosireen foi a de passar da ‘ação da imagem’ (Cesar 2017) a ação da memória. Sem poder atuar nas ruas, eles então buscaram formas para organizar, catalogar e publicar a coleção de imagens e sons que compilaram entre 2011 e 2014. Deste esforço coletivo nasceu o 858.ma, uma forma de “apresentar milhares de histórias da revolução, contadas por centenas de perspectivas” (2018, tradução nossa).
A consciência de que existe um monopólio da imagem que gera ramificações políticas relacionadas a um “poder mnemônico” (Çelikaslan 2024, p.89) e o desejo de que as imagens de resistência de Praça de Taksim (Taksim Gezi Park), em Istambul na Turquia, fossem compartilhadas em uma perspectiva do comum, impulsionaram a criação do Bak.ma. Este arquivo ativista nasceu nos protestos turcos em 2013 e hoje tem imagens das revoluções populares de 1961, 1977 e 2010, e se constituí, também, como uma cartografia das imagens e sons dos movimentos sociais, insurreições e resistências turcas.
Através destas experiências, analisaremos os desafios e as questões que se colocam na construção de arquivos digitais que reúnem uma grande quantidade de material de arquivo audiovisual e refletiremos sobre este ‘novo contrato de arquivo’ (Azoulay, 2017) que envolve quem produz imagens a pensar onde arquivá-las, depositá-las, como organizá-las e como garantir o seu acesso.
Bibliografia
- AZOULAY, Ariella. Archive in Political Concepts: a critical lexicon, 2017 https://www.politicalconcepts.org/archive-ariella-azoulay/ ultimo acesso em 16/10/24.
BLANK, Thais. MACHADO, Patrícia F. M. Inês e Norma: Caminhos cruzados em imagens, arquivos e militância. In Dossiê Temático, Acervo, Rio de Janeiro, jan./abr. 2024
CESAR, Amaranta. Cinema como ato de engajamento: Documentario, Militancia e Contextos de Urgencia. In C-Legenda no 35, 2017/2
EICHHORN, Kate. The Archival Turn in Feminism: Outrage in Order. American Literatures Initiative, Temple University Press, 2014.
ERENSOY, Fulya Sirin e ÇELIKASLAN, Ozge. Video Activism and Activism Archiving: Collective Testimonies, Resilient Images, and the case of Bak.ma. In: Cinema & Cie vol 24 no 42, 2024.
MACHADO, Patricia F. M. O que podem as imagens? Uma analise da tomada de registros testemunhais de manifestações de rua no Brasil em 2013. In: Revista Eco-Pós